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Coronavírus

SP vê transmissão da covid-19 em alta com patamar semelhante ao que antecedeu segunda onda

Cidades da faixa norte puxam a taxa média para cima; segundo especialista, aumento de casos deve-se a variantes como a P.1

28 mai 2021 - 18h02
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SOROCABA - Dados da plataforma Info Tracker, abastecida diariamente por pesquisadores da USP de São Carlos e da Unesp, mostram que a velocidade atual de transmissão do coronavírus no Estado de São Paulo é semelhante à do início da segunda onda de covid-19. Nesta quinta-feira, 27, a taxa média era de 1,17, ou seja, cada 100 pessoas infectadas podem contaminar outras 117. Em 14 de dezembro, a taxa era de 1,25. A alta transmissão, na época, levou a um aumento assustador no número de casos no início de 2021, causando colapso no sistema de saúde em muitas regiões do País.

Os números atuais estão levando mais prefeituras a decretarem lockdown no interior de São Paulo. Nesta quarta-feira, 26, o governador João Doria (PSDB) decidiu suspender a flexibilização das medidas restritivas que entrariam em vigor no dia 1º de junho, devido ao aumento nos casos de covid-19. Para o cientista de dados e professor da Unesp Wallace Casaca, um dos coordenadores do estudo, a alta na taxa de contágio reflete o aumento nos casos em todo o Estado, desta vez devido à ação de variantes como a P.1. Ele acredita que uma terceira onda já começou e pode ser pior que a de março.

No interior, regiões da faixa norte do Estado puxam a taxa média para cima. Em São João da Boa Vista, com a taxa de 1,67, a mais alta, cada cem contaminados podem transmitir o vírus para 167 pessoas. No final de dezembro, a taxa era de 0,97. A prefeita Terezinha de Jesus Pedroza (DEM) anunciou lockdown a partir de segunda-feira, 31, com toque de recolher das 20h às 5h. "Apesar das medidas tomadas anteriormente, as festas e aglomerações continuaram acontecendo, o que se reflete na situação atual. Vamos usar a Polícia Militar, pois o número de fiscais é insuficiente", disse.

Segundo ela, o vírus ganhou intensidade, provavelmente devido à ação de variantes. "Tínhamos 50 pacientes na ala de covid, hoje temos mais de 140. Estamos com 110% de ocupação em UTI, 100% de enfermaria e muitos pacientes aguardando transferência." Nesta sexta-feira, 28, a prefeita se reúne com os demais prefeitos da região para que as medidas sejam tomadas em conjunto. "A Santa Casa, que recebe pacientes dessas cidades, está perto do colapso, então precisamos de união. A situação nas demais cidades não é diferente da nossa."

Franca, com o terceiro maior índice, adotou o lockdown a partir desta quinta-feira. O comércio em geral fecha até o dia 10 de junho. O toque de recolher vigora de 20h às 5h. Na região, a taxa de transmissão está em 1,56 - cada 100 doentes podem passar o vírus para 156 pessoas. A cidade registra também a maior taxa de crescimento de óbitos, com 49 mortes na última semana, aumento de 8,54%.

Em Araçatuba (taxa de 1,41) e Campinas (1,39), as prefeituras também já reduziram as atividades devido ao aumento dos casos e de internações. Nesta quinta, o Hospital Mário Gatti, principal hospital da rede municipal de Campinas, suspendeu as cirurgias eletivas devido ao aumento na demanda por leitos de covid-19. "Estamos no meio de uma situação de guerra, com demanda muito grande e sem condições de repor e melhorar o número de funcionários", disse o administrador hospitalar, Sérgio Bisogni.

Desde quarta-feira, 26, a vigilância em saúde monitora pessoas com sintomas gripais para evitar a disseminação de novas cepas do vírus, como a variante "indiana" B.1.617. Em live, o prefeito Dário Saadi (Republicanos) alertou que podem ser adotadas medidas mais restritivas e fez apelo por mais isolamento social. "O risco de uma terceira onda é cada vez maior. Nas últimas três semanas, vimos um aumento de 36% no atendimento de casos de síndromes respiratórias. Esses dados nos colocam em alerta. Temos que usar a experiência do controle da segunda onda em nossa cidade para amenizar os perigos de uma nova alta de internações", disse.

Outras cidades com alto contágio, segundo o estudo dos pesquisadores, são Araraquara (1,35), Barretos (1,33), Piracicaba (1,31) e Marília (1,31).

Na outra ponta, a região de Registro, no Vale do Ribeira, tem o menor contágio. Cada cem pessoas infectadas passariam o vírus para outras 53 apenas. É menos da metade da média estadual. Cortada por uma única rodovia duplicada, a Régis Bittencourt (BR-116), a região é a mais isolada do Estado. A prefeitura disse que adotou medidas de controle desde o início do ano, criando uma central de monitoramento para os casos suspeitos e positivos, além de uma central 24 horas para denúncia de quebra do isolamento.

Também acelerou a vacinação: um terço da população está vacinado, o que reflete nos índices da região. "Contudo, ainda temos 83% de ocupação nas UTIs de referência regional, o que não nos permite mudar a postura de prevenção e alerta à população frente à pandemia", disse a prefeitura, em nota.

Na região metropolitana de São Paulo, os índices variam de uma sub-região para outra. A segunda mais alta do estado, de 1,62, está na Grande São Paulo Sudoeste (Embu-Guaçu). Já a taxa da Grande São Paulo Norte (Mairiporã), de 0,76, é a segunda menor.

Nos municípios da Grande São Paulo Sudeste (Diadema), a taxa de contágio é de 0,88%, a terceira menor. Também têm índices de contágio mais baixos a Baixada Santista (0,92), Bauru (0,93), Taubaté (0,96), Presidente Prudente (0,97), São Paulo, capital (0,98), Grande São Paulo Leste (1,02) e Sorocaba (1,09).

Dado reflete restrições ou relaxamentos na circulação de pessoas

Para o pesquisador Wallace Casaca, o contágio oscila conforme o número de pessoas infectadas, refletindo as restrições de circulação tomadas pelos gestores e o comportamento da população. "Cada região vive momentos diferentes na pandemia. Quando não temos uma grande população imunizada, o isolamento social é determinante e o abre e fecha tem influência nos números." Cidades que tiveram maior taxa de isolamento, como Registro, apresentam contágio menor.

As variantes que circulam no Estado também influenciam os números. "A gente combina os dados de transmissão com o sequenciamento genômico das amostras de cada região e conclui que hoje, de 85% a 90% dessas amostras são da variante P.1. Isso reforça a convicção de que estamos entrando na terceira onda. No começo de fevereiro, a gente não tinha grande circulação da P.1."

Dados da Secretaria da Saúde mostram que, até 24 de maio, tinham sido encontrados 356 casos autóctones da variante P.1, outros 15 da B.1.1.7 e 3 da B.1.351 no estado. Não havia ainda notificação oficial da P.4. Houve um caso importado da Índia.

Outro indicador de uma nova onda, segundo Casaca, é o aumento na ocupação das redes privada e pública de hospitais, com elevação na curva de internações no Estado todo. "É muito parecido com o que aconteceu em março, com pacientes à espera de leitos. Atrelado a isso, temos a taxa de transmissão acima de 1%, não só em São Paulo, mas na maioria dos Estados. A gente vai observar nas próximas semanas, infelizmente, aumento no número de mortes. Devido à curva ascendente de internações, vamos ter o pior momento entre 14 e 20 dias. Talvez até supere o que aconteceu em março", disse.

Projeções combinam modelos matemáticos com inteligência artificial

O Info Tracker utiliza os números da covid-19 atualizados diariamente pelos municípios. As projeções são feitas com modelos matemáticos inteligentes de epidemiologia, que combinam a dinâmica de contágio do coronavírus com técnicas de inteligência artificial.

Para o professor Raul Guimarães, pesquisador em geografia da saúde da Unesp, a taxa de contágio reflete uma diversidade muito grande de ciclos, pois várias pandemias acontecem ao mesmo tempo em todo o Brasil e também no Estado de São Paulo. "A gente assiste ao crescimento e à oscilação das taxas de contágio ao mesmo tempo em cidades muito diferentes. Vivemos uma situação muito complexa neste momento, que é ter crescimento de casos em cidades muito pequenas, de menor expressão econômica, e nas cidades maiores e industriais, o que impacta todo sistema de saúde."

Como resposta à grande difusão do vírus, houve experiências mais radicais, como o lockdown em Araçatuba e Araraquara, assim como estratégias de isolamento social definidas pelo Plano São Paulo. "A gente observou o efeito imediato disso no final de março, com a queda no crescimento da pandemia, comprovando o efeito dessas medidas na redução da circulação viral. Para mapear melhor e saber quanto da população está imunizada, seria preciso ampliar em muito a quantidade de testes, mas não testamos. Falta coordenação nacional e o País tenta agir às cegas", criticou.

Medidas são ancoradas em critérios técnicos, diz governo

A Secretaria da Saúde do Estado informou, em nota, que a decisão de colocar São Paulo na fase de transição do Plano SP foi adotada após recomendação do Centro de Contingência do Coronavírus, com foco em análises e pareceres médicos para permitir, de forma consciente e gradual, a retomada das atividades econômicas dos setores. "Este novo momento tem o objetivo de retomar atividades econômicas de forma segura e responsável, com a manutenção dos protocolos sanitários, horários de funcionamento e as restrições de circulação para a população", disse, em nota.

A pasta reforçou a necessidade de colaboração da população para evitar a disseminação do coronavírus, e que as medidas mais restritivas foram ancoradas em critérios técnicos e científicos. "Somente com o integral cumprimento das normas em vigor será possível conter as taxas de contaminação da covid-19", afirmou.

Estadão
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