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Coronavírus

Voluntário dos testes da vacina russa relata experiência

Jornalista participou dos testes clínicos da vacina russa e, pouco antes do início da anunciada vacinação em massa na Rússia

4 dez 2020 - 13h02
(atualizado às 13h06)
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A Rússia deve começar a vacinação em massa contra o novo coronavírus já no fim da semana que vem, seguindo uma decisão desta quarta-feira (02/12) do presidente Vladimir Putin.

Satanovskiy exibe o certificado da vacina Sputnik V
Satanovskiy exibe o certificado da vacina Sputnik V
Foto: DW / Deutsche Welle

Os médicos e professores deverão ser os primeiros a serem vacinados. Paralelamente, os testes com a vacina batizada de Sputnik V, que foi aprovada pelo país no verão europeu sem passar por todas as etapas de testes, continuam.

O correspondente da DW Serguei Satanovskiy participou do teste da vacina desenvolvida pelo Instituto Gamaleya de Epidemiologia, de Moscou e relata a seguir a sua experiência.

Registro para o teste de vacinação

Em setembro, um anúncio na internet convocava voluntários para testar a vacina contra a covid-19. Na época havia poucas informações sobre a Sputnik V, e o número de novas infecções na Rússia não era alarmante.

No final de novembro, a situação já era outra: o número de novas infecções aumentara acentuadamente. Decidi assumir o risco de uma vacinação. O que me convenceu foi a situação difícil de amigos que estavam gravemente doentes e haviam sido colocados em quarentena em seus apartamentos.

Uma busca na internet por "vacinação contra o coronavírus" me levou ao site da prefeitura de Moscou. Foi necessário preencher um questionário, incluindo perguntas como se eu já havia adoecido com o novo coronavírus, se tinha tido contato com alguém infectado nas últimas duas semanas e se tenho doenças crônicas.

De acordo com a Secretaria da Saúde, pessoas que já haviam adoecido de covid-19 não deveriam mais ser vacinadas nesta temporada. Cerca de uma semana depois, recebi um convite por telefone para realizar um exame preliminar. Para isso, eu poderia escolher uma clínica.

Exame no hospital

Fui ao hospital Zhadkevich, em Moscou, para fazer o exame. No local, soube que o médico-chefe é o médico e apresentador de TV Alexander Myasnikov. Ele é amigo do conhecido apresentador de televisão estatal, Vladimir Solovyov, que é considerado parte da máquina de propaganda russa.

No início da pandemia, Solovyov estimou como "zero" a probabilidade de os russos serem infectados com a covid-19. Isso tudo não me deu uma sensação muito boa, mas era tarde para recuar.

Antes do exame, a médica perguntou se eu havia tomado algum remédio recentemente, se eu tinha alguma alergia e se havia feito alguma cirurgia.

Liguei para meus pais para saber exatamente qual tipo de operação havia feito quando tinha 5 anos. Durante a conversa, a médica me deu um material informativo de 16 páginas e me explicou verbalmente o conteúdo.

O documento diz, por exemplo, que o objetivo do estudo é avaliar a eficácia, imunogenicidade e segurança da vacina Gam-Covid-Vac (cuja marca comercial é Sputnik V).

Em estudos pré-clínicos, a vacina foi testada em animais, como hamsters e porquinhos-da-índia. A Sputnik V demonstrou segurança e eficácia nesses animais, mas somente segurança entre os voluntários humanos.

Apólice de seguro para cada participante

Um total de 40 mil pessoas participam do estudo: 30 mil recebem a vacina, e 10 mil um placebo. Os participantes devem voltar ao hospital 21 dias depois da primeira vacinação para receber a segunda dose. Além disso devem informar diariamente no aplicativo Check Covid-19 como se sentem. Nada mais me foi solicitado. Mas há outro estudo, e a médica sugeriu que eu participasse dele também.

Fiquei sabendo que o estudo principal não inclui um teste de sangue para imunogenicidade, ou seja, a capacidade da vacina de produzir uma resposta imunológica na forma de anticorpos que podem neutralizar o vírus. Tais exames são realizados em um estudo adicional. O Estado paga 8.500 rublos (cerca de R$ 590) pela participação. Apenas 95 mililitros de sangue são coletados, então concordei.

"Embora a participação na pesquisa seja segura, você estará coberto por um seguro especial durante todo o estudo", disse a médica. A apólice de seguro para os participantes do estudo estipula que, em caso de morte, os beneficiários (no meu caso, os meus pais) receberão 2 milhões de rublos (cerca de R$ 138 mil).

Em caso de limitação física, dependendo do grau, seriam pagos entre 500 mil e 1,5 milhão de rublos (cerca de R$ 35 mil a R$ 105 mil); e em caso de deterioração do estado de saúde sem limitação física, cerca de 300 mil rublos (cerca de R$ 21 mil).

Após a entrevista, assinei o termo de consentimento para participar do estudo e fui examinado. Fiz testes para HIV, sífilis, hepatites C e B, coronavírus (PCR e teste de anticorpos) e resíduos de medicamentos na urina. Nada foi encontrado, e fui autorizado a receber a aplicação da vacina.

Armazenamento de vacinas em refrigeradores especiais

Os exames feitos são válidos por uma semana, então fui para a vacinação exatamente depois de sete dias. Na porta da clínica havia um adesivo que dizia: "Entre para a vacinação de covid-19". No próprio hospital, a sinalização indicava o caminho até o setor. Lá havia uma recepção e quatro salas: vacinação, médico, exame e de descanso.

Às 10h daquele dia havia dois participantes no local: eu e uma mulher de cerca de 30 anos. Eu me apresentei ao médico e fui fazer a coleta de sangue para o teste de anticorpos, para o qual o sangue deve ser coletado várias vezes. Em seguida, me levaram para ser vacinado: fui para uma salinha com apenas algumas cadeiras, uma mesa médica e duas geladeiras da marca russa Pozis. Cada um desses refrigeradores, que armazena a vacina a 28 graus negativos, custa cerca de 150 mil rublos (cerca de R$ 10,5 mil).

O médico me deu uma injeção indolor em meu ombro esquerdo. Em seguida, passei meia hora na sala de descanso. Disseram-me que a pressão arterial de alguns pacientes caiu após a vacinação, mas não houve alteração no meu caso.

Eu recebi um certificado de participação e fui liberado. Logo depois, eles me disseram que minha temperatura corporal poderia aumentar e, se isso acontecesse, deveria apenas tomar paracetamol. Também me pediram para não planejar um filho nos próximos três meses, pois os efeitos da vacina sobre espermatozoides ainda não haviam sido estudados.

Calafrios e febre

Somente depois da vacinação, eu li sobre a reação da vacina em outros participantes, incluindo jornalistas e integrantes do grupo "Resultados da vacinação" no aplicativo de mensagens Telegram, que reúne mais de 1.800 pessoas.

As pessoas reclamavam de febre e dores musculares na noite após a administração da vacina (ou placebo) e no dia seguinte. Quando saí do trabalho, por volta das 19h, eu já sentia dor de cabeça, calafrios leves e tontura. Porém, não descartei que pudesse ser só a minha imaginação depois de ler todas aquelas histórias.

Mas, perto da meia-noite, não havia mais dúvidas de que meu corpo estava respondendo à vacina. A temperatura corporal subiu para 38,6 graus, e a dor muscular aumentou depois da minha última sessão de ioga.

Tudo isso era desconfortável, mas era gratificante saber que eu havia provavelmente tomado a vacina e não o placebo. Tomei paracetamol, registrei os sintomas em meu diário digital e fui dormir. No dia seguinte, a temperatura estava de novo em torno de 37 graus e, no dia seguinte, os efeitos colaterais haviam desaparecido.

Receberei a segunda dose em três semanas e devo começar a desenvolver anticorpos cerca de 42 dias após a primeira vacinação. Entretanto, ainda está em aberto se esses anticorpos poderão combater de forma eficaz o novo coronavírus.

Deutsche Welle A Deutsche Welle é a emissora internacional da Alemanha e produz jornalismo independente em 30 idiomas.
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