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Cresce pressão sobre Arábia Saudita por caso Khashoggi

19 out 2018 - 11h56
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Lideranças políticas e financeiras cancelam participação em evento no país, e Trump reconhece que jornalista desaparecido pode estar morto. Importante aliado do Ocidente, Riad tem que explicar destino do dissidente.O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, afirmou nesta quinta-feira (18/10) acreditar que o jornalista saudita Jamal Khashoggi está morto e alertou que o caso terá duras consequências para a Arábia Saudita, caso as autoridades do país estejam envolvidas na morte do dissidente.

Manifestantes cobram explicações para desaparecimento do jornalista Jamal Khashoggi, em Washington
Manifestantes cobram explicações para desaparecimento do jornalista Jamal Khashoggi, em Washington
Foto: DW / Deutsche Welle

Trump fez a afirmação após ter sido informado sobre as investigações do caso Khashoggi pelo secretário de Estado americano, Mike Pompeo, que retornou de uma viagem a Riad e Ancara. "Certamente me parece", disse Trump ao ser questionado se Khashoggi - desaparecido há mais de duas semanas após entrar no consulado da Arábia Saudita em Istambul - teria morrido.

Mais cedo, em entrevista ao jornal The New York Times, Trump disse que só um milagre evitaria que o jornalista não estivesse morto. "A não ser que o milagre dos milagres acontecesse, pensaria que está morto", frisou.

Pompeo pediu que o presidente conceda "mais alguns poucos dias" à Arábia Saudita para investigar o desaparecimento do jornalista, embora não tenha especificado quando se espera que essa investigação termine.

Enquanto isso, uma série de executivos e altos funcionários governamentais cancelaram participação numa conferência de investidores na Arábia Saudita, incluindo três ministros europeus e o secretário do Tesouro dos EUA, Steven Mnuchin.

Nesta quinta-feira, cancelaram a participação no evento o ministro das Finanças da Holanda, Wopke Hoekstra, seu colega francês, Bruno Le Maire, e o ministro britânico de Comércio Internacional, Liam Fox. A diretora do FMI, Christine Lagarde, também anunciou que não comparecerá ao encontro.

Também altos representantes da indústria e das finanças mudaram seus planos. Os executivos-chefes dos bancos HSBC, Standard Chartered e Credit Suisse cancelaram suas participações. De acordo com relatos da mídia, cancelaram a ida também o chefe do banco JP Morgan e os CEOs da Ford e da Uber. Outros deixaram sua participação em aberto. O CEO da Siemens, Joe Kaeser, disse que decidirá nos próximos dias, ponderando que "se pararmos de falar com países onde pessoas estão sendo procuradas, não vamos mais conversar com ninguém".

Kaeser abordou um dilema também visto na política e para o qual não há uma resposta satisfatória não apenas no caso de Kashoggi. "Não podemos moldar a Arábia Saudita e a família real saudita do modo que queremos, mas temos que lidar com as situações", afirmou Jürgen Hardt, especialista em política externa da União Democrata Cristã (CDU), o partido da chanceler federal alemã, Angela Merkel.

A Arábia Saudita tenta uma aproximação entre israelenses e palestinos, e, ao mesmo tempo, conduz no Iêmen, ao lado do governo local, uma luta contra rebeldes houthis, na qual o direito internacional vem sendo massivamente violado, aponta Hardt.

"É por isso que temos uma imagem altamente ambivalente da Arábia Saudita", ressalta. "O que aconteceu nos últimos dias no caso de Kashoggi e o que vamos possivelmente vir a saber sobre isso nos próximos dias completará ainda mais a imagem que temos e, então, a Europa eventualmente terá que corrigir sua política em relação à Arábia Saudita."

Peso-pesado político

Isso seria uma decisão de enorme importância. Há anos, a Arábia Saudita tenta se apresentar ao Ocidente como um parceiro político confiável. O país não só se ofereceu para mediar o conflito no Oriente Médio, mas também quer participar da luta contra o terrorismo jihadista.

Riad também desempenha um papel importante na guerra na Síria. A Arábia Saudita é tida como um importante contrapeso ao Irã, que expandiu maciçamente sua presença e influência na guerra civil do país.

E justamente o príncipe herdeiro saudita, Mohammed bin Salman, que enfrenta pressão crescente para fornecer explicações sobre o suposto assassinato de Khashoggi, é para os americanos um parceiro particularmente importante, segundo o príncipe saudita Khalid bin Farhan, que vive exilado na Alemanha.

"O governo americano não pode se dar ao luxo de abrir mão de uma pessoa tão facilmente influenciável e controlável como Mohammed bin Salman", afirmou o príncipe em entrevista à DW. Bin Farhan suspeita que a viagem do secretário de Estado americano, Mike Pompeo, teve principalmente o propósito de "manter no poder o príncipe herdeiro, para, assim, poder exercer seus próprios planos".

Caso apareçam mais indícios de um assassinato de Khashoggi, os políticos alemães devem olhar com novos olhos para a Arábia Saudita e, especialmente, para o príncipe herdeiro saudita, acredita o cientista político especializado em Oriente Médio Thomas Richter, do Instituto Alemão de Estudos Globais e Regionais (Giga).

"É possível que cheguem à conclusão que a Arábia Saudita é uma monarquia autoritária, liderada por poucas pessoas e, aparentemente, por um jovem príncipe que não hesita perante nada", prevê o especialista.

Petrodólares e investimentos

No entanto, o peso econômico do reino pode estabelecer alguns limites para a reflexão e, talvez, para a ação. A família governante saudita tem nas mãos um importante meio de pressão econômico, com suas reservas de petróleo. O país é o maior exportador mundial da commodity e vende diariamente sete milhões de barris para todo o mundo. Mas a demanda global já é maior que a oferta dos países da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep), da qual a Arábia Saudita faz parte.

Além disso, por causa das sanções contra o Irã, que estão prestes a começar, o mercado petrolífero mundial deixará de receber cerca de 1,7 milhão de barris. Caso as relações internacionais piorem após o caso Khashoggi, a Arábia Saudita pode reduzir suas exportações, provocando um aumento nos preços. Isso traz de volta memórias da chamada "crise do petróleo" de 1973, quando uma recessão mundial foi provocada pela redução do fornecimento de petróleo pelos países da Opep, devido à Guerra do Yom Kippur.

No entanto, o reino não é importante só como exportador de petróleo, mas também como investidor. Só nos EUA, o país detém títulos no valor de quase 170 bilhões de dólares. E caso Riad os venda, as taxas de juros nos mercados de títulos subiriam maciçamente. Isso afetaria severamente a política financeira do governo Trump, que financia os atuais cortes de impostos com títulos do Tesouro.

No mundo árabe,se a Arábia Saudita é, para regimes repressivos como o Egito, um aliado valioso na luta contra movimentos de oposição, por outro lado é um Estado capaz de avançar sua agenda política de forma implacável.

Um exemplo é o boicote imposto no ano passado ao Catar, que ainda luta contra os efeitos das sanções do governo saudita, lançadas por insatisfação com a proximidade do emirado com seu arquirrival Irã e com a Irmandade Muçulmana. É por isso que o Catar vê no caso Khashoggi uma oportunidade para combater mediaticamente a Arábia Saudita.

Importante ator político e econômico, a Arábia Saudita adquiriu uma fama de Estado fora da lei devido ao caso Khashoggi. Por enquanto, Riad se limitou a responder com ameaças a seus parceiros. Mas se a indignação provocada pelo desaparecimento do jornalista não cessar nos próximos dias, o reino saudita pode ter que rever sua cultura política.

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