“Faltou boa índole”: os bastidores da aposentadoria compulsória de juíza bolsonarista
Desembargadores do TJMG aplicaram pena máxima a magistrada que foi acusada de faltar com o decoro em ofensas a advogados, ao STF e ao CNJ
Documentos a que a coluna teve acesso mostram que 20 desembargadores do Órgão Especial do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) votaram de maneira favorável à aposentadoria compulsória da juíza bolsonarista Ludmila Grilo.
Outros cinco desembargadores saíram derrotados do julgamento, pois defenderam a imposição de uma pena intermediária, a censura, que impediria por um ano qualquer promoção dela por merecimento.
Ludmila era titular da Vara Criminal e da Infância e da Juventude da comarca de Unaí (MG), mas desde meados de fevereiro estava afastada de suas funções pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Ela responde a outros dois processos disciplinares no CNJ. No TJMG, ela já tinha sofrido duas advertências em processos disciplinares.
Nesse novo processo disciplinar no TJMG, que resultou na sua aposentadoria compulsória, Ludmila respondia a quatro acusações: ofender o CNJ com memes em redes sociais, faltar com o decoro ao atacar advogados e seguidores do perfil @papodecriminalista do Instagram, fazer manifestações grosseiras sobre audiências de custódia no Twitter e atacar o Supremo Tribunal Federal (STF) em palestra promovida pelo governo Bolsonaro no Ministério das Relações Exteriores.
Na sessão do Órgão Especial do TJMG na última quarta-feira, 24, o relator do processo, desembargador Valdez Leite Machado, tinha defendido a punição de Ludmila com a pena de censura, mas ele só foi acompanhado nessa posição por outros quatro desembargadores.
Saiu vencedor o voto do corregedor do TJMG, Luiz Carlos de Azevedo Corrêa Junior, que abriu divergência ao defender a aposentadoria compulsória de Ludmila com rendimentos proporcionais ao tempo de contribuição, a maior punição prevista para magistrados em processos disciplinares.
Em seu voto pela aposentadoria compulsória da juíza, Corrêa Junior foi acompanhado pelo presidente do TJMG, José Arthur Filho, e por outros 18 desembargadores.
Em suma, os desembargadores entenderam que a juíza violou a Lei Orgânica da Magistratura e o Código de Ética dos juízes ao faltar com o decoro, a integridade e a dignidade necessários para a função nesses ataques e ofensas a advogados, ao CNJ e ao STF.
“Na espécie, as ações imputadas à processada vão frontalmente de encontro a tais obrigações, causando desprestígio à imagem de todo o Poder Judiciário e, em especial, a este Tribunal”, afirmou o desembargador José Arthur Filho em voto pela aposentadoria compulsória.
Um dos votos mais duros contra a juíza veio do desembargador Renato Dresch.
“Faltou à magistrada, aqui processada, não só a vocação para a magistratura, mas a boa índole, a retidão, indispensáveis ao exercício da judicatura”, afirmou o desembargador em voto pela aposentadoria compulsória.
Em depoimento no processo disciplinar, Ludmila falou que “existe censura” no Judiciário e “que esse processo administrativo é uma prova disso”.