Relator muda emenda que transformava “distúrbios civis” em terrorismo
Senador alterou texto de projeto de nova Lei Antiterrorismo após alertas de riscos à democracia em definição mais ampla de ato terrorista
O alerta de 10 organizações da sociedade civil surtiu efeito. Após críticas do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCRIM) e entidades como Conectas, Artigo 19 e Instituto Sou da Paz, o senador Jorge Kajuru (PSB-GO), relator da nova Lei Antiterrorismo na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), mudou o texto do projeto de lei (PL) 3283/2021 que será colocado em votação no colegiado.
Kajuru entregou na terça-feira, 25, um parecer que será votado sem a previsão de tratar qualquer “distúrbio civil” como “ato terrorista”.
Desde a aprovação e a sanção da Lei Antiterrorismo (13260/2016) organizações sociais já vêm alertando para o risco de projetos que ampliam genericamente as definições de terrorismo, para abarcar também movimentos políticos e protestos.
A atualização dessa lei, com o avanço do PL 3283/2021, motivou alertas de riscos à democracia, porque a Comissão de Segurança Pública do Senado tinha aprovado uma emenda ao texto que permitiria o tratamento de qualquer “distúrbio civil” como “ato terrorista”.
A emenda aprovada na Comissão de Segurança Pública do Senado incluía o seguinte parágrafo na Lei Antiterrorismo:
“Equiparam-se a atos terroristas as condutas praticadas, por qualquer razão com a finalidade de provocar distúrbios civis, em nome ou em favor de organização terrorista ou grupo criminoso organizado que”.
Uma nota técnica do IBCCRIM argumentou aos senadores que, com a redação proposta nessa emenda, qualquer “tumulto” poderia ser chamado de terrorismo, se aprovado o texto. Isso facilitaria inclusive a perseguição política a qualquer grupo de manifestantes, de acordo com os juristas da organização.
“A inserida noção de ‘distúrbio civil’, sem qualquer densificação, é demasiadamente imprecisa: qualquer suposta pretensão de causar ‘tumulto’ seria suficiente para caracterizar o elemento subjetivo. Ainda mais grave, abrir mão das motivações discriminatórias (art. 2º, caput, LAT) é romper a barreira que impediu ao longo de 7 (sete) anos que o antiterrorismo seja um instrumento de perseguição política”, diz nota técnica do IBCCRIM sobre o texto aprovado na Comissão de Segurança Pública.
Depois das críticas e dos pedidos da sociedade civil, Kajuru protocolou seu parecer sem essa definição de “distúrbios civis” para terrorismo. Nessa emenda, o novo texto passou a dizer que serão tratadas como atos terroristas quaisquer condutas "com a finalidade de provocar terror social ou generalizado".
"O termo ("distúrbio civil") é inadequado. Foi incluído em acordo na Comissão de Segurança Pública, por sugestão do governo que depois voltou atrás", afirmou à coluna o senador Alessandro Vieira (PSDB-SE).
No entanto, apesar da mudança no texto do projeto, o IBCCRIM avalia que não era necessário atualizar a Lei Antiterrorismo e que o texto ainda traz riscos ao direito constitucional à reunião. A pretensão do projeto é teoricamente endurecer o combate a milícias e outras organizações criminosas, mas a organização alerta para o risco do texto promover a "indevida criminalização de movimentos sociais, manifestantes e grupos políticos", "sob a pecha de terroristas".
A nova Lei Antiterrorismo deve ser votada em caráter terminativo na Comissão de Constituição e Justiça nos próximos dias, de onde seguirá para votação na Câmara dos Deputados.