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Daniel Haidar

RJ: “Mega chacinas policiais” ficaram mais frequentes com Cláudio Castro

Relatório de pesquisadores da UFF mostra que 33% das maiores matanças da polícia ocorreram nos últimos dois anos

5 mai 2023 - 00h01
(atualizado às 11h40)
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Manifestantes participam de protesto em entrada do Jacarezinho após chacina em operação policial
7/5/2021 REUTERS/Ricardo Moraes
Manifestantes participam de protesto em entrada do Jacarezinho após chacina em operação policial 7/5/2021 REUTERS/Ricardo Moraes
Foto: Reuters

Um estudo pioneiro, publicado nesta sexta-feira, 4, documenta como ficaram mais frequentes e letais as chacinas cometidas por policiais no estado do Rio de Janeiro durante o governo de Cláudio Castro (PL), reeleito no ano passado depois de assumir o poder em agosto de 2020 com o afastamento de Wilson Witzel.

Castro já chamou de “efeito colateral” os assassinatos cometidos por policiais em operações. 

O relatório “Chacinas Policiais: Estatização das Mortes, Mega Chacinas Policiais e Impunidade”, produzido pelo Grupo de Estudos dos Novos Ilegalismos (Geni) da Universidade Federal Fluminense (UFF), criou a classificação de “mega chacinas policiais” para aquelas matanças em que oito ou mais pessoas foram assassinadas.

Como é comum em pesquisas de segurança pública, o relatório da UFF considera como "chacina" qualquer matança em que três pessoas ou mais foram mortas. Os pesquisadores constataram que houve chacinas em 629 operações policiais do estado do Rio entre 2007 e 2022, nas quais foram assassinadas 2.554 pessoas. Nesse período, 27 dessas matanças (4,2%) tiveram 8 ou mais mortos – classificadas como “mega chacinas policiais”. E justamente um terço dessas 27 “mega chacinas” (9) ocorreram no período de 2020 a 2022. A chacina policial mais letal da história deixou 27 civis mortos no Jacarezinho, em maio de 2021.

Ocorreram “mega chacinas policiais” no governo Castro mesmo depois que o Supremo Tribunal Federal (STF) obrigou, em fevereiro do ano passado, que o governo do Rio de Janeiro coloque em prática um plano para reduzir a letalidade policial nas operações realizadas em favelas.

A ordem do Supremo não impediu que a segunda chacina policial mais letal da história fluminense fosse realizada na Penha, com 23 mortos em maio de 2022, e que a quarta chacina mais letal da história fosse praticada no Alemão, com 16 mortos em julho de 2022.

Outro dado estarrecedor do relatório é o fato de que só duas dessas 27 mega chacinas policiais tiveram os executores responsabilizados no Judiciário. No entanto, nenhum desses dois processos passou até agora da fase de instrução e julgamento.

Se consideradas todas as chacinas, como são chamadas as matanças com três ou mais mortos, também ficou mais frequente o envolvimento de agentes de segurança pública. Policiais foram responsáveis por 35,4% dos assassinatos na região metropolitana do Rio nos últimos três anos, constataram os pesquisadores.

O relatório atesta que aumentou a participação de policiais em mortes violentas desde 2013, o ano de menor participação de forças estaduais de segurança em assassinatos. Essa crescente letalidade policial reflete um processo de “estatização das mortes”, dizem os pesquisadores. O sociólogo Daniel Hirata, um dos coordenadores do GENI/UFF, explica por que a pesquisa chama esse fenômeno de “desencapuzamento das chacinas”.

“Se antes a maioria das chacinas era praticada por grupos de extermínio, em sua maioria formado por policiais da ativa ou reserva, fora de serviço, hoje as chacinas são praticadas principalmente por policiais em serviço, durante ações ‘avalizadas’ por seus superiores hierárquicos e amparadas pela impunidade concedida pelo Sistema de Justiça Criminal”, destaca Hirata.

O relatório foi elaborado pelos pesquisadores Daniel Hirata, Carolina Grillo, Renato Dirk e Diogo Lyra, com dados coletados pelo GENI/UFF e com a base de tiroteios do Instituto Fogo Cruzado.

Procurado, o Governo do Rio de Janeiro ainda não se manifestou sobre o relatório.  A Polícia Militar do Rio informou que a pesquisa seria comentada pela Polícia Civil. Procurada, a Polícia Civil do Rio respondeu que as operações dos policiais civis são realizadas "com base em decisões estratégicas e operacionais e por meio de trabalhos de investigação e inteligência, priorizando sempre a preservação de vidas". 

A assessoria de comunicação da Polícia Civil divulgou também um vídeo com observações críticas à pesquisa, expressas pelo delegado Felipe Curi, diretor de polícia especializada. "Se tem alguma mega chacina aqui, é contra a honra dos policiais, que diariamente dão o sangue e a própria vida para proteger a população do estado do Rio de Janeiro. Na verdade,  uma chacina é a morte ilegal, indeterminada e de forma aleatória de várias pessoas ao mesmo tempo. Isso não tem nada a ver com uma operação policial, que é uma ação legítima do estado, feita de forma planejada para cumprimento de ordens judiciais contra integrantes de organizações criminosas que geralmente reagem com extrema violência a tiros de fuzil, granadas e táticas de guerrilha contra as ações policiais", afirmou o delegado no vídeo sobre a pesquisa. 

"Os responsáveis por esse relatório estão rotulando as ações policiais de chacina e mega chacina sem qualquer critério técnico, científico, jurídico e metodológico. Em outras palavras, estão chamando policiais de assassinos e mega assassinos, o que é um verdadeiro absurdo. Em muitas das operações policiais que constam desse relatório já ficou provado que policiais agiram em legítima defesa. A Lei brasileira diz que não há crime quando qualquer pessoa age em legítima defesa. Para outras ações que ainda estão em apuração, é leviano fazer qualquer acusação ou pré-julgamento", acrescentou o delegado.

Fonte: Coluna do Daniel Haidar Daniel Haidar é jornalista. Foi editor da GloboNews, do JOTA e do Metrópoles. Trabalhou como repórter investigativo do El País Brasil, da revista ÉPOCA e da revista VEJA. Atuou também como repórter do jornal O Globo, do portal G1 e da rádio CBN. As opiniões do colunista não representam a visão do Terra.
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