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Derretimento de geleiras na Groenlândia e no Ártico aceleram aquecimento; entenda

Pesquisas mostram desaceleração da Circulação de Revolvimento Meridional do Atlântico (AMOC, na sigla em inglês) terá consequências para o clima e os ecossistemas de todo mundo.

19 nov 2024 - 03h25
(atualizado às 18h38)
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Icebergs derretendo no Oceano Ártico: desaceleração da Circulação de Revolvimento Meridional do Atlântico (AMOC, na sigla em inglês) terá consequências para o clima e os ecossistemas de todo mundo. Mozgova, Shutterstock
Icebergs derretendo no Oceano Ártico: desaceleração da Circulação de Revolvimento Meridional do Atlântico (AMOC, na sigla em inglês) terá consequências para o clima e os ecossistemas de todo mundo. Mozgova, Shutterstock
Foto: The Conversation

Uma vasta rede de correntes marinhas apelidada de "a grande correia transportadora global (great global ocean conveyor belt no original em inglês" está desacelerando. E isso é um problema porque esse sistema vital redistribui o calor em todo o mundo, influenciando tanto as temperaturas quanto as chuvas.

A Circulação de Revolvimento Meridional do Atlântico (Atlantic Meridional Overturning Circulation, ou AMOC, em inglês) canaliza calor do sul para o norte por meio do Oceano Atlântico, e é crucial para a estabilidade do clima e dos ecossistemas marinhos. Ela está mais fraca agora do que em qualquer outro momento nos últimos 1.000 anos, e o aquecimento global pode ser o culpado. Mas os modelos climáticos têm tido dificuldades para reproduzir as mudanças observadas até o momento - até agora.

Nossa modelagem sugere que o recente enfraquecimento da circulação oceânica pode ser explicado se levarmos em consideração a água derretida da camada de gelo da Groenlândia e das geleiras canadenses no Ártico.

Nossos resultados mostram que a circulação de revolvimento do Atlântico provavelmente se tornará um terço mais fraca do que era há 70 anos, com 2°C de aquecimento global. Isso traria grandes mudanças para o clima e ecossistemas, incluindo um aquecimento mais rápido no Hemisfério Sul, invernos mais rigorosos na Europa e enfraquecimento das monções tropicais do Hemisfério Norte. Nossas simulações também mostram que essas mudanças provavelmente ocorrerão muito mais cedo do que se suspeitava.

A Circulação de Revolvimento Meridional do Atlântico (Atlantic Meridional Overturning Circulation, AMOC): o que é e por que é tão importante? (National Oceanography Centre)

Mudanças na Circulação do Atlântico

A Circulação de Revolvimento Meridional do Atlântico é monitorada continuamente desde 2004. Mas é preciso uma visão de longo prazo para avaliar as possíveis mudanças e suas causas.

Há várias maneiras de descobrir o que estava acontecendo antes do início das medições. Uma técnica é baseada em análises de sedimentos. Essas estimativas sugerem que a Circulação Meridional do Atlântico atual é a mais fraca do último milênio e ficou cerca de 20% mais fraca desde meados do século XX.

As evidências sugerem que a Terra já aqueceu 1,5ºC desde a revolução industrial.

A taxa de aquecimento tem sido quase quatro vezes mais rápida no Ártico nas últimas décadas.

Água do degelo enfraquece a circulação oceânica

As altas temperaturas estão derretendo o gelo marinho do Ártico, as geleiras e a camada de gelo da Groenlândia.

Desde 2002, a Groenlândia perdeu 5.900 bilhões de toneladas (gigatoneladas) de gelo. Para colocar isso em perspectiva, imagine se todo o estado australiano de New South Wales (um pouco menor que Mato Grosso) estivesse coberto com uma camada de gelo de 8 metros de espessura.

Essa água doce derretida que flui para o oceano subártico é mais leve do que a água salgada do mar. Portanto, menos água desce para as profundezas do oceano. Isso reduz o fluxo para o sul de águas profundas e frias do Atlântico norte. Também enfraquece a Corrente do Golfo, que é o principal caminho do fluxo de retorno das águas quentes para o norte na superfície.

A Corrente do Golfo é o que proporciona à Grã-Bretanha invernos amenos em comparação com outros lugares à mesma distância do polo norte, como Saint-Pierre e Miquelon, no Canadá.

Nossa nova pesquisa mostra que a água derretida da camada de gelo da Groenlândia e das geleiras do Ártico no Canadá é a peça que faltava no quebra-cabeça climático.

Quando levamos isso em conta nas simulações, usando um modelo do sistema terrestre e um modelo oceânico de alta resolução, a desaceleração da circulação oceânica reflete a realidade.

Nossa pesquisa confirma que a Circulação de Revolvimento Meridional do Atlântico vem desacelerando desde meados do século XX. Ela também oferece um vislumbre do futuro.

Esquema simplificado da Circulação de Revolvimento Meridional do Atlântico no Atlântico Norte
Esquema simplificado da Circulação de Revolvimento Meridional do Atlântico no Atlântico Norte
Foto: The Conversation

À medida que se deslocam para o norte, a Corrente do Golfo e a Corrente do Atlântico Norte esfriam, perdendo calor para a atmosfera. As águas então se tornam densas o suficiente para afundar e formar as águas profundas do Atlântico Norte, que viajam para o sul em profundidade e alimentam outras bacias oceânicas. Modificado de Nature Reviews Earth & Environment (2020)

Conectividade no Oceano Atlântico

Nossa nova pesquisa também mostra que os oceanos Atlântico Norte e Atlântico Sul estão mais conectados do que se pensava anteriormente.

O enfraquecimento da Circulação de Revolvimento Meridional do Atlântico nas últimas décadas obscureceu o efeito do aquecimento global em áreas no Atlântico Norte, levando ao que foi chamado de "buraco de aquecimento".

Quando a circulação oceânica é forte, há uma grande transferência de calor para o Atlântico Norte. Mas o enfraquecimento da circulação oceânica significa que a superfície do oceano ao sul da Groenlândia aqueceu muito menos do que o restante.

A redução da transferência de calor e sal para o Atlântico Norte fez com que mais calor e sal se acumulassem no Atlântico Sul. Como resultado, a temperatura e a salinidade no Atlântico Sul aumentaram mais rapidamente.

Nossas simulações mostram que as mudanças no extremo do Atlântico Norte são sentidas no Oceano Atlântico Sul em menos de duas décadas. Isso fornece novas evidências observacionais da desaceleração da Circulação de Revolvimento Meridional do Atlântico no século passado.

Infográfico mostrando como o Atlântico Norte está conectado ao Atlântico Sul pela circulação de revolvimento
Infográfico mostrando como o Atlântico Norte está conectado ao Atlântico Sul pela circulação de revolvimento
Foto: The Conversation

A adição de água de derretimento no Atlântico Norte leva ao resfriamento localizado no Atlântico Norte subpolar e ao aquecimento no Atlântico Sul. https://www.nature.com/articles/s41561-024-01568-1

O que o futuro nos reserva?

As últimas projeções climáticas sugerem que a circulação de revolvimento do Atlântico se enfraquecerá em cerca de 30% até 2060. Mas essas estimativas não levam em conta a água de degelo que corre para o oceano subártico.

A camada de gelo da Groenlândia continuará derretendo no próximo século, possivelmente elevando o nível do mar em cerca de 10 cm globalmente. Se essa água de degelo adicional for incluída nas projeções climáticas, a circulação de revolvimento se enfraquecerá mais rapidamente. Ela poderá ficar 30% mais fraca até 2040. Isso é 20 anos antes do que foi previsto inicialmente.

Uma diminuição tão rápida da circulação de revolvimento nas próximas décadas afetará o clima e os ecossistemas. Espere invernos mais rigorosos na Europa e condições mais secas nos trópicos do norte. O Hemisfério Sul, incluindo a Austrália e o sul da América do Sul, poderá enfrentar verões mais quentes e úmidos.

Nosso clima mudou drasticamente nos últimos 20 anos. O derretimento mais rápido das camadas de gelo acelerará ainda mais a perturbação do sistema climático da Terra.

Isso significa que temos ainda menos tempo para estabilizar o clima. Portanto, é imperativo que a Humanidade aja para reduzir as emissões de carbono o mais rápido possível.

The Conversation
The Conversation
Foto: The Conversation

Laurie Menviel recebe financiamento do Australian Research Council.

Gabriel Pontes recebe financiamento do Australian Research Council.

The Conversation Este artigo foi publicado no The Conversation Brasil e reproduzido aqui sob a licença Creative Commons
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