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Desmonte põe em risco força-tarefa da Zelotes

Dos procuradores que apuram esquema de corrupção no Carf, um foi 'devolvido' para Estado de origem e o outro trabalha a distância

23 jul 2019 - 05h27
(atualizado às 07h32)
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BRASÍLIA - Deflagrada em 2015 para investigar esquema de corrupção no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), a Operação Zelotes enfrenta um desmonte que "pode prejudicar gravemente todo o trabalho". O alerta é do chefe em exercício da Procuradoria da República do Distrito Federal, Cláudio Drewes, que viu em poucos dias a força-tarefa que atua no caso se dissolver. A opinião dele é compartilhada por outro colega que acaba de ser retirado da operação. "Temo muito sobre o que vai acontecer", disse o procurador Alexandre Ismail.

A operação chegou a ter quatro procuradores. Hoje, conta apenas com um, que está nos Estados Unidos, onde faz um mestrado. O trabalho remoto impede Frederico Paiva de participar de audiências. O último a sair foi Ismail, que acaba de ser transferido para Roraima, seu Estado de origem. E contra sua vontade.

A sede da Procuradoria Geral da República, em Brasília
A sede da Procuradoria Geral da República, em Brasília
Foto: André Dusek / Estadão Conteúdo

Como resultado, nas duas últimas semanas ao menos seis audiências - como interrogatório de réus e de testemunhas - foram feitas por procuradores que não estão familiarizados com a operação. Isso em um momento em que mais de 20 processos considerados complexos estão sob instrução e ainda há investigações em andamento.

Em quatro anos de investigação, a Operação Zelotes já apresentou 20 denúncias criminais contra 113 réus, incluindo o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O petista foi acusado de tráfico de influência e lavagem de dinheiro nas negociações que levaram à compra de 36 caças do modelo Gripen pelo governo brasileiro - caso revelado pelo Estado em 2015. O ministro do Tribunal de Contas da União (TCU) Augusto Nardes é um dos investigados. Ele teria recebido propina para beneficiar uma empresa. O que nega.

Saída

A decisão de devolver o procurador Alexandre Ismail para Roraima, onde está lotado, é da procuradora-geral da República, Raquel Dodge. Ele atuava na operação há um ano. Seu pedido para permanecer no caso foi negado no último dia 11 e, até agora, um substituto não foi designado.

Procurada, a assessoria de Dodge nega o esvaziamento da operação e justifica que a saída se deu a pedido da Procuradoria da República de Roraima, onde Ismail é lotado. Afirmou, ainda, que um novo nome pode ser indicado para compor a equipe.

A força-tarefa diz que tenta, há um mês, uma audiência com Dodge, mas sem sucesso. "Eu sinceramente ainda estou tentando entender. Passamos mais de um mês buscando marcar reunião com ela. Até agora, estamos tentando digerir", disse Ismail.

"Pareceu irônico quando a gente viu na terça-feira (dia 16) que ela (Raquel Dodge) se reuniu com a Lava Jato e manifestou que estava os apoiando", complementou o procurador. Ele faz coro com o chefe da Procuradoria no DF sobre o futuro da operação: "A Zelotes é uma operação que já estava atuando sem estrutura necessária e agora vai ter ainda mais dificuldade para andar. Isso em um momento em que era necessário dar um gás para finalizar procedimentos. Obviamente se perde o fio da meada", disse.

Crítica

A nota do procurador Claudio Drewes com crítica nominal a Dodge causou desconforto na Procuradoria-Geral da República e, ontem, acabou removida do site da Procuradoria da República do Distrito Federal. No texto, Drewes alerta para o "encerramento da força-tarefa", para a perda de "memória do conjunto investigado e a integridade na linha investigativa" e para o "dano ao trabalho ora desenvolvido e ao que está por desenvolver".

A ordem para retirar a crítica da página teria partido da procuradora-chefe titular, Ana Carolina Alves Araújo Roman. O Estado tentou contato com ela, mas foi informado que está de férias. Drewes considerou que a medida "passou por cima de sua decisão e feriu a sua independência funcional".

Interlocutores de Raquel, por sua vez, afirmam que a nota tinha natureza política e que o retorno de Ismail a Roraima se deve ao fato de a unidade em que está lotado não ter dado a anuência necessária para a continuidade dele em Brasília.

A Procuradoria da República em Roraima justificou que a medida foi necessária devido ao crescimento na demanda diante da migração de venezuelanos.

Apesar de a posição da unidade original do procurador ter sido respeitada, há precedentes em que isso não ocorreu. A própria Dodge não teria ouvido a posição da Procuradoria da República de Guarulhos ao convocar uma procuradora para trabalhar em Brasília em abril. A unidade foi contra e acionou o Conselho Nacional do Ministério Público para ter a servidora de volta. A PGR não comenta.

3 PERGUNTAS PARA...

Alexandre Ismail, procurador da República e ex-integrante da Zelotes

1. Qual é o prejuízo à Zelotes com sua ida a Roraima?

A Zelotes é uma operação que já estava atuando sem estrutura necessária e agora vai ter ainda mais dificuldade para andar. Com a minha chegada, a operação retomou um ritmo mais forte, mas ainda aquém do necessário. Isso irá parar. Por exemplo: em ao menos seis audiências tivemos que contar com procuradores substitutos, de fora da Zelotes, para assumir em cima da hora. Eu falei com os substitutos, passei todo o caso, também são colegas competentíssimos, mas, obviamente, se perde um pouco o fio da meada. Perde-se também o fio da meada em investigações que estão em andamento.

2. Já houve crítica de falta de estrutura no passado. Como estava a situação antes da saída do sr.?

A Zelotes só contava comigo como procurador exclusivo. O Frederico (Paiva, outro procurador da operação) não era desonerado de seu ofício na Procuradoria da República do DF. Acumulava, além da Zelotes, o volume de trabalho normal dos ofícios criminais da unidade. Também não tínhamos nenhum assessor dedicado com exclusividade para a operação. Todos ficavam sobrecarregados.

3. Quais argumentos foram usados com a Procuradoria-Geral da República?

Muito foi conversado com o secretário-geral do MPF, Alexandre Camanho. A própria procuradora-geral da República (Raquel Dodge) não nos recebeu, apesar de muito termos tentado. Passamos mais de um mês tentando. Até agora, estamos tentando digerir. Não se pediu que se escolhesse um lado ou outro, mas que se encontrasse um meio termo. Propus acumular a carga de trabalho de Roraima junto com a da Zelotes, e compareceria periodicamente ao Estado para dar suporte em reuniões e audiências. Mas a informação foi apenas que havia necessidade de serviço em minha unidade de origem. Não sabemos se as propostas alternativas foram consideradas.

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