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"Doria tem mais preparo que o capitão", diz ex-bolsonarista

Depois de se engajar na campanha de Bolsonaro, Paulo Marinho defende governador tucano para sucessão em 2022

28 jun 2019 - 05h11
(atualizado às 09h59)
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Foto: Werther Santana / Estadão

Paulo Marinho ainda chama o presidente Jair Bolsonaro de "capitão". Cacoete da enorme proximidade adquirida ainda durante a campanha, em que mergulhou de cabeça, a ponto de ceder a própria casa como QG de gravações e reuniões políticas, e ser alçado a suplente na chapa do filho "01", Flávio Bolsonaro, ao Senado pelo PSL do Rio de Janeiro. Mas a proximidade durou pouco, e Marinho acaba de assumir a presidência do PSDB no Rio e um papel de igual destaque na caminhada de outro postulante ao Planalto, o governador de São Paulo, João Doria Jr.

Sem titubear, Marinho diz que Doria é mais preparado que o "capitão", e que vai se credenciar para vencê-lo graças à capacidade gerencial. Faz críticas à forma como Bolsonaro administra, à família presidencial e à falta de habilidade para lidar com o Congresso. A respeito do engajamento do passado, diz que viu em Bolsonaro um atalho para derrotar o PT, mas que nunca foi "um bolsominion".

"O João Doria tem mais preparo para essa missão que o capitão. A candidatura do capitão foi uma atalho para derrotar o PT. Feito isso, voltei para a origem do meu projeto político, que é ajudar o João Doria no projeto dele hoje", disse.

A seguir, os principais trechos da entrevista concedida nesta quinta-feira, em São Paulo.

O sr. foi um apoiador importante na campanha de Jair Bolsonaro, cedeu inclusive sua casa para gravações e reuniões, além de ser o primeiro suplente de Flávio Bolsonaro no Senado. O que o levou deixar o projeto tão rapidamente?

Comecei a me interessar pela eleição do ano passado no início de 2017, quando o então prefeito João Doria estava tentando costurar no PSDB a possibilidade de ser candidato. Tinha entusiasmo pela candidatura dele e achava que tinha todas as condições para ganhar a eleição. Fizemos vários movimentos para abrir espaço para ele no Rio de Janeiro, fizemos três reuniões naquele ano. Em novembro de 2017, fui procurado pelo meu amigo Gustavo Bebianno, que estava muito entusiasmado com a candidatura do capitão. Àquela altura a candidatura de Bolsonaro era uma piada, ninguém levava isso a sério. Mas começamos a ver que tinha espaço para crescer, com aquele movimento espontâneo nos aeroportos. Logo a rede do PSL tinha mais engajamentos que a do PT. Começamos a pensar: como vamos fazer a campanha? O PSL tinha R$ 9 milhões de fundo partidário, e o capitão não queria usar esse dinheiro. Começa ali com 8 segundos de televisão, vem um grupo da Paraíba, ligado ao deputado Julian Lemos, para fazer a campanha, e como não tínhamos estrutura para acolher e usamos um anexo da minha casa para gravar os programas ali. Aí virou uma coordenação da campanha lá em casa.

Como foi a negociação para você ser suplente do Flávio?

Dois ou três dias antes da convenção, Flávio me telefona e fala que queria me convidar para ser suplente dele ao Senado. Eu falei: 'Flávio, com muita honra, vamos tocar o barco'. Ajudei o Flávio muito na campanha. Aí teve o episódio do atentado, que muda o rumo da campanha. E quando ele volta já volta quase no segundo turno. Aí no segundo turno a gente monta de fato uma megaestrutura na minha casa, tínhamos 42 pessoas trabalhando ali quase 24 horas por dia, tendo de responder aos programas do PT quase de imediato.

Nessa ocasião, qual era sua expectativa pessoal: assumir o mandato em algum momento? Ter algum cargo no governo?

Nunca tive qualquer expectativa em relação a isso. Não quis assumir nenhum cargo no governo e nem houve acordo para assumir o mandato do Flávio em algum momento. Minha vontade era transformar aquela campanha que começou como uma piada num projeto vencedor. A candidatura do capitão serviu para derrotar o PT, para que houvesse alternância de poder. Foi esse papel que ele cumpriu.

Já na transição e logo depois da posse começaram as cotoveladas entre o grupo de vocês e o núcleo mais próximo ao presidente, notadamente a família. Quando o ciúme começou a minar as relações?

A semente do ciúme começa na campanha ainda. Como o Gustavo teve um protagonismo muito grande, e como o capitão tinha por ele, além da relação profissional, uma relação de afeto, isso foi o motivo principal pelo qual ele não permaneceu no governo. Isso gerou um descontentamento muito grande no grupo familiar e nos amigos, aquele grupo que convivia há quase 30 anos em torno do capitão, nos gabinetes deles, porque ali são todos gabinetes interligados. Pessoas que vinham com eles da vida inteira. Foi no final da campanha, quando o Gustavo ganhou esse protagonismo, que começou. Não imaginei que esse ciúme pudesse acabar com o desfecho da demissão do Gustavo em tão pouco tempo. O próprio Marcos Carvalho foi saído do grupo de transição três dias depois de ser convidado pelo Onyx. O 02 deu o primeiro tiro.

O 02 é o Carlos Bolsonaro?

02 é o Carlos.

Como você acha que essa relação com os filhos tem impacto político e administrativo no governo?

É isso que a gente tem visto desde que o governo começou, não tenho muito a acrescentar do que a gente vê no noticiário todo dia. Os episódios mais polêmicos do governo têm sempre a participação do núcleo familiar ou dos assessores mais próximos deles. É sempre o grupo mais próximo. Ele próprio é que incentiva essa coisa.

O problema é ideológico ou familiar?

Tem um pouco de tudo. Um pouco ideológico, e nesse campo eles são muito radicais no modo de pensar: só é bom quem pensa absolutamente como eles. Obviamente que essa questão da psicanálise também tem peso nessa coisa. Mas aí precisaria ressuscitar o Freud lá em Viena para ele poder avaliar.

Com a saída do Bebianno o sr. também se desligou do projeto.

Eu me afastei do projeto desde logo depois da campanha. Ele venceu no domingo, me pediu para ceder a casa para a primeira reunião. Foi o último dia que tive contato com ele. Mas não tem nada de estranho nisso. Como eu não estava no governo, não tinha intenção de participar, a minha participação se encerra ali.

E com o Flávio, qual foi seu combinado?

Não tive nenhuma combinação com o Flávio. Nunca pedi que me convidasse. Quando me procurou, aceitei e pronto. Não tenho a menor expectativa de assumir esse mandato, apesar de o capitão ter dito num evento público do PSL que, em algum momento, ia sugerir ao filho que tirasse uma licença para que eu assumisse. Depois surgiu esse episódio do Queiroz, e eu tô convencido que o Flávio não tem qualquer ingerência nisso. Em algum momento foi traído na confiança dele com o Queiroz. Acho isso mesmo, digo na maior tranquilidade, não é para fazer média. Mas de qualquer maneira é um noticiário incômodo, a exposição fica muito grande. Quanto mais rápido ele puder superar, melhor para ele e para o governo.

Essa forma de lidar com aliados, fritando e depois cortando a cabeça, atrapalha o governo?

Sinceramente, esperava que o governo fosse trabalhar de maneira mais coordenada, sobretudo na relação com o Congresso. O que vimos até agora foram muitos desencontros. Se ele não encontrar uma maneira de lidar com o Congresso vai ter problemas até o final. Ele tem sido muito generoso com a imprensa, o capitão: gera notícias todo dia, e notícias que não são exatamente positivas.

O que o levou tão rapidamente a se filiar ao PSDB e a voltar a construir uma candidatura Doria?

Eu tenho uma relação de mais de 30 anos com o João Doria. Na campanha para prefeito, eu estava ajudando o Osório no Rio de Janeiro. Tive uma reunião com o Doria. Tenho uma relação pessoal, de amizade, com o governador, que se transformou numa relação política. Acho que ele era e é a melhor alternativa. Tomara que o Brasil consiga enxergar a oportunidade de eleger o João Doria presidente, e espero que isso aconteça nas próximas eleições.

Por que ele é melhor que o Bolsonaro?

Primeiro em termos de preparo. O João Doria tem mais preparo para essa missão que o capitão. A candidatura do capitão foi uma atalho para derrotar o PT. Feito isso, voltei para a origem do meu projeto político, que é ajudar o João Doria no projeto dele hoje. Principalmente fazer um governo bem sucedido em São Paulo, que é o que vai credenciá-lo a chegar a 2022 como uma candidatura natural. Ele sabe disso, e tem dito que não é oportuno discutir a sucessão agora.

Mas as questões se antecipam. Essa discussão sobre a Fórmula 1, por exemplo, mostra que 2022 já começou.

O Brasil tem a tradição de começar a discutir a eleição seguinte no dia seguinte da eleição. Mas essa questão de 2022 está sendo trazida a baila muito mais pelo próprio Bolsonaro. Ele pregou durante toda a campanha que era absolutamente contra o instituto da reeleição, mas de repente se coloca como candidato à reeleição.

Qual seu projeto para fazer o PSDB ser relevante no Rio de Janeiro, algo que ele nunca foi?

No Rio de Janeiro, o PSDB está na mesma situação da cidade: completamente abandonado, a ponto de não ter sido capaz de eleger sequer um deputado federal. A primeira coisa que precisa acontecer no PSDB do Rio é abri-lo a novas filiações. Foi gerido nos últimos anos de forma cartorial, a serviço de candidaturas proporcionais, para usar tempo de TV e a estrutura que o partido oferece. E agora há uma liderança de projeção nacional, que é o governador de São Paulo. E ele tem dito que é importante trazer a juventude do Rio de Janeiro para participar. Isso é muito difícil, fazer os jovens se engajarem na vida partidária, fora das redes sociais. Mas a gente precisa mostrar que só há espaço para mudança por meio da política, dos partidos.

Mas você acaba de deixar um projeto que investiu na demonização da política e na polarização. Como caminhar agora ao centro?

Não tenho nenhuma dificuldade de fazer isso. Até porque apoiei a candidatura do Bolsonaro sem concordar com muita coisa que ele pensa. Nunca fui um bolsominion, por exemplo. O futuro do Rio não passa nem pela extrema direita nem pela extrema esquerda.

E no plano nacional, o centro tem espaço? Não corre o risco de chegar a 2022 dividido entre Doria e Luciano Huck, por exemplo?

Acho que o Luciano Huck vai acabar pensando na possibilidade de representar esse grupo, porque hoje ocupa uma parte do seu tempo a pensar um projeto de país. Mas o que vai credenciar o governador João Doria será o trabalho que está fazendo no governo de São Paulo. Ele chegará a 2022 com uma musculatura capaz de fazer as pessoas entenderem que ele é o mais viável. Não acredito nem que alguém vá se colocar como alternativa no mesmo eixo dele. Se continuar fazendo o governo bem sucedido que vem fazendo será o candidato natural.

Bolsonaro será candidato à reeleição?

Tem uma deputada muito importante em São Paulo que, logo depois da eleição, fiz uma aposta com ela. Ela dizia que o capitão seria candidato à reeleição e eu dizia que não. Acho que vou perder a aposta. Bolsonaro e Doria vão se encontrar lá na frente numa disputa eleitoral. Foi até bom o Doria ter deixado de ser candidato nesta eleição, ter passado por uma eleição duríssima como foi a de 2018. Muita gente que diz o Doria se apropriou da força do capitão no segundo turno com aquele negócio do Bolsodoria, e eu te digo, conhecendo os bastidores, que ele não deve em nada ao capitão a eleição dele. Aquela expressão foi muito mais para mostrar que ele em São Paulo representava o anti-PT do que apoio ou não do capitão.

Mas não deixou de ser conveniente para ele. Inclusive ele foi à sua casa para tentar obter um apoio formal, o que não ocorreu.

Aquilo foi uma visita mais de cortesia, para um encontro que acabou não acontecendo. Houve um encontro com o Gustavo, para discutir as teses da campanha. Posso te garantir que não houve nenhum movimento pró-Doria aqui em São Paulo. Pelo contrário: o Major Olímpio foi um dos maiores adversários dele. Ele teve de vencer muitos adversários. E ter vencido essa eleição do jeito que ganhou deu a ele uma condição diferenciada para disputar 2022.

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