Brasil tem mais de 2,6 mil pessoas superinteligentes; o que é preciso para ser considerado um?
Presidente da Associação Mensa Brasil destaca que número identificado ainda é pequeno e que faltam políticas públicas para desenvolvimento
Raciocínio rápido, altas habilidades sociais e criativas. Essas são alguns dos aspectos prevalentes em mais de 2,6 mil brasileiros comprovadamente superinteligentes. Deste número, 534 são crianças e adolescentes. Os dados são da Associação Mensa Brasil, entidade que reúne pessoas com altas capacidades intelectuais, e representante oficial da Mensa Internacional, principal organização de alto Quociente de Inteligência (QI) do mundo.
Mas afinal, o que é preciso ter mais para ser considerado alguém com altas habilidades? Em entrevista ao Terra, o presidente da Mensa Brasil, Rodrigo Sauaia, explicou que para ser considerado uma pessoa superinteligente, é necessário ter resultado no teste de QI, devidamente registrado, que comprove o resultado 2% superior ao restante da população geral. “Ou seja, 98% acima da média dos resultados”, destaca.
Entre as habilidades, estão:
• Raciocínio rápido para resolver problemas;
• Boa memória de longo prazo: capta as informações e as recupera com facilidade quando necessário (lembra-se de nomes ou rostos de pessoas que não vê há muito tempo, datas históricas, imagens, números etc.);
• Boa memória operacional: capta e processa diferentes tipos de informações ao mesmo tempo;
• Consegue diferenciar sons e visualizar detalhes em imagens com muita facilidade;
• Rápida curva de aprendizado, apresentando habilidades avançadas para a sua idade cronológica: crianças que aprendem a ler aos 3 anos ou antes; crianças que conseguem compor uma música sem nunca ter estudado para isso etc;
• Excelente desempenho em uma ou mais disciplinas em comparação a seus pares;
• Grande interesse por um assunto e especial dedicação a ele;
• Alto grau de curiosidade;
• Criatividade;
• Habilidade para adaptar ou modificar ideias;
• Facilidade em fazer observações perspicazes;
• Persistência ao buscar um objetivo;
• Comportamento que requer pouca orientação do professor;
• Liderança e autoconfiança.
Pode ser descoberta nos primeiros anos de vida
O presidente da associação afirma que os sinais podem ser descobertos já na primeira infância, e que quanto mais cedo forem avaliados, melhor o direcionamento para a formação. “Inclusive para antever potenciais desafios e oportunidades, e melhor aproveitá-los”, explica.
É o caso da pequena Athena Silveira, de 3 anos, a criança superinteligente mais nova a entrar na Mensa. Os pais começaram a perceber os sinais logo nos primeiros meses de idade, pois ela nunca foi um bebê de chorar quando queria algo, tentava sempre verbalizar.
“Com dez meses apenas ela já escalava os móveis de casa. Tem criança que aprende a andar com um ano. A gente tem vídeo da Athena com dez meses escalando o sofá até o topo”, relembra o pai, Daniel Silveira. Por isso, a família teve até que adaptar a casa para que ela não sofresse nenhum acidente.
A menina nasceu pouco antes da pandemia, e não tinha quase interação com outras pessoas além da família devido ao isolamento. Quando a situação sanitária do país melhorou, e eles começaram a sair mais de casa, foi então que a desenvoltura dela chamou a atenção, inclusive, por desconhecidos.
“Com 2 anos ela ia numa loja com a mãe escolher uma cor de esmalte, ela falava a cor, pedia para ir no caixa, e falava: ‘tia, você pode botar numa sacolinha pequena para eu carregar por favor?’”, conta.
Na escola, a menina está um ano à frente, com crianças de quatro e cinco anos, e seu vocabulário também é de uma criança maior. Os pais também optaram por iniciá-la na alfabetização, mas com cuidado para que ela não se sinta entediada. Ela já aprendeu as consoantes, reproduz algumas coisas em inglês, inclusive sabe contar de um a dez na língua americana.
Athena tem altas habilidades na parte social, criativa e raciocínio lógico. Daniel explica que existe o lado bom de ser superinteligente, mas que há também a preocupação de suprir a necessidade que Athena vai ter ao longo da vida.
“Temos o medo dela ficar entediada alguma vez na escola, e se isso acontecer, trabalhamos em pular ela de ano, fazer alguma coisa. Mas também não queremos sobrecarregá-la. Uma coisa que vamos muito é que as crianças com altas habilidades elas se sentem na obrigação de suprir um rótulo dado a ela, e quando ela não conseguem alguma coisa, vem uma frustração que não consegue lidar. Então a primeira coisa que fazemos é não dar rótulo à Athena”, comenta.
Além da pequena, Daniel também passou pelo teste que comprovou sua alta performance. A filha mais velha dele, Alexandra, de 8 anos, também tem um QI alto, mas não teve paciência para concluir a avaliação.
Não há um padrão
Sauaia afirma que não existe um padrão de pessoas superinteligentes, pois não há um grupo homogêneo e com perfil específico: “Isso significa dizer que é possível identificar pessoas superinteligentes de várias etnias, gêneros, classes sociais, níveis de escolaridade, situação econômica, personalidades, e com as mais variadas visões de mundo.”
Ainda falta muito
Sobre o número de brasileiros comprovadamente superdotados, o presidente da Mensa diz que ainda é uma gota em um oceano de oportunidades, e que é preciso que sejam desenvolvidas ações governamentais e públicas para identificação dessas pessoas. Isso pode ter reflexos positivos e significativos para nossa sociedade.
“Porque se olharmos para os 2% por cento da população brasileira que pode apresentar esses sinais de uma inteligência muito acima da média, nós estamos falando em um potencial de quatro milhões de indivíduos”, aponta.
Segundo ele, se já nos primeiros anos forem identificadas pessoas com esse potencial muito elevado, e dar o apoio necessário, isso poderá refletir positivamente na sociedade, principalmente em questões relacionadas a construir soluções e resolver problemas de interesse geral da população.
“É importante que haja luz para esse assunto porque nós já estamos muito acostumados como sociedade a realizar testes e medições sobre as nossas características físicas e fisiológicas. Nós deveríamos ter o mesmo cuidado com relação ao nosso desenvolvimento cognitivo por meio dos testes de QI que nos ajudam a ter parâmetros científicos e objetivos para ajudar no processo de formação e desenvolvimento cerebral e cognitivo das pessoas”, finaliza.