Brasileira de 18 anos passou em 8 universidades americanas
Ex-bolsista precisa arrecadar US$ 58 mil para cursar física no exterior e lançou campanha de arrecadação
Naquele dia, o almoço era especial. Letícia sentou-se à mesa para comer com a família. Simone, sua mãe, preparou um canelone, um dos pratos preferidos da filha. A data marcava não só o aniversário de 18 anos da jovem, mas uma conquista incomum para um brasileiro: Letícia acabara de ser aprovada em oito universidades americanas.
Apesar de uma condição financeira razoavelmente confortável, o sonho de Letícia Mattos da Silva, filha de pai militar, extrapola a renda familiar. Para conseguir o visto de estudante e poder iniciar o curso, a jovem precisa arrecadar US$ 58 mil, cerca de R$ 186 mil. O prazo terminaria no dia 1º de julho, quando precisava comprovar à Universidade da Califórnia que possuía a verba para custear os estudos e suas necessidades básicas no exterior. Como o valor necessário ainda não foi arrecadado, o prazo se estendeu para 13 de julho.
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O montante é referente apenas ao primeiro ano de estudos e cobre as despesas de anuidade, moradia, alimentação, plano de saúde obrigatório e material didático da instituição. “Depois do primeiro ano, tenho mais três pela frente. Vou tentar usar meu desempenho acadêmico para diminuir o valor das taxas junto à universidade", projeta a jovem.
Se o plano der certo, essa não será a primeira experiência internacional da rondoniense, que há seis anos adotou Porto Alegre (RS) como casa. Em 2013, a estudante foi selecionada em um curso de verão da Universidade de Harvard. Foi quando o orçamento da família apertou. Na época, a menina estudava no tradicional Colégio Farroupilha, em Porto Alegre, com mensalidades que giram em torno dos R$ 2 mil para o ensino médio. “Era um esforço que nós fazíamos para que eu pudesse estudar em uma boa escola. Esse valor já estava fora da nossa realidade, mas meus pais sempre priorizaram a educação e nós deixávamos de gastar em outras coisas”, conta Letícia, filha única do casal.
Além disso, a mãe dela havia sido diagnosticada com câncer em 2008. Desde então, sem emprego, passou por tratamentos e três cirurgias, sem sucesso para a retirada do tumor. A doença da mãe levou a família a expor a situação para a escola e pedir ajuda. O colégio concedeu uma bolsa para Letícia e estornou o valor pago de mensalidades anteriores. Este dinheiro serviu para pagar o programa de dois meses em que Letícia cursou Introdução à Prova Matemática e Fundamentos Contemporâneos da Astronomia, em Harvard.
Vestibular
Foi o período fora do País que moldou o sonho de Letícia. Ela voltou convencida de que queria trabalhar com pesquisa na área de Física, campo dominado pelas instituições norte-americanas. Em 2014, depois de formada no ensino médio e de ser aprovada para os cursos de Astronomia, na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), e de Física Médica, na Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA), a jovem decidiu focar nos processos seletivos das universidades de fora. “Eu vi que conseguia passar no vestibular daqui, então decidi arriscar nas faculdades de fora e ver o que acontecia”. A estudante se inscreveu em 12 instituições americanas, passou em oito.
Mas era a Universidade da Califórnia, em Santa Bárbara, a que mais chamava sua atenção. Classificada entre as melhores no ensino de Física no mundo, a resposta da faculdade veio no dia 16 de março, às 20h pelo horário de Brasília. Ao anoitecer, antes da hora marcada, Letícia acessou diversas vezes o site da instituição. No horário previsto, o pai, Edmar, finalmente soube do resultado. “Eu já tinha desistido de ficar atualizando o site e tentei relaxar. Meu pai entrou e viu que eu tinha passado. Imprimiu a carta da universidade e me chamou. Foi muito emocionante. Liguei para a minha mãe, que estava no hospital, e contei. Ela começou a chorar tanto que o médico achou que estivesse passando mal”, relembra, rindo, a menina.
Agora, o colégio se une mais uma vez para ajudar a estudante. Para realizar o sonho da ex-bolsista, a Associação Beneficente e Educacional 1858, mantenedora do colégio Farroupilha, lançou uma campanha de arrecadação coletiva, com o intuíto de arrecadar doações. A escola deve disponibilizar um relatório sobre o montante do dinheiro conseguido. Caso a quantia total não seja atingida, as contribuições serão devolvidas aos doadores e, em caso de doação anônima, os valores serão revertidos para caridade
Futuro
O valor arrecadado até o momento é equivalente a cerca de 30% do preciso para custear os estudos e as necessidades básicas no exterior. Além da campanha de arrecadação organizada pelo colégio, Letícia também buscou apoio de instituições privadas que tivessem interesse em patrocinar o projeto. Se o valor integral não for alcançado e ela não puder viajar, a ideia é fazer vestibular novamente e cursar uma faculdade no Brasil. Porém, a menina ainda não tem certeza se continuará morando em Porto Alegre, pois a mãe terá de fazer outra cirurgia e, talvez, a família se mude de cidade.
Ainda que o futuro seja incerto, a menina não desiste dos seus sonhos. “Pode não ser agora, mas de repente durante a graduação ou mestrado eu consiga uma bolsa do governo para estudar fora. É o que eu quero e, em algum momento, estudarei em uma universidade do exterior que seja forte na minha área”, planeja.