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É possível vencer a Gupy? Especialistas explicam lógica da IA de recrutamento e seleção

Recente movimento contra a plataforma de RH reacendeu discussão sobre seleção online das vagas de emprego

5 jun 2024 - 05h00
(atualizado às 09h49)
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Foto: Freepik

Há quem diga que o Linkedin é a rede social das amenidades. Por lá, o termo "desempregado" vira "em busca de recolocação profissional", ou "open to work" (aberto ao trabalho, na tradução livre do inglês) e toda demissão é encarada como o "fim de um ciclo", e não o desemprego.

Na Faria Lima da internet, é difícil encontrar críticas às empresas. Mas não impossível, já que um movimento de boicote tem mudado essa realidade nas últimas semanas. Insatisfeitos com a metodologia de recrutamento e seleção usada pelas organizações, profissionais se voltaram contra a Gupy e sua ferramenta de inteligência artificial.

Os relatos na rede social têm ponto em comum: suposta exclusão de bons currículos por causa da IA. Os usuários do LinkedIn apontam a dificuldade em encarar as enormes trilhas nas plataformas de recursos humanos, e nunca serem chamados para as fases seguintes, mesmo que tenham o perfil para determinada vaga. 

Por outro lado, em uma busca rápida no site da startup de recrutamento e seleção, diversos textos explicam a lógica da automação: não há exclusão de perfis, mas ranqueamento dos candidatos, para que a equipe escolha com mais praticidade entre milhares de currículos. Essa prática funciona com o Applicant Tracking System (ATS), um software de armazenamento de dados que promete facilitar a vida dos recrutadores.

Do currículo impresso às trilhas online

Quando o tema do suposto boicote às plataformas de processo seletivo viralizou, Luciana Ditter de Azevedo não perdeu a oportunidade de dar sua opinião sobre o assunto no LinkedIn. Profissional de Recursos Humanos há mais de 10 anos, é criadora de conteúdo na rede social e se autointitula "o RH mais sincero do Brasil". 

Experiente na área, Luciana lembra de quando não tinha internet para ajudar na seleção de candidatos.

"Sou do tempo em que o recrutamento era realizado em estádios de futebol e ginásios (risos). Fazíamos uma pré-seleção com microfone e solicitávamos o preenchimento das fichas em papel", lembra. Hoje, o processo é, em maioria, automatizado. 

Naquela época, quem morava no Rio de Janeiro nem ficava sabendo da vaga dos sonhos que surgiu para o seu perfil na Bahia. Com as redes sociais e plataformas de seleção, o cenário mudou. Esse, defende Luciana, é o lado bom da digitalização do processo seletivo. 

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Mas se a internet facilita a vida do candidato na hora de encontrar uma vaga em qualquer lugar do mundo e no momento da entrevista, há na contramão a angústia para conseguir chegar a esse bate-papo com o recrutador. Enquanto milhares de pessoas se candidatam a uma vaga na Gupy, por exemplo, profissionais de RH usam a inteligência artificial para a triagem dos currículos. E é aí que a "mão invisível do mercado" age. 

Segundo Alexandre Cappellozza, coordenador do Programa de Pós-Graduação em Administração do Desenvolvimento de Negócios da Universidade Presbiteriana Mackenzie, o ATS funciona para recepção, armazenamento e organização dos currículos e documentos dos candidatos. Para tanto, realiza ainda triagem dos candidatos e gerenciamento do processo seletivo -- como agendamento de entrevistas, comunicação e acompanhamento das candidaturas. 

Sem a ajuda da IA, os recursos empenhados para a análise de tantos perfis teriam que ser sobrehumanos, ele diz. Por esse motivo, Cappellozza acredita que as corporações ganham mais que os candidatos com o uso dos softwares das plataformas de RH.

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"Especialmente as que lidam com maior rotatividade dos funcionários, processos seletivos com uma grande quantidade de candidatos ou que necessitam de agilidade", argumenta o professor.

No entanto, isso não significa que o profissional em busca de emprego dê com a cara na porta, mesmo que virtualmente. Cappellozza destaca que o ATS ajuda a evitar escolhas pessoais dos recrutadores.

"Um possível viés do recrutador sobre algum aspecto do candidato pode impactar sua contratação, tal como uma afinidade pessoal entre esses atores, por exemplo. O ATS permite a redução desses possíveis vieses humanos e um retorno mais ágil aos candidatos por conta de sua agilidade nas operações", afirma Alexandre Cappellozza. 

Há falhas na seleção com ATS?

Se para Cappellozza a IA pode atenuar possíveis vieses humanos, para Luciana Ditter de Azevedo não é bem assim. A profissional de RH acredita que o digital é só um reflexo do presencial, com todas as problemáticas inseridas.

"Muitas empresas utilizam a tecnologia como 'muleta', justificando seus péssimos processos seletivos e de gestão de pessoas, alegando que é culpa do sistema e da tecnologia", diz. 

Segundo a consultora em recolocação profissional, a customização ilimitada, que permite à corporação personalizar os processos seletivos sem restrição, seria um problema. Isso porque, apesar de ser um sistema automatizado, a IA precisa de comandos humanos. É justamente aí que as falhas do processo seletivo online se destacam.

Cappellozza concorda com esse aspecto, e reconhece: "Os algoritmos que governam a triagem dos candidatos ou os dados históricos que foram utilizados para alimentar o sistema também podem conter seus vieses próprios". 

Isso significa que as corporações podem restringir candidatos até mesmo com base em faixa etária e gênero.

"Se a IA entender que uma candidata mulher tem aderência de 90% com a vaga e, mesmo assim, a empresa se recusar a contratar mulheres, a vontade da empresa será acatada através dos filtros que a plataforma disponibiliza", exemplifica Luciana Ditter de Azevedo. 

O professor também ressalta outro ponto negativo do uso de IA: as palavras-chave.

"Se os candidatos, ainda que possam ser bem qualificados e preparados, não ajustarem seus currículos com os termos procurados pelo sistema, por exemplo, eles podem ser reprovados durante o processo seletivo de forma automática. Além disso, a avaliação das soft skills, criatividade ou outras competências pode não ser confiável", acrescenta. 

Mas 'boicote' não resolve

A frustração em sempre perder nesse jogo, segundo Luciana Ditter de Azevedo, é o que fez os candidatos falarem sobre o assunto mais abertamente e cogitarem um boicote à Gupy, uma das mais famosas plataformas de RH do Brasil. Para a consultora, não existe só um 'algoz'. É necessário olhar para a relação entre a plataforma e os contratantes.

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Por outro lado, avaliar a conduta das empresas seria motivo de perda para startups de RH. 

"Um posicionamento mais 'incisivo' [das plataformas], com certeza ocasionará na perda de contratos. As empresas sabem disso, e sabem também que podem a qualquer momento migrar de plataforma e terem seus desejos plenamente atendidos. Os candidatos, por sua vez, precisam estar onde as vagas estão, então, acabam presos em um contexto de 'se você não quer, tem quem queira'", argumenta. 

Em nota ao Terra, a Gupy esclareceu que a IA otimiza os processos de RH, mas "não exclui a necessidade da ação humana" em qualquer momento da interação entre empresa e pessoa candidata. A empresa afirmou ainda que a IA não toma decisões pelas empresas contratantes e pessoas recrutadoras. 

A plataforma ainda garantiu que a IA não é responsável por eliminar ou aprovar candidatos durante o processo seletivo.

"A partir dos critérios determinados pela empresa, a IA ordena os candidatos com base em dados objetivos, como experiências profissionais e acadêmicas, habilidades, conquistas e resultados. Desclassificações automáticas só ocorrem por requisitos eliminatórios definidos pelas empresas. Isso não envolve IA. Por exemplo, se uma vaga exige que a pessoa dirija, o RH pode programar o sistema para excluir candidatos que não possuem CNH", diz o posicionamento da Gupy. 

De acordo com a Gupy, toda a configuração da plataforma, incluindo a escolha de testes, critérios de movimentação de etapas e envio de feedbacks, é determinada pela empresa a fim de reduzir vieses. A plataforma ainda esclarece que a IA usada não se baseia em palavras-chave, mas em todo o currículo da pessoa candidata e na descrição de experiências e resultados atingidos anteriormente.

"Para aumentar suas chances de sucesso em plataformas de recrutamento como a Gupy, é fundamental destacar suas habilidades e conquistas de maneira específica e contextualizada. Em vez de usar termos genéricos, descreva suas responsabilidades e realizações com detalhes concretos - por exemplo, se você trabalha com redes sociais, use frases como 'gerenciamento de projeto de rede social que aumentou em 60% o volume de seguidores'", explica a startup. 

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A Gupy também reforçou que atua para treinar e apoiar os profissionais das empresas responsáveis pela configuração e gestão dos processos seletivos na plataforma. 

Para atualizar o LinkedIn

Mesmo com as questões que envolvem o uso de inteligência artificial em plataformas de vagas, é fato que elas estão sendo cada vez mais utilizadas nos processos de seleção das empresas. Para os que não veem a hora de atualizar a página do LinkedIn com o novo emprego, a consultora Luciana Ditter dá algumas dicas: 

  • Seu cadastro é seu currículo. No caso da Gupy, é ainda mais importante ter um ótimo cadastro, pois a plataforma só permite um único cadastro para todas as vagas;
  • Separe algumas vagas de seu interesse, rastreie palavras chaves técnicas e replique-as no seu descritivo de atividades cadastrado, criando frases com elas. Importante observar que você precisa de fato, ter aquela experiência, pois seu cadastro ainda será visto por um ser humano na etapa de entrevista;
  • Nas plataformas que permitem personalização por vaga, faça um checklist dos requisitos e atividades das vagas, localizando aqueles que você possui experiência e garanta que estão inseridos no seu material. Não se trata de cópia, e sim de rastreio e descritivo personalizado conforme sua experiência

Para as empresas, a dica escolhida pela profissional leva em consideração o diálogo com os concorrentes à vaga.

"Uma recomendação é que as empresas instruam os candidatos na preparação dos seus currículos e ajustem o uso da IA com a atuação humana, para evitar a perda de bons candidatos. Também é importante que elas promovam a transparência nesses processos", aconselha. 

Fonte: Redação Terra
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