Começa nesta segunda-feira o processo de avaliação e acolhimento dos médicos com diploma estrangeiro e sem revalidação que vão atuar por três anos em regiões carentes, como municípios do interior e periferias das grandes cidades, pelo programa Mais Médicos. Até o fim do dia, todos os 644 profissionais previstos na primeira fase devem estar no Brasil.
A vinda dos profissionais foi um dos pontos mais polêmicos do Mais Médicos, já que eles não vão precisar passar pelo Exame Nacional de Revalidação de Diplomas Médicos (Revalida), que tem alto índice de reprovação e que é obrigatório para os médicos com diploma estrangeiro atuarem no Brasil. Para as entidades médicas, a não revalidação do diploma deixa a população sem garantia da qualidade dos profissionais. Em vários estados brasileiros, médicos foram às ruas nos últimos dias para protestar contra o programa.
Segundo a doutora em saúde pública e professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Lígia Bahia, que foi conselheira do Conselho Nacional de Saúde (CNS), há experiências internacionais que mostram haver maior incidência de erros em procedimentos médicos cometidos por estrangeiros. "Dispensar testes de habilitação pode ser uma medida emergencial e provisória. Para a população que vivencia uma verdadeira via crucis para obter atendimento, a possibilidade de ter um acesso facilitado é sempre positiva. No entanto, sem algum tipo de certificação de competência, haverá dúvidas sobre a qualidade da formação dos médicos que se candidatarem ao edital proposto pelo governo".
O ministro da Saúde, Alexandre Padilha, no entanto, defende que as três semanas de ambientação, nas quais os profissionais estrangeiros terão aulas, em universidades públicas federais, sobre saúde pública, com foco na organização e funcionamento do Sistema Único de Saúde (SUS) e língua portuguesa, servirão também para os médicos serem avaliados pelas universidades brasileiras, "podendo inclusive ser reprovados".
As entidades médicas criticam ainda o tipo de vínculo, considerado por elas precário, que os profissionais estrangeiros que vierem ao país pelo Mais Médicos terão. Eles receberão uma bolsa-formação no valor de R$ 10 mil, sem contrato empregatício. "Eles pagam uma bolsa de estudo, mas esses profissionais vêm é trabalhar e não estudar", disse o presidente da Federação Nacional dos Médicos, Geraldo Ferreira.
O Ministério da Saúde defende que a bolsa prevista consiste em uma "bolsa-formação", uma forma de remuneração para a especialização na atenção básica, que será feita ao longo dos três anos de atuação no programa. Além disso, a pasta argumenta que os médicos vão ter que contribuir com a Previdência Social, para terem direito a licenças e outros benefícios.
<a data-cke-saved-href="http://noticias.terra.com.br/educacao/infograficos/revalida/" href="http://noticias.terra.com.br/educacao/infograficos/revalida/">Revalida: exame justo ou feito para reprovar?</a>
Médicos cubanos
Inicialmente, o programa, que foi lançado no começo de julho por medida
provisória, só previa inscrições individuais, ou seja, o próprio médico se inscrevia. Porém, com este modelo, o programa só preencheu 10% da demanda de 15.460 profissionais apresentada pelos municípios. Foi então que Padilha anunciou que buscaria convênios internacionais.
Paralelamente, o início da negociação para um acordo com o governo cubano já havia sido divulgado em maio, quando o ministro das Relações Exteriores, Antonio Patriota, disse que 6 mil médicos vindos de Cuba atuariam nas regiões carentes do Brasil. Nessa ocasião, a medida foi duramente criticada pelas entidades médicas, que alegam que o curso de medicina em Cuba tem carga horária inferior à do Brasil, o que o tornaria semelhante a um curso técnico.
Na última quarta-feira, o governo anunciou um acordo com a Organização Pan-Americana da Saúde (Opas), que prevê a intermediação de convênios internacionais. O primeiro, assinado com Cuba, trará 4 mil médicos cubanos até o fim de 2013 para as regiões que não tiveram as vagas preenchidas por inscrições individuais no Mais Médicos.
As críticas quanto à vinda dos cubanos, por parte das entidades médicas, foram ainda mais contundentes. Um ponto que gera questionamentos é o fato de a bolsa de R$ 10 mil paga aos profissionais ser repassada ao governo da ilha, com a intermediação da Opas, para posterior pagamento aos médicos - o que, segundo as entidades, poderia levar os profissionais a receber valores abaixo do que é permitido pela lei brasileira. O secretário adjunto de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde do Ministério da Saúde, Fernando Menezes, disse, no entanto, que esses profissionais receberiam entre R$ 2,5 mil e R$ 4 mil.
Quando perguntado se seria correto um médico cubano ter a mesma carga horária de trabalho dos demais médicos, mas ganhar menos, Padilha disse que "essas situações acontecem em todo o mundo, nas mais de 50 parcerias que o Ministério da Saúde de Cuba faz no mundo inteiro". O ministro ressaltou a credibilidade da Opas e disse que as regras do acordo são respeitadas em todos os acordos feitos com o governo cubano.
Os 1.618 profissionais inscritos individualmente na primeira etapa do Mais Médicos vão atuar em 579 postos da rede pública, em cidades do interior do país e periferias de grandes centros. Desse total, 1.096 médicos têm diploma brasileiro e começam a trabalhar no dia 2 de setembro. Os de diploma estrangeiro começam a atuar no dia 16 de setembro.
ENTENDA O 'MAIS MÉDICOS'
- Profissionais receberão bolsa de R$ 10 mil, mais ajuda de custo, e farão especialização em atenção básica durante os três anos do programa.
- As vagas serão oferecidas prioritariamente a médicos brasileiros, interessados em atuar nas regiões onde faltam profissionais.
- No caso do não preenchimento de todas as vagas, o Brasil aceitará candidaturas de estrangeiros. Eles não precisarão passar pela prova de revalidação do diploma
- O médico estrangeiro que vier ao Brasil deverá atuar na região indicada previamente pelo governo federal, seguindo a demanda dos municípios.
- Criação de 11,5 mil novas vagas de medicina em universidades federais e 12 mil de residência em todo o País, além da inclusão de um ciclo na residência em que os profissionais atuarão no Sistema Único de Saúde (SUS).
23 de agosto - Em São Paulo, sete médicos formados no exterior desembarcaram no aeroporto de Guarulhos nesta sexta-feira. Até domingo, está prevista a chegada de 244 profissionais a diversas capitais do País. A partir de segunda-feira, eles começam a passar por um curso de atualização, de três semanas, para depois serem encaminhados às cidades onde vão trabalhar
Foto: Bruno Santos / Terra
23 de agosto - De acordo com a médica argentina Natalia Allocco, 26 anos, o programa antecipou um "sonho" que tinha de viver no Brasil. Filha de mãe brasileira, ela diz conhecer o País, para o qual já veio em diversas ocasiões. Trabalhar em regiões carentes não a assusta
Foto: Bruno Santos / Terra
23 de agosto - Cristian Cheles Uzuelli, 32 anos, é outro brasileiro formado na Argentina, onde viveu por 8 anos. "Sempre que trabalhamos em um lugar fora, há alguma hostilidade no início. Foi assim comigo na Europa. Vir trabalhar aqui foi uma questão de opção. Trabalhei na região de La Plata, onde considero que as questões de pobreza sejam ainda maiores do as que vou enfrentar aqui", disse
Foto: Bruno Santos / Terra
23 de agosto - De acordo com Jarbas Barbosa, secretário de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde, São Paulo ficará com 102 médicos dos 1.340 profissionais que serão destinados para 516 municípios do País
Foto: Bruno Santos / Terra
23 de agosto - Thiago da Silva, 32 anos, é brasileiro e retorna da Argentina após 12 anos. Médico pediatra, ele disse que o valor da bolsa foi o que menos pesou para trabalhar no Brasil. "Quero oferecer boa medicina aqui", disse ele, filho de pai mineiro e mãe paulista
Foto: Bruno Santos / Terra
23 de agosto - Na capital federal, o ministro da Saúde, Alexandre Padilha, recebeu os profissionais da saúde
Foto: Valter Campanato / Agência Brasil
23 de agosto - A médica espanhola Sonia Nunes chega a Brasília
Foto: Valter Campanato / Agência Brasil
23 de agosto - Médicos formados no exterior são recebidos diretor do programa da Secretaria de Gestão do Trabalho e Educação na Saúde, Felipe Proenço, vinculado ao Ministério da Saúde, em Porto Alegre
Foto: Daniel Favero / Terra
23 de agosto - No Rio de Janeiro, médicos formados no exterior chegaram com críticas aos profissionais brasileiros
Foto: Marcus Vinícius Pinto / Terra
23 de agosto - Médicos formados no exterior chegam em Belo Horizonte
Foto: Ney Rubens / Especial
24 de agosto - Primeiros médicos enviados pelo governo de Cuba desembarcam no Recife. Trinta formados na ilha caribenha desembarcaram no Recife e outros 176 seguiram para Brasília
Foto: Luiz Fabiano / Futura Press
24 de agosto - Médicos de Cuba chegam a Brasília
Foto: Futura Press
25 de agosto - Em Fortaleza, formados na ilha caribenha são recebidos com manifestação no aeroporto
Foto: Futura Press
25 de agosto - Salvador foi uma das cidade que recebeu os médicos de Cuba no domingo. No final de semana, foram 400 formados na ilha. Até o final do ano, o total deve chegar a 4 mil