Como vai funcionar a lei que proíbe professores de ensinarem Holocausto sob perspectiva negacionista
Lei sancionada no fim de outubro vale para o Sistema de Educação Básica do Estado de São Paulo
No fim de outubro, o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), sancionou a Lei nº 17.817/2023 que proíbe o ensino ou abordagem disciplinar do Holocausto a partir de perspectivas negacionistas ou revisionistas. A nova norma é válida para o Sistema de Educação Básica do Estado.
De acordo com a Lei, o ensino do Holocausto, dentro do currículo educacional, deverá ter por objetivo informar e refletir com os alunos os seguintes pontos:
os crimes de lesa-humanidade perpetrados pelo Estado Alemão Nazista durante a Segunda Guerra Mundial contra os judeus e outros grupos também discriminados;
as razões geopolíticas e sociais que conduziram a este quadro; e
as ações de resistência a esse regime.
Ainda conforme o texto, o "ensino deverá munir os alunos com as ferramentas necessárias para a identificação de discursos de ódio na vida contemporânea, de modo a estarem mais preparados para exercer responsavelmente sua cidadania".
Mas como funciona isso na prática?
O Holocausto é o genocídio ou assassinato em massa e crime de lesa-humanidade contra o povo judeu durante a Segunda Guerra Mundial (1939 - 1945), patrocinado pelo Estado Alemão Nazista, sob o comando de Adolf Hitler e do Partido Nacional-Socialista dos Trabalhadores Alemães. Durante o período, a estimativa é que cerca de 6 milhões de judeus morreram.
Com essa Lei que proíbe o ensino ou abordagem disciplinar do Holocausto sob os prismas do negacionismo ou revisionismo histórico, os professores, quando lecionarem sobre o assunto, não poderão relativizar o acontecimento ou fazer apologia ao nazismo.
"O Holocausto tem dimensão única, a ele não cabe diferentes interpretações dos fatos ocorridos", justificaram o deputado Gilmaci Santos (Republicamos) e o ex-deputado Heni Ozi Cukier ao apresentarem o projeto de lei.
Para a historiadora e professora da Universidade de São Paulo (USP) Maria Luiza Tucci Carneiro, que também é coordenadora do Arquivo Virtual sobre Holocausto e Antissemitismo (Arqshoah), essa lei é importante porque, além de alertar para o perigo do racismo enquanto uma manifestação coletiva e individual, o Estado se posiciona contra o negacionismo e revisionismo.
"Essa lei é um estímulo para os estudos sobre diferentes formas de racismo e respeito aos direitos humanos. Com ela, vamos ter uma forma direta de combate ao racismo e também de transformar a escola em um espaço de integração e de aprendizado", destaca.
Como trabalhar em sala de aula
Segundo a historiadora, nas escolas é fundamental que os professores trabalhem a história do Holocausto enquanto genocídio singular; informem sobre arquivos e fotografias que estão disponíveis e mostram como esse crime realmente aconteceu; conscientizem os alunos dos perigos de vídeos que trazem informações deturpadas sobre o assunto; e abordem os riscos do negacionismo.
"Na sala de aula, o educador pode usar o cinema, o teatro, as fotografias, pode fazer projetos coletivos, ou seja, que envolvam professores de várias disciplinas, para educar contra a intolerância, contra o negacionismo, por exemplo", sugere Maria Luiza.
A historiadora também reforça a importância do Estado oferecer materiais de apoio sobre o tema para os educadores. "Não adianta ter a legislação se nós não tivermos políticas públicas de memória. Memória do Holocausto, memória dos testemunhos e levar para as salas de aula."
"A lei está aí, agora nós temos que informar e formar novas gerações para que, futuramente, os alunos de hoje, estejam aptos para o diálogo, aptos para investir contra o negacionismo. Mas não só eles, os professores também", acrescenta.
Questionada sobre como os professores devem abordar o assunto em sala de aula e se receberão materiais com orientações, a Secretaria de Educação do Estado de São Paulo (Seduc-SP) disse, por meio de nota enviada ao Terra, que "reconhece a importância fundamental da escola na construção da cidadania e segue a Lei nº 17.817/2023, priorizando o combate a diversas formas de discriminação, com ênfase na preservação dos Direitos Humanos na contemporaneidade".
"Essa abordagem já está incorporada nos temas transversais do Currículo Paulista, tanto nos Anos Finais quanto no Ensino Médio, com enfoque no diálogo cultural e o respeito às crenças. Paralelamente a isso, a Seduc-SP desenvolve no Programa Sala de Leitura, em parceria com a StandWithUs Brasil, um projeto piloto especificamente para combater o antissemitismo, desenvolver um ambiente acolhedor e promover uma política de paz e união, desconstruindo assim discursos ou manifestações de ódio que possam impactar a comunidade escolar", informou.
Segundo a Seduc-SP, o objetivo é estender esse projeto a todas as escolas públicas do Estado de São Paulo, alinhando com o Currículo Paulista, matriz curricular adotada em toda a Rede Estadual.