Estudante com redação nota 1.000 no Enem dá dicas: 'Tem que saber argumentar'; leia a prova
Maria Fernanda Simionato de Lemes, que vai cursar Medicina, diz que a prática é o que mais contribuiu para o resultado: 'O mais importante é fazer'
Nesta semana, o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) liberou para candidatos do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) 2022 os "espelhos" da redação - versões digitalizadas dos textos que eles entregaram no dia da prova. A consulta pode ser feita por meio da Página do Participante. Para conferir a avaliação, é preciso fazer login com o CPF e a senha cadastrados no sistema.
O espelho ficou conhecido como "vista pedagógica", pois permite que os estudantes possam compreender os critérios de correção do texto e identificar onde podem melhorar e quais estratégias foram acertadas. A redação do Enem vale 1.000 pontos. Maria Fernanda Simionato de Lemes, de 21 anos, foi uma das alunas que alcançaram a nota máxima. Natural de Maravilha (SC), a jovem passou no curso de Medicina da Universidade Federal de Pelotas (UFPel), usando a nota do Enem.
A estudante sempre quis cursar Medicina em uma universidade pública. Desde 2018 ela estava em busca desse objetivo, quando concluiu o ensino médio. "Mesmo tendo aprendido bastante na escola sobre redação, meu texto ainda era muito bagunçado. Eu tinha dificuldade para organizar as ideias e argumentar", afirma. "Não adianta saber escrever, tem que saber argumentar." Na primeira vez em que fez a prova do Enem, Maria tirou 520 pontos.
Com o passar dos anos e a ajuda das aulas do cursinho, que fez em Porto Alegre (RS), ela foi ganhando experiência e maturidade. Para a jovem, o que mais contribuiu para o sucesso foi a prática. "O mais importante é fazer redação. Assim, você vai encontrar suas falhas e ver onde precisa melhorar", afirma. Ela treinava redação semanalmente, para além das aulas teóricas.
Ter repertório, estar por dentro das atualidades e ler bastante também foram fatores fundamentais. A aluna da UFPel conta que sempre gostou de ler artigos de opinião e notícias. "Isso vai ajudar a construir a defesa e a formar a sua própria opinião. Quando a gente tem isso, somos capazes de escrever sobre qualquer coisa", diz O incentivo da família também foi importante, nesse sentido. Maria aprendeu a valorizar a leitura com os pais, que estimularam esse hábito desde a infância.
Ao escrever o texto, cujo tema foi "Desafios para a valorização de comunidades e povos tradicionais no Brasil", a estudante caprichou na argumentação e na estrutura do conteúdo, abordando tanto os obstáculos para o reconhecimento da importância de populações nativas brasileiras como fatores que podem contribuir para contornar esse problema.
Para a catarinense, a grande dificuldade foi seguir em frente após um resultado negativo. Ela tinha receio de acabar não passando no vestibular para medicina. Com muita motivação, ela seguiu tentando até que o sonho se tornou realidade. "Parecia algo impossível. Eu nunca imaginei que conseguiria passar e alcançar a nota máxima, fiquei muito surpresa. Depois disso, passei a valorizar mais o meu esforço e minhas conquistas. Se você realmente batalhar, vai conseguir e vai valer a pena."
A redação do Enem pode chegar a 1.000 pontos, sendo que cada uma das competências abaixo vale 200 pontos.
- Apresentar domínio da norma padrão da língua portuguesa;
- Compreender a proposta de redação e aplicar conceitos das várias áreas de conhecimento para desenvolver o tema, dentro dos limites estruturais do texto dissertativo-argumentativo em prosa;
- Selecionar, organizar, articular e interpretar informações, fatos, opiniões e argumentos em defesa de um ponto de vista;
- Demonstrar conhecimento dos mecanismos linguísticos necessários para a construção do texto dissertativo-argumentativo;
- Elaborar uma proposta de solução para os problemas abordados, respeitando os valores e considerando as diversidades socioculturais.
Leia a redação nota 1.000 de Maria Fernanda
Tema: "Desafios para a valorização de comunidades e povos tradicionais no Brasil"
Historicamente, a partir da implementação das missões jesuíticas no Brasil colonial, os povos nativos tiveram suas tradições suprimidas e seu conhecimento acerca das peculiaridades territoriais menosprezado. Na contemporaneidade, a importância dessas populações configura um fator indispensável à compreensão da diversidade étnica do nosso país. Contudo, ainda persistem desafios à valorização dessas comunidades, o que interfere na preservação de seus saberes. Logo, urgem medidas estatais que promovam melhorias nesse cenário.
Sob esse viés, é válido destacar a fundamentalidade dos povos tradicionais como detentores de uma pluralidade histórica e cultural, que proporciona a disseminação de uma vasta sabedoria na sociedade. Nesse sentido, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) afirma as heranças tradicionais desses grupos como constituintes do patrimônio imaterial brasileiro. Dessa forma, sabe-se que a contribuição desses indivíduos para a formação intelectual do corpo social engloba práticas de sustentabilidade, agricultura familiar e, inclusive, confere a eles uma participação efetiva na economia do país. Assim, evidencia-se a extrema relevância dessas comunidades para a manutenção de conhecimentos diferenciados, bem como para a evolução da coletividade.
Entretanto, a falta de representantes políticos eleitos para essa classe ocasiona a desvalorização das suas necessidades sociais, que não são atendidas pelos demais legisladores. Nesse contexto, a Constituição Federal assegura direitos inalienáveis a todos os cidadãos brasileiros, abordando o dever de inclusão dos povos tradicionais nas decisões públicas. Desse modo, compreende-se que a existência de obstáculos para o reconhecimento da importância de populações nativas se relaciona à ineficácia na incorporação de representantes que sejam, de fato, interessados na perpetuação de saberes e técnicas ancestrais propagados por esses grupos. Sendo assim, comprova-se a ocorrência de um grave problema no âmbito coletivo, o qual impede a garantia plena dos direitos básicos dessas pessoas.
Diante do exposto, denota-se a urgência de propostas governamentais que alterem esse quadro. Portanto, cabe ao Estado - cuja função principal é a proteção dos direitos de seus cidadãos - a implantação de mudanças no sistema eleitoral, por meio da criação de cotas rígidas para a eleição de políticos oriundos de localidades nativas. Tal reestruturação terá como finalidade a valorização de povos tradicionais, reconhecendo a sua fundamentalidade na composição histórica e cultural da sociedade brasileira.