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Escolas apostam em gincana para as crianças e pais mudam rotina durante a pandemia

Para manter a atenção dos alunos, modelo de educação precisou ser reinventado no ensino a distância

22 jun 2020 - 05h12
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No início do período de isolamento por causa do coronavírus, a professora Juliana Duarte, de 40 anos, chegou a pensar que as aulas remotas da filha Laura, de 8 anos, eram parte de uma situação temporária. Quase três meses depois e sem previsão de retorno das atividades escolares, ela já fez uma série de adaptações na rotina e em casa para que o processo seja produtivo sem desgastar a criança.

Para enfrentar o desafio de manter os pequenos envolvidos com as atividades, pais e escolas estão se reinventando e fortalecendo o diálogo e brincadeiras, como gincanas para encontrar objetos em casa e revirar os álbuns de fotos da família.

O desafio é maior para os alunos mais novos, dos ensinos infantil e fundamental 1, que nem sempre se adaptam às tarefas realizadas nas plataformas online. As escolas não abandonaram as aulas com conteúdos, mas estão apostando em atividades lúdicas e oferecendo atendimento individualizado não só para tirar dúvidas, mas para debater as dificuldades enfrentadas pelas famílias.

Uma das dificuldades iniciais enfrentadas por Juliana era manter a filha concentrada. "Agora acho que está mais tranquilo do que no começo. A adaptação foi mais difícil. Eu e meu marido estamos trabalhando e, no início, ela ficava na sala perto da gente. Mas não era bom, ela acabava se dispersando."

A solução encontrada pela família foi separar um espaço só para os estudos. "Ela está se concentrando mais desde que a colocamos em um lugar separado de tudo. Também trocamos o celular por um notebook. Assim, ela pode ver melhor os professores e os colegas. Ela está fazendo um aproveitamento melhor do espaço e da tecnologia. O professor de computação ensinou a usar os recursos, e ela está mais autônoma e adaptada."

Laura aprovou as mudanças. "Prefiro ficar no escritório, porque é mais confortável. E o celular era chato, porque tinha de ficar segurando."

Juliana conta que a escola também se adaptou para evitar que as atividades de casa fossem muito complicadas e sobrecarregassem os pais, que têm se dividido entre o home office e os cuidados com os filhos.

"As propostas mais complexas estão sendo feitas com as professoras. Eles têm o tempo de aula e 20 minutos de plantão de dúvidas. Também têm intervalo e podem ficar online para conversar com os coleguinhas. Para casa, a escola ensina brincadeiras, jogos, apresenta vídeos para vermos juntos. Sou da área, mas uma coisa é o papel de mãe e outra é o de professora. Para as crianças, a referência do professor é muito forte e a parceria da escola com a família é sempre muito importante."

Reconstrução

Orientadora educacional do ensino fundamental 1 da Stance Dual School, Patrícia Sampaio conta que a escola teve de ser reconstruída para que as crianças continuassem motivadas.

"Tivemos de fazer a seleção e reorganização de conteúdos. O tempo de aula não é mais o mesmo. Eram oito horas, mas as crianças não conseguem ficar esse tempo todo em frente à tela e também não queremos isso. A gente teve de se valer de ferramentas que pudessem promover uma interação mais ativa, de modo que os alunos pudessem gravar vídeos e voz. Também tivemos de considerar um tempo para falar sobre afeto e convivência, porque o contexto é diferente e desafiador, colocou todos em situação de isolamento, e as crianças foram afetadas emocionalmente. Não se pode pensar em uma escola que só fale de conteúdo."

Como se trata de uma faixa etária que faz muitas atividades com movimento, isso não foi deixado de lado. "Eles precisam ter tempo para brincar. Na educação física, estamos fazendo gincanas para as crianças procurarem objetos em casa, como uma colher de pau, por exemplo, fazer polichinelos. Tudo que elas possam fazer dentro de casa." A relação com o tempo também foi abordada em uma das vivências. "Eles fizeram um relógio com caixa de pizza. São atividades que mobilizam e despertam o desejo de aprender. E eles aprendem pelo afeto, pelo lúdico e pelo desafio."

As gincanas também são uma proposta do Colégio Equipe. "As crianças foram divididas em equipes e têm de achar a foto mais antiga, tirar foto com a cor da equipe, ajudar na casa. A linha da cobrança não é o melhor caminho. Este é um momento de entrar no diálogo e, se faltar algo do conteúdo, a gente repõe depois", explica a diretora escolar Luciana Fevorini.

As atividades têm sido realizadas em grupos pequenos e a escola fortaleceu a relação entre pais e professores. "Fomos vendo que era mais produtivo trabalhar com grupos menores e com encontros mais curtos. A gente estreitou muito os canais de comunicação com os pais. Agora, eles trocam e-mails com a professora, há conversas por videoconferência. Antes, a comunicação era por agenda ou presencial."

Roda de conversa

A pandemia e o vírus não são deixados de lado e foram abordados com uma psicanalista e uma pediatra, que são mães de alunos, em uma roda de conversa. "Foi uma conversa com alunos de 8 a 10 anos e surgiram perguntas muito interessantes. Eles queriam saber se existe vírus do bem, se o vírus é colorido."

Após o recesso das aulas em maio, o Colégio Santa Maria enviou kits de atividades para a casa dos alunos. "Preparamos um kit personalizado com materiais para ampliar as possibilidades em casa e também incentivá-los com literatura, arte e desafios corporais. Abrimos salas no Google Classroom com biblioteca e videoaulas para eles possam assistir e brincar quando for possível, respeitando a rotina das famílias", conta Karine Ramos, orientadora pedagógica da educação infantil da escola.

Karine diz que, na abordagem sobre a covid-19, a escola utiliza a transparência para falar sobre o tema. "Estamos atuando de forma verdadeira e esperançosa com enfoque nos cuidados que precisamos ter e a necessidade de cuidarmos uns dos outros ficando em casa para que possamos voltar o mais breve possível."

O professor de Educação Física Ricardo Borduchi Ferreira, de 44 anos, é pai de duas crianças, um menino de 5 e uma menina de 11 anos, e conta que o principal desafio foi adequar a rotina às atividades escolares, principalmente pela falta de familiarização com as ferramentas usadas no ambiente virtual.

"Para as crianças ficarem entretidas, eu e minha esposa temos de entrar no mundo delas. Brincamos, jogamos, fazemos aulas de Educação Física, musica e inglês. Tentamos tirar o peso do confinamento e a falta dos amiguinhos de sala e dos professores."

Mas Ferreira já sente que, apesar das dificuldades, é possível enxergar benefícios dessa experiência. "Podemos estar mais envolvidos e acompanhar, em uma parceria bacana, o desenvolvimento dos filhos. Adequar nossa rotina para podermos estar mais próximos deles também é uma lição que, aqui em casa, levaremos para os novos tempos pós-pandemia."

Estadão
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