Governo de SP anuncia mudanças na matriz curricular do ensino público; veja o que mudou
Menos itinerários e uma maior carga horária de matemática e português; especialistas avaliam novidades.
A Secretaria de Educação do Estado de São Paulo (Seduc-SP) anunciou na última semana mudanças nas matrizes curriculares do Ensino Médio e do Ensino Fundamental II, do 6º ao 9º ano, para o ano letivo de 2024.
A nova grade dos estudantes das escolas da rede estadual contará com mais aulas de matemática e língua portuguesa, menor quantidade na carga horária de algumas disciplinas, como artes e filosofia, e a extinção das matérias eletivas. No lugar, entrarão aulas de recuperação e preparatórias voltadas ao vestibular.
De acordo com a Seduc-SP, as mudanças simplificarão os itinerários formativos do Ensino Médio, que diminuem de 12 para três, considerando o Ensino Técnico, com a ampliação da carga horária das disciplinas de matemática, língua portuguesa, física, geografia e história. Além do Técnico, os outros dois itinerários formativos são: Matemática e Ciências da Natureza e Linguagens e Ciências Humanas e Sociais Aplicadas.
No ciclo básico, comum aos itinerários formativos, as aulas de língua portuguesa passam de 10 para 16 semanais, somando os três anos do Ensino Médio. Matemática passa de 10 para 17, além de ter maior quantidade de aulas de física, geografia e história. O aumento da carga horária só foi possível, no entanto, com a redução das aulas de artes, filosofia, sociologia e tecnologia/robótica.
Segundo o documento exposto aos supervisores das redes de ensino na última sexta-feira, 17, a carga horária de artes, filosofia e sociologia será maior para quem optar pelo itinerário de Linguagens e Ciências Humanas e Sociais Aplicadas. Nesse itinerário, os alunos terão aulas de arte e mídias digitais, liderança, oratória, filosofia e sociedade moderna e geopolítica.
Já os estudantes que optarem por Matemática e Ciências da Natureza, terão aulas de tecnologia e robótica, empreendedorismo, biotecnologia e química aplicada. No link, veja como fica a matriz curricular do Ensino Médio.
- Na 1ª série do Ensino Médio, os estudantes terão aulas de: língua portuguesa + redação e leitura, inglês, arte, educação física, matemática + educação financeira, biologia, física, química, filosofia, geografia, história, projeto de vida e tecnologia e robótica;
- Na 2ª série do Ensino Médio, os estudantes terão aulas de língua portuguesa + redação e leitura, inglês, educação física, matemática + educação financeira, biologia, física, química, geografia, história, sociologia e projeto de vida;
- Na 3ª série do Ensino Médio, os estudantes terão aulas de língua portuguesa + redação e leitura, inglês, educação física, matemática + educação financeira, física, geografia, história, projeto de vida e aceleração para o vestibular.
Para o Fundamental II, a mudança prevê a inclusão de duas aulas semanais de recuperação de língua portuguesa e matemática, do 6º ao 9º ano. Em escolas de tempo integral, são quatro aulas de recuperação nos 6º e 7º anos, e duas no 8º e 9º ano. Essas turmas também terão as matérias eletivas extintas e terão as disciplinas de Projeto de Vida e de Artes reduzidas pela metade, dando lugar à tecnologia e educação financeira. No link, confira como fica a matriz curricular do Ensino Fundamental II.
O que dizem os especialistas?
Ao Terra, especialistas da área da educação divergem sobre os prós e os contras, mas concordam em algo: é necessário ver como a mudança será aplicada na prática.
A diretora do Centro de Excelência e Inovação em Políticas Educacionais da FGV, Claudia Costin, avalia o aumento da carga horária de português e matemática como benéfica para o estudante. Pois, não indo bem nessas duas matérias, que são vistas como base, poderá ir igualmente mal nas outras.
“Se alguém, por exemplo, não lê com fluência e com capacidade de interpretação de textos, ela vai acabar indo mal em sociologia, filosofia, história, geografia. E, da mesma maneira, se não souber matemática, ele também irá mal em sociologia, física, química e biologia”, explicou.
“Infelizmente, os dados mais recentes divulgados pelo Saresp mostram que 96% dos jovens formados, quer dizer, que terminaram o Ensino Médio, não sabem resolver uma equação de primeiro grau”, apontou Claudia. “E vários deles, em proporção menor, não conseguem interpretar um texto literário com propriedade. Temos um problema sério”.
Ela comenta que em outros países, como Áustria, Suíça, França e entre outros, onde os sistemas educacionais são considerados bons, a carga em leitura e em matemática é bem maior. “Nós temos treze matérias obrigatórias espremidas em cinco horas de aula. Você acaba aprendendo um verniz de cada coisa”, diz.
“Essa medida vai de encontro do que está no projeto de lei que o governo mandou para o Legislativo, que é itinerários formativos mais associados ao que você tem que aprender na formação geral básica, fora ao que está ligado ao Ensino Técnico profissional”, explicou. “Mas, evidentemente, nós vamos ter que ver como é que eles vão implementar isso”.
A presidente do Conselho do Cenpec, Anna Helena Altenfelder, concorda que repensar o currículo atual é uma necessidade, porém, pontua que a atitude pode estar sendo equivocada, por diversos motivos. A começar pelo Novo Ensino Médio, projeto de lei que ainda está passando por adequações e aguarda aprovação, seguido pela falta de diálogo entre os professores, diretores e alunos.
“Observamos uma tendência da atual gestão estadual de educação em fazer mudanças, que, na verdade, acabam não tendo uma análise profunda das consequências e das condições necessárias e muitas vezes, acabam voltando para trás”, apontou Anna Helena relembrando o caso dos materiais digitais.
"Se já mudarmos a carga horária, impulsionarmos alguma coisa e depois a lei [do Novo Ensino Médio] ser aprovada, pode vir na direção contrária", explicou. "Me parece prematuro essa decisão. Sem esperar esse projeto de lei, que está em caráter de urgência, que existe toda uma discussão nacional a respeito disso e ainda tem o risco de, efetivamente, ter que fazer alguma mudança em função disso".
Anna Helena ressalta também que não é ruim dar maior espaço para matérias como língua portuguesa e matemática, mas que não é necessário diminuir as outras.
"Priorizar língua portuguesa e matemática é acertado, mas isso não pode significar deixar de lado ou até fazer uma carga bastante insuficiente para outras disciplinas. [...] A educação tem que estar ligada ao desenvolvimento integral do sujeito para que ele possa atuar como cidadão e se inserir no mercado de trabalho. E todas essas disciplinas [artes, filosofia e entre outros] são importantes para o desenvolvimento."