Script = https://s1.trrsf.com/update-1734630909/fe/zaz-ui-t360/_js/transition.min.js
PUBLICIDADE

A República Sindicalista

11 fev 2019 - 16h00
(atualizado às 16h01)
Compartilhar
Exibir comentários

Apesar de ter implementado uma política de nacionalismo econômico, basicamente estatizando e nacionalizando setores  até então estavam em mãos de empresas estrangeiras ( como a Vale do Rio Doce) e ter lançado os fundamentos da Petrobrás,  Eletrobrás e outras, Getulio Vargas (1930-1945, 1951-1954) esteve longe de ter o apoio unânime dos militares. 

Para simplificar as inclinações internas dos oficiais, principalmente os do Exército Brasileiro, surgiram duas tendências: 

Foto: Voltaire

a) a Nacionalista defensora da necessidade do controle estatal sobre setores considerados estratégicos (minerais, petróleo, infra-estrutura em geral, etc.), de acordo com o que ocorria então entre as nações devastadas pela Crise de 1929 (que abalou profundamente os setores privados da economia) e pelo sentimento de proximidade da guerra que se espalhou sobre o mundo na década de 1930. 

b) a Corporativa, nunca escondeu sua inconformidade e oposição à existência do Poder Sindical patrocinado por Vargas (criação do Ministério do Trabalho em 1931 e legalização ou aprovação dos sindicatos, amparados pelo Estado Brasileiro). Entendiam que a cadeira presidencial deveria estar sempre sob a égide dos que fundaram a república em 1889, isto é os generais do Exército. Não estavam dispostos a dividir o monopólio da ascendência sobre o executivo com nenhum outro poder. Muito menos com o dos trabalhadores sindicalizados. A expressão República Sindicalista jamais foi usada nem pelo Partido Trabalhista Brasileiro nem pelas vanguardas sindicais. Atribui-se a Carlos Lacerda o líder anticomunista a sua difusão senão que sua criação.

Deste modo, Vargas que precisava do apoio dos trabalhadores agrupados como base social de sustentação do seu poder, como um braço corporativo, conscientemente ou não, desgostou inúmeras lideranças fardadas. Muito oficiais viram nos grêmios operários um adversário civil a ser enfrentado, um rival a ser policiado. Por igual, temiam que as chefias trabalhistas, os “pelegos” como pejorativamente a imprensa os chamava, pudessem ser influenciadas por militantes comunistas infiltrados (o que de fato não tardou a ocorrer, sabendo-se que Carlos Marighela, foi um dos agentes do PCB na organização da “Greve dos 300 mil” em São Paulo, em 1953).  

Desde então, vamos assistir uma constante desavença entre os dois macro Poderes da República, o militar e o trabalhista, entre o quartel e a fábrica, entre a farda e o macacão de brim. 

A República Sindicalista argentina

Outro fator que fez os altos comandos das forças armadas brasileiras a se preocuparem deu-se com a ascensão sindical na vizinha Argentina. Apoiado maciçamente pela classe operária e pelo povo em geral, Juan Domingo Perón, um ex-coronel, por meio da Revolução Justicialista, implantou a partir de 1945 um acerto entre o Poder Militar e o Poder dos Sindicatos ao tempo que promovia reformas sociais favoráveis às massas. Nesta ocasião a CGT (Confederacíón General de Trabajo), praticamente ombreou-se com a caserna, ficando ele, Perón, promovido a general de exército, a ser o fiador e ponto de equilíbrio entre as duas corporações. 

A excepcional posição dos operários “cabecitas negras” alçados ao governo pelo peronismo frente aos ‘blancos” europeus formadores da elite portenha, foi mais um fator de desagrado. Para garantir as mudanças sociais, J.D. Perón acabou resvalando para a ditadura, o que o levou à violenta deposição pelas forças armadas em setembro 1955 ( praticamente um ano após o suicídio de Vargas, em 1954).  Acrescente-se que ao golpe do general Leonardi, dito “Revolución Libertadora”´, auto-proclamado presidente transitório, desencadeou uma intensa caçada aos sindicalistas da CGT,  fuzilados,  presos e muitos desterrados.

Perón discursa no balcão da Casa Rosada.
Perón discursa no balcão da Casa Rosada.
Foto: Voltaire

Na prática, a luta pela supressão do peronismo que demandou anos, colocou a sociedade argentina sob tutela das forças armadas. Ainda que houvesse o retorno do caudilho do exílio na Espanha, em 1973, a situação não se desanuviou. Todavia, o elemento perturbador de então não foram as lideranças sindicais ressurgidas pela esmagadora vitória eleitoral de Perón (60% dos votos). 

A guerrilha urbana

Desta feita foram as agremiações terroristas, partidárias intransigentes da luta armada, os Montoneros, de inclinação peronista, e o ERP ( Ejército revolucionário del pueblo) de inspiração marxista, que, seguindo os ditames da “política rebelde”,  mergulharam a nação no caos. Os jovens quadros do peronismo armado acreditavam que o líder retornado após 18 anos de solitário desterro deveria assumir a função de um guia revolucionário, como se fora um Che Guevara, ainda que tendo mais de 70 anos. Repudiados em discurso de Perón feito do balcão da Casa Rosada no 1º de maio de 1974, acusados de “imberbes”... e pior, senão que “também estes infiltrados que trabalham de dentro e que traidoramente são mais perigosos dos que trabalham de fora”.

Num ato suicida, Montoneros e ERP atacaram não somente os quadros da oficialidade como a burocracia sindical dominada pelos peronistas ortodoxos, realizando mais de mil ações terroristas, entre 1973-76. A resposta não tardou. No governo da sucessora de Perón, logo falecido, em julho de 1974, a vice-presidenta Izabel Perón, o principal mentor da guerra de extermínio contra a guerrilha urbana e seus “simpatizantes” foi o ministro do Bem-estar social, o ocultista e vidente Lopez Rega, braço direito do chefe morto. 

Para tanto, “el brujo”, organizou a “Triple A” (Alianza Anticomunista Argentina) que executou mais de 1.500 assassinatos cometidos por pistoleiros dos sindicatos, los matones, que formavam o esquadrão da morte. Por conseguinte, quando os militares liderados pelo general Rafael Videla (1976-1982) destituíram a viúva Isabelita do poder e assumiram a totalidade da luta anti-subversiva, o país conheceu um dos mais terríveis banhos de sangue da moderna história argentina (numa exposição aos empresários o general Viola confirmou que de 7 a 8 mil subversivos haviam sido mortos, mas que ainda existiam uns 1.200ª serem neutralizados).  A defesa mais clara da política de extermínio foi dita numa entrevista do general Ibérico Saint-Jean: “Primeiro mataremos a todos os subversivos, logo mataremos seu colaboradores, depois... seus simpatizantes, em seguida os que permanecem indiferentes e, finalmente mataremos os tímidos” (Maria Laura S.M. de Dromi – Argentina contemporânea: de Perón a Menen, pag. 909).

Síntese das intervenções militares na Argentina

 

Numa síntese da presença militar na história política argentina no século XX podemos indicar o seguinte: a) Restauração Conservadora (1930-1943) : conhecida por igual como a “Década Infame”, quando ocorreu o golpe do general Uriburu contra o presidente civil Yrigóyen, inaugurando a primeira fase do intervencionismo das forças armadas; b) Revolução de 1943, levou à deposição do presidente civil Ramón Castillo,  por influencia de um grupo militar (GOU) pró-fascista no qual Perón era um oficial em ascensão; c) Revolução Justicialista ( 1945-1955): Perón procurou manter um equilíbrio entre as duas corporações até ser golpeado pelas forças armadas); d) Revolução Libertadora (1955-1960): segunda fase do intervencionismo militar ainda que os presidentes civis tenham sido eleitos (o que não evitou que dois deles fossem apeados dos cargos); e) Revolução Argentina (1966-1973): golpe do general Ongania, dissolução das liberdades democráticas e proscrição dos partidos  postos na marginalidade.

f) Processo de Reorganização Nacional (1976-1983): o derradeiro intervencionismo, o mais terrível, liderado pelo general Videla e seus sucessores, provocando um banho de sangue inédito na história do país período encerrado com a derrota argentina na curta Guerra das Malvinas (1982), com o retorno dos civis ao poder.

Nota: numa entrevista Perón afirmou que o fato do presidente Yrigóyen não ter resistido à sua deposição liderada pelo general Uriburu, em 1930, serviu com um sinal, um facilitário, para que os militares dali em diante, sem nada a temer, se sentissem tentados para darem golpes.

Fonte: Especial para Terra
Compartilhar
Publicidade
Seu Terra












Publicidade