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Lincoln: Garibaldi e os ianques

10 jan 2013 - 14h39
(atualizado às 14h39)
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Sua Alteza, o presidente dos Estados Unidos ofereceu-me o comando do seu Exército e eu me sinto obrigado a aceitar essa missão em favor de um país do qual sou cidadão. (Garibaldi ao Rei Vitório Emanuel II, 1862)

Lincoln (1809-1865) foi presidente dos Estados Unidos de 1861 a 1865
Lincoln (1809-1865) foi presidente dos Estados Unidos de 1861 a 1865
Foto: Getty Images

Num dia quentíssimo do verão americano, o 16 de julho de 1861, as tropas do General Irvin McDowell desfilaram entre hurras e fanfarras pelas ruas de Washington, a capital da União. Marchavam rumo ao sul para dar uma surra nos rebeldes. O país estava em guerra civil desde abril quando os separatistas, os onze estados do sul escravocrata, em repúdio à eleição de Lincoln, organizaram-se em Estados Confederados. Até o território índio, onde os caciques tinham também escravos, aderira a eles. Determinados a mostrar resolução, os insurgentes atacaram o Forte Sumter na Carolina do Sul em 12 de abril, fazendo com que a guarnição federal se rendesse.

Um raio atingiu a América. Os primeiros tiros eletrizaram o continente. Os velhos ódios regionais, as imensas diferenças entre as duas partes que compunham a nação, O Norte livre e o Sul escravista (half free and half slave, como dissera Lincoln no famoso discurso da Casa Dividida) viram-se frente a frente com armas na mão. O poeta Walt Whitman, um assumido democrata, logo engajou-se: “beat! beat! drums! – blow! bugles! blow! ( Rufai, tambores, rufai! Tocai, clarins, tocai!). O Presidente Lincoln, em nome da defesa da União, convocou 65 mil homens em caráter de urgência, grande parte deles   voluntários arregimentados por 90 dias. A convicção era de que seria uma campanha fácil. Bastava uma coluna reforçada  ir a toque de caixa para Richmond, logo ali na Virgínia,  determinada a esmagar a  cabeça da serpente da secessão.

O General McDowell pôs-se a desconfiar dos seus recrutas quando viu boa parte deles assaltar os campos de amora pelo caminho. Como numa excursão de colegiais, saltavam aos gritos sobre as frutinhas. O pior era quando acampavam. Lotavam as cantinas onde se encharcavam com uísque ruim, em meio a cantorias sem fim. Era uma turbamulta que se arrastava na estrada. Mesmo assim o moral era alto. Os jovens ianques não queriam perder a batalha por nada deste mundo. A missão deles era chegar a Manassas, um entroncamento ferroviário que lhes permitiria alcançar logo o ninho da vilania. À frente deles estendia um sinuoso riacho, o Bull Run, “Corrida do Touro”. McDowell dependia da surpresa para destroçar os homens do General Pierre Beauregard, um descendente de franceses da Louisiana que se encontravam do outro lado.  Precisava para tanto fazer seus ianques caminharem à noite em silêncio absoluto. Inexperientes, a cada tropeção, ofendiam a quietude da escuridão com um sonoro palavrão e maldições ao divino. Ainda não nascera o sol em 21 de julho, quando a gente de McDowell abriu fogo com seus rifles Parrott.

Neste tempo, os confederados pediram reforços. Após uma confusa batalha, que se chamou de Primeira Manassas, ou Bull Run, o General Thomas Jackson, apelidado de Stonewall, o “muralha”, que se tornaria um dos mais célebres comandantes do Sul, desbaratou a ofensiva nortista: 2.950 jaquetas-azuis morreram nos campos da Virgínia. Foi um balde de água fria nos que apostavam tudo num golpe de mão.

Washington entrou em pânico, obrigando Lincoln a engolir o orgulho e tentar um contato com Giuseppe Garibaldi. O mais popular herói do Risorgimento italiano, um ano antes, fizera uma façanha extraordinária. Na campanha relâmpago da Sicília, iniciada em 5 de maio de 1860, comandando os seus Mille (os voluntários com camisas vermelhas que o seguiam como a um deus) levou à capitulação de Palermo e, em seguida, à de Nápoles, integrando-as à Itália unificada.  Um feito espantoso, visto que tinha contra si uns 20 mil soldados inimigos. Desmobilizado, Garibaldi, rejeitando o grau de general que o rei da Itália lhe oferecera, retirou-se para a ilha de Cabrera. Provavelmente foi lá que o emissário de Lincoln o alcançou, como agora prova o documento – “apenas um cartão postal, pequeno, meio deteriorado” - encontrado pelo historiador Arrigo Petacco em meio aos pertences dos Savóias, a família real italiana.

Não se sabe o que ocorreu depois, porque o único “Washington” que Garibaldi viu de perto foi esse nome pintado no barco que o levara ao seu refúgio.  Lincoln teve que aceitar conduzir os quatro anos da guerra com o mais lamentável quadro de generais da história americana. Um dos que mostrou decisão e bravura, apesar dos massacres horrorosos, foi U.S.Grant, a quem Lincoln nomeou comandante supremo em novembro de 1863. Dizem que quando soube que Grant bebia, ele quis saber “a marca do barril dele para assim dar aos meus outros generais”! Os demais pareciam bodes em luta tentando abater o inimigo a testaços. 

Fonte: Voltaire Schilling
Fonte: Especial para Terra
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