Revolução Chinesa de 1949
"Desprezar as ilusões, preparar-se para a luta". 14 de agosto de 1949. Mao Tsé-Tung
A Revolução Chinesa ou maoísta, que teve suas raízes na década de 1920, foi seguramente um dos maiores levantes de camponeses da história moderna. Desde que os comunistas se instalaram em Pequim, em 1º de outubro de 1949, a República Popular da China passou a preocupar o Ocidente ao tempo em que punha fim ao domínio colonialista originado desde os começos do século XIX e aprofundava a política da luta de classes.
Numa entrevista com o Marechal Montgomery alguns anos depois de ter tomado o poder, Mao Tsé-Tung lamentava o enorme desconhecimento dele e de seus seguidores sobre as dificuldades do seu país. De fato é fácil imaginar os obstáculos com que a nova equipe de dirigentes teve que se deparar ao partir para estabilizar e administrar uma nação que há quase quarenta anos vivia num caos permanente.
Desde a Revolução Republicana de 1911, a China encontrava-se politicamente esfacelada pelos infindáveis conflitos intestinos provocados pelos senhores da guerra e pela torturante presença da opressão colonialista. Agora, com a fundação da República Popular, os líderes lançavam-se num trabalho exaustiva: não bastava apenas reconstruir uma sociedade dilacerada pela longa guerra civil (1927-1949) e pela invasão japonesa (1936-1945), era necessário revolucioná-la.
A China inteira entrava em ebulição. Num primeiro momento as forças maoístas realizaram uma campanha de liquidação contra os elementos que haviam sustentado a ditadura do marechal Chiang Kai-shek: funcionários corruptos, administradores provinciais, etc ... além de atingir com todo rigor aquele rebotalho social, herança da velha sociedade chinesa, membros das sociedades secretas, bandidos, rufiões ... "inimigos do povo" de uma forma geral.
O peculiar neste gigantesco processo de depuração social é de que ele contou com uma ativa presença popular convocada a engajar-se no juízo e na condenação dos acusados. A época de maior intensidade do período de depuração foi a primavera de 1951 quando se calcula que apenas em Pequim aproximadamente trinta mil reuniões na forma de “tribunais populares” foram realizadas para tal fim, com a participação de mais de três milhões de pessoas. Tudo parecia como se um povo inteiro não apenas localizasse suas chagas como também as exorcizasse.
Tomou-se cautela, no entanto, em respeitar os compromissos assumidos de sustentar a Nova Democracia, isto é, a China não seguiria pela estrada da ditadura do proletariado mas o novo regime seria o resultado do acordo entre as quatro "classes revolucionárias": os operários, os camponeses, a pequena burguesia e a burguesia nacional. Mao Tsé-Tung estava disposto a seguir uma via "chinesa" para o socialismo, distinta daquela dos bolcheviques, onde a planta igualitária foi acionada quase nos instantes iniciais da tomada revolucionária do poder, em outubro de 1917.
Conciliação nacional
O reflexo econômico de tal compromisso político projetava-se numa coexistência de quatro setores: os empreendimentos do Estado, compreendidos pelos parques fabris nacionalizados, Bancos e outras grandes instituições comerciais; o capitalismo nacional, que ficou intocado e que abarcava as empresas que não tinham vínculos associativos com o capital estrangeiro; apequena produção artesanal urbana e rural e, finalmente, as cooperativas sob controle governamental.
Neste primeiro momento do processo revolucionário, três elementos sociais tinham sido destruídos: os latifundiários, que foram desapropriados pela reforma agrária; a burguesia compradora, cujos vínculos e sobrevivência se davam com o capital internacional; e a presença colonial estrangeira (ingleses,franceses, japoneses etc), que havia ocupado um lugar proeminente na sociedade chinesa desde os tempos da Guerra do Ópio (1839-1856) e que agora amargava uma humilhação impotente tendo que assistir à perda das suas propriedades e o fim das prerrogativas jurídicas (os direitos extraterritoriais), que as protegiam de fato das leis e costumes chineses.
Atacaram-se rigidamente os antigos costumes ancestrais que prendiam a mulher ao marido e a sogra, bem como dei-se início a campanhas de "remodelagem ideológica" voltadas especialmente para os intelectuais. O chamado "movimento pela forma do pensamento" foi um grande e laborioso processo de reciclagem ideológica que durou alguns meses. Tratava-se de uma espécie de psicoterapia de expiação onde o paciente deveria reconhecer seu passado de omissão e convivência com as classes dominantes e o seu distanciamento das reais necessidades do povo.
O passado do indivíduo, seu meio profissional e familiar, era exposto e reavivado. O objetivo era fazer com que rompesse com os laços psicológicos que o atavam à velha sociedade ancestral com seu culto ao imobilismo, à hierarquia social e ao sobrenatural. Esta prática expiatória dos “inimigos de classe” do regime foram retomadas com trágicas consequências durante a Revolução Cultural (1966-1976). Os projetos mais ousados do período da reconstrução tiveram que ser suspensos devido à dramaticidade dos acontecimentos externos.
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