Escolas se dividem entre manter atividades e reduzir alunos
Alguns colégios vão manter fluxo de até 35% dos estudantes e outros já têm planos de reduzir a frequência de turmas
O governo paulista vai permitir, pela primeira vez, que escolas fiquem abertas na fase vermelha, a mais restritiva do Plano São Paulo, programa de combate à pandemia. A ideia é seguir o modelo de países europeus, como Reino Unido e França, que mantiveram aulas presenciais mesmo em fases de lockdown. A orientação do governo é priorizar alunos mais vulneráveis, como aqueles com deficiência, problemas de aprendizagem ou saúde mental em risco. Diante disso, colégios particulares discutem se vão mudar o planejamento de atividades ou reduzir a frequência de estudantes.
O Bandeirantes, na zona sul, informou que não haverá nenhuma mudança e as aulas permanecem as mesmas seguindo os protocolos de segurança. A unidade disse ainda que segue "as orientações dos órgãos governamentais e mantém uma parceria com o Hospital Sírio-Libanês, responsável pelos protocolos de biossegurança e ambulatório". Outras unidades, como o Gracinha e o Magno, também na zona sul, o Luminova, na região oeste, e o Brasil Canadá, nas zonas sul e oeste, também disseram que vão manter o limite de 35% da capacidade de alunos, com atenção aos protocolos sanitários.
Ao apresentar as mudanças no Plano São Paulo nesta quarta-feira, 3, o secretário estadual da Educação, Rossieli Soares, sugeriu ainda a prioridade para crianças da educação infantil, de 4 e 5 anos, e para aquelas que estão nos primeiros anos do fundamental, em fase de alfabetização. Essa fase é considerada mais sensível para o afastamento da escola, diante da dificuldade de aulas remotas e do prejuízo socioemocional nessa faixa etária. Os colégios Agostiniano Mendel, na zona leste, e o São José, na sul, afirmaram que recebem até 35% dos alunos e vão continuar nesse patamar. A prioridade, segundo as duas escolas, continua sendo a educação infantil e a programação já combinada com a comunidade escolar está mantida.
Outros como Mary Ward, na zona leste, ainda não anunciaram mudanças, mas preveem reunião com a equipe pedagógica nesta quinta-feira, 4, para debater se mudam alguma coisa. Segundo Arthur Fonseca Filho, diretor da Associação Brasileira de Escolas Particulares (Abepar), as escolas estão reunidas para redefinir seus planos e devem cortar atividades secundárias, além de reforçar os cuidados com o cumprimento dos protocolos. Escolas com atividades em dois turnos, por exemplo, devem reduzir o atendimento.
No Colégio Uirapuru, em Sorocaba, dirigido por Fonseca Filho, todas as atividades presenciais do contraturno estarão suspensas a partir de segunda-feira, 8. A fase vermelha no Estado começa no sábado, 6, e vai até 19 de março. "É preciso ajustes em uma situação grave", afirmou ele. O Sindicato dos Estabelecimentos de Ensino no Estado de São Paulo (Sieeesp) vai orientar que as escolas suspendam o rodízio entre todos os estudantes que querem frequentar as aulas e passem a focar apenas naqueles que mais precisam de atendimento presencial. Na reabertura dos colégios, em fevereiro, houve alta adesão e parte das unidades conseguiu atender até 80% de seus alunos em modelo de revezamento.
"Agora, vamos priorizar a criança que realmente precisa, que o pai tem de trabalhar, que tem de deixar na escola", diz Benjamin Ribeiro, presidente do Sieeesp. Filhos das famílias que atuam em serviços essenciais, como a área de saúde, também devem ser priorizados, conforme a orientação do governo paulista. Ribeiro defende foco a alunos a até 9 anos de idade, que são os que têm mais dificuldades de aulas mediadas pela tecnologia. Já a maioria dos estudantes do ensino médio poderia, segundo ele, permanecer em casa em um primeiro momento. Para Ribeiro, é importante que as escolas sigam as orientações para evitar o fechamento em caso de lockdown.
Parte dos colégios consulta pais e muda previsão de aulas
Algumas unidades já traçaram os planos para reduzir o fluxo de turmas. O Colégio Augusto Laranja, na zona sul, vai diminuir o número de alunos que podem ir à escola e os horários das aulas. A escola trabalhava com porcentual de 50% e, agora, passará aos 35%, dando prioridade a estudantes mais novos. Parte dos alunos que entrava às 7h30 e saía ao meio-dia vai deixar a escola 40 minutos mais cedo. A redução de horário é para evitar encontros entre estudantes na saída da escola.
"Vamos viver duas semanas difíceis, mas precisamos superá-las como um desafio coletivo para voltar depois disso tudo e retomar essas atividades da maneira mais segura", explica o gestor Gustavo Laranja. Para definir quais estudantes poderão ir, a escola pretende avaliar a necessidade e também estima uma redução espontânea na demanda com o agravamento da pandemia. "Com esse cenário ainda mais preocupante, quem fez a indicação de mandar os filhos pode ter nova leitura dessa situação. A demanda deve diminuir na semana que vem."
O Colégio Cantareira, na zona norte paulistana, enviou comunicado aos pais para que se manifestem sobre "a real necessidade de virem para a escola neste momento crítico". As respostas vão orientar a reorganização das turmas. "Acreditamos que teremos um número de crianças que precisem vir para a escola porque alguns pais precisam mandá-los e esse número deve ser maior entre os os menores", diz Soraya Ferreira de Andrade, coordenadora do ensino fundamental 2 e médio do Cantareira. Ela estima redução de 10% de frequência. O Oswald de Andrade, na zona oeste, também deve fazer pesquisa com as famílias. A ida não será obrigatória e a decisão caberá aos pais.
As filhas da designer Camila Muffo, de 42 anos, fazem parte do grupo que não deve voltar à escola pelo menos nos próximos dias. As meninas, de 5 e 9 anos, retomaram as aulas presenciais depois que a família fez uma avaliação dos riscos. "Assumimos os riscos para priorizar os estudos", conta Camila. A decisão de suspender o retorno agora, diz, foi tomada "com dor no coração" para reduzir a circulação de pessoas pela cidade. Camila trabalha de home office e consegue manter as crianças em casa. A família deve analisar os índices de contaminação para reavaliar a decisão, recebida com choro pela mais nova.
Como Camila, outros pais de alunos que voltaram a frequentar a escola em fevereiro já recuam da decisão de permitir o retorno diante da piora da pandemia. É o caso de Christina Borten, de 44 anos, que incentivou o filho mais novo, de 13 anos, a voltar ao Colégio Equipe, na região central, em função da necessidade de socialização. "Mas a situação mudou muito. Tem cidades no Brasil que estão em fase preta, que eu nem sabia que existia."
Ela pesou o fato de que a ocupação de UTIs está alta e avaliou que, em prol da saúde coletiva, poderia manter o filho em casa. "A diferença da semana passada é que uma pessoa que agora precisa de algo no hospital tem menos chance de ser atendida." Segundo o Equipe, só nesta semana, três famílias optaram por esperar para enviar os filhos. O colégio já estuda interromper as atividades por alguns dias.
Outros pais pretendem continuar mandando os filhos para a escola. O empresário Paulo Miguel Pinheiro, de 55 anos, diz não ter a intenção de suspender as aulas presenciais dos filhos de 12 e 5 anos. "Além de achar que é benéfico, é uma necessidade primordial para nós", disse Pinheiro. Ele e a mulher trabalham fora e não teriam com quem deixar o mais novo caso a escola fechasse.
"Nós dois trabalhamos fora, muitas vezes até um pouco depois do horário por conta do trabalho. É fundamental para nós que a escola continue recebendo as crianças", afirma ele. Os filhos estudam no Colégio Magno, na zona sul. O mais novo tem aulas todo dia e a mais velha, aulas semanais. Pinheiro também vê benefícios ao emocional das crianças. "Ele é pequeno, convivendo com adultos. Nosso linguajar é de adulto, e nossa paciência também. Em casa, meu filho ficava saturado, muito tempo na internet, na TV. Na escola, fica o dia inteiro longe das mídias."
Secretaria estima queda de 80% na quantidade de estudantes
O secretário Rossieli Soares diz que cada unidade, em conversa com pais e professores, deve definir quais serão os alunos prioritários. Na rede estadual, ele prevê queda de 80% de circulação de pessoas da comunidade escolar ligadas à rede estadual. A previsão é reduzir a frequência de 2,5 milhões para 500 mil alunos nos próximos 14 dias. Já a circulação de professores e funcionários deve cair de 165 mil para 50 mil servidores.
Além das escolas, a lista de serviços essenciais da fase vermelha inclui supermercados, farmácias, serviços de segurança, construção civil, entre outros. Cerimônias religiosas também estarão liberadas para atividades presenciais.