Massacres são mais frequentes em escolas públicas, mas não em regiões vulneráveis, diz estudo
Relatório produzido pela Unicamp, Gepem e Unesp aponta que soluções para ataques vão além de reforço da segurança
O estudo Ataques de violência extrema em escolas no Brasil apontou que os massacres são mais frequentes em escolas públicas, que não estão localizadas em regiões vulneráveis. Nos últimos 21 anos, foram registrados 22 ataques cometidos por alunos e ex-alunos em 23 escolas --10 estaduais, 9 municipais e quatro particulares. O primeiro caso ocorreu na Bahia em 2002. Entre agosto de 2022 e março deste ano, nove casos ocorreram no País, além de quatro ataques em abril.
Doutora em educação, Telma Vinha, coordenadora do levantamento realizado pela Unicamp, Gepem e Unesp, destacou que "as escolas atacadas estão em patamar socioeconômico mais alto, e não nas periferias."
Ao todo, os atentados deixaram 35 vítimas fatais -- 24 estudantes (14 meninas e 10 meninos), quatro professoras, uma coordenadora, uma inspetora, além de cinco atiradores, que cometeram suicídio.
A disseminação de conteúdos violentos, que acontece, por exemplo, por plataformas como a True Crime Community, comunidade de crimes reais (TCC), pode estar diretamente relacionada com o aumento dessas ocorrências.
Sinais de alerta nos adolescentes
Segundo qualificação do relatório, os crimes são praticados por alunos e ex- alunos brancos, com idade entre 10 a 25 anos, isolados socialmente, ou seja, com apenas um ou dois amigos, além de vivências negativas na escola, gosto pela violência com transtornos mentais não diagnosticados ou tratados, culto às armas, e pertencentes a comunidades que ampliam o ressentimento e o ódio.
O levantamento aponta que os autores dos ataques colocam a escola como palco de sofrimento após relatos de exclusão, bullying e castigos.
O estudo coloca o corpo de profissionais da educação presentes na escola como parte crucial na gestão de crise. É necessário que toda rede esteja atenta ao ambiente escolar para certas condutas dos alunos, são elas:
- interesse incomum por assuntos violentos (tais como obsessão por armas de fogo ou massacres);
- comemorar ter acesso a armas;
- buscar ou interesse em vídeos, livros, blogs, etc nazistas, misóginos;
- afastamento progressivo e/ou repentino de amigos, da família e de atividades;
- muito tempo nas redes sociais;
- solidão crônica ou isolamento social;
- vítima de bullying;
- agressividade e uso de expressões pejorativas ao falar com mulheres e meninas, capacitismo, racismo, LGBTQIA+fobia;
- recusa de falar com professoras e gestoras mulheres;
- irritabilidade excessiva, falta de paciência ou ficar com raiva rapidamente;
- atitudes violentas (verbais ou físicas);
- expressar pensamentos persistentes de ferir a si mesmo ou a outra pessoa;
- fazer ameaças diretas a um lugar, outra pessoa ou a si mesmos;
- exaltar ataques em ambientes educacionais ou religiosos;
- expor diretamente uma ameaça como um plano.
Medidas de prevenção
Segundo especialistas, há formas de prevenção mais efetivas do que apenas reforçar o policiamento para aumentar a segurança nas escolas. Investir na contratação de psicólogos para planejamento de ações coletivas e encaminhando casos graves para atendimento externo são alguns dos caminhos apontados para inibir esse tipo de ação.
"A segurança é um paradigma. A ideia é mudar uma cultura de segurança para uma cultura de cuidado, que seja protetiva para a saúde mental", explica Telma Vinha.
Para Juliana Hampshire, mestre em Teoria Psicanalítica, a escola é um lugar com singularidades e as crianças precisam ser ouvidas e existir nesse ambiente. "Onde não existe espaço para a fala, para o reconhecimento de si e do outro, existe a violência porque qualquer diferença passa a ser entendida como ameaça a identidade. Então em tempos corridos, existe pouco espaço para a construção de histórias, de narrativas de si", comenta.
Outras soluções preventivas apontadas pelo estudo são:
• oferta de programas como oficinas artísticas, culturais e esportivas com adolescentes;
• aprovação de projetos de lei que fiscalizem e monitorem as plataformas de redes sociais;
• maior controle de aramar de fogo e munições, a proibição da criação e fechamento de academias e institutos mirins militares que ofertam cursos militares para crianças e adolescentes;
• constituição de observatórios de convivência e enfrentamento das desigualdades, participação do Brasil em fóruns globais de contra-extremismo/ terrorismo online;
• o registro obrigatório dos ataques ocorridos e dos casos desbaratados pela polícia - dados sobre o fenômeno, mapeamento, proposição de ações.
Atenção! Em caso de pensamentos suicidas, procure ajuda especializada como o CVV (Centro de Valorização da Vida), que funciona 24 horas por dia (inclusive aos feriados) pelo telefone 188, por e-mail, chat ou pessoalmente. Confira um posto de atendimento mais próximo de você (https://www.cvv.org.br/postos-de-atendimento/)