'Não adianta só dar mensalidade para o aluno'
Para especialista, é necessário pensar em bolsa permanência também para o ensino superior
Apesar dos diversos programas de incentivo nos últimos anos e dos avanços na educação básica (ensino infantil, fundamental e médio), ainda faltam financiamentos e políticas para o ensino superior, na avaliação de Rodrigo Capelato, diretor executivo do Semesp.
Ele destaca o programa Pé-de-Meia do governo federal, mas considera necessário investir também em uma bolsa permanência para quem entra na faculdade. "Não adianta só dar mensalidade, são vários os casos de mensalidades baratas em que o aluno não consegue se manter depois. Isso ocorre mesmo em faculdades públicas."
Segundo ele, além da questão de manutenção, há problemas no ensino médio que precisam ser tratados, desde a qualidade dos programas até a disponibilidade de informações sobre carreiras. "Há alguns anos houve um boom das engenharias, se falava muito da necessidade de engenheiros. Só que uma boa parte dos alunos não tinha perfil para isso, não tinha aptidão para essa área, acabou indo e se frustrando, desistindo."
O que pode, na prática, ser feito para reduzir evasões?
Além de financiar a entrada, é uma bolsa permanência. Não adianta só dar mensalidade. Ele não consegue pagar o transporte, a alimentação, o material e assim por diante, e isso ocorre mesmo em universidades públicas e gratuitas.
Como melhorar o processo de escolha de carreira, visto que contribui com a desistência em anos iniciais?
Então, eu daria dois caminhos importantes. Primeiro, trazer técnicas de orientação vocacional para os alunos do ensino médio, para que busquem melhor quais as áreas que eles têm mais aptidão, mais afinidades. E, ao mesmo tempo, trazer mais informações sobre as carreiras. Eles têm pouca informação e acabam escolhendo carreiras aleatórias, que depois entram e desistem. Isso é muito importante principalmente no ensino público. A gente vê que nas carreiras onde os alunos entram vocacionados - quando já fazem a escolha de muito tempo, por exemplo no caso da Medicina - a evasão é menor. O aluno quer muito aquilo. Em outras carreiras, vemos que entra sem ter uma orientação melhor, sem saber se tem vocação para aquilo, e acaba desistindo.
Há alguma questão envolvendo a formação do aluno que chega às faculdades?
O problema da qualidade da educação básica. Muitos alunos ingressam no ensino superior com muitas deficiências, no aprendizado de Matemática, das Exatas em geral, da Língua Portuguesa. Eles acabam não conseguindo acompanhar os cursos e desistem. Então é preciso pensar nisso, é mais a longo prazo, de como melhorar a qualidade do ensino médio. Enquanto isso, é necessário oferecer programas de nivelamento para aqueles alunos que tenham mais deficiências. As instituições privadas já oferecem em muitos casos, principalmente para Matemática e Português, mas a gente sabe que é insuficiente, precisamos de uma ação mais efetiva no ensino médio público.
Existe expectativa de aumento de alunos terminando o ensino médio, e com isso mais gente entrando nas faculdades?
A evasão no ensino médio é da ordem de 40%. Ou seja, a cada ciclo, quase que 1 milhão de alunos ficam pelo caminho. E a questão do Pé-de-Meia acredito que vai ajudar muito a diminuir essa realidade.
Há expectativa de que isso também estimule os cursos de tecnólogos?
Com o novo ensino médio, em que você tem os itinerários formativos, muito na linha dos técnicos, isso pode estimular que os alunos continuem, que não evadam. Os cursos tecnólogos são uma grande opção, que dá empregabilidade maior, inclusive em um tempo menor. Nós fizemos uma pesquisa com 2.400 estudantes agora no início do ano e a maioria não tinha resistência em relação aos tecnólogos, e uma boa parte, quase que o mesmo porcentual que queria bacharelado, disse que queria tecnólogo. Então, há uma probabilidade maior de crescer nos tecnólogos, o que seria muito saudável para o sistema. Nós precisamos de capital humano, de pessoas com nível superior. No Brasil existe muito pouco, só 20% dos jovens acessam o ensino superior, e a maioria vai para os bacharelados, o que causa ineficiência no sistema. Se olharmos nos EUA, na Alemanha, na Coreia do Sul, mais da metade das matrículas são em cursos do tipo dos tecnólogos, de duração mais rápida.