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Será que acordar cedo é realmente ruim para os estudantes?

Medida tomada nos Estados Unidos pode chegar ao Brasil? Especialista alerta para diferenças entre americanos e brasileiros

12 jun 2023 - 06h10
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Foto: Adobe Stock

Essa não é uma questão nova, porém ganhou destaque na imprensa de todo mundo graças ao projeto de lei HB 733 da Flórida, nos Estados Unidos. Ele estabelece que por lá as aulas escolares não devem começar antes das 8h da manhã, no ensino fundamental, e antes das 8h30, no ensino médio. A ideia é combater os efeitos da privação do sono que, de acordo com levantamento da Academia Americana de Pediatria, pode afetar o desempenho acadêmico dos alunos. Na Califórnia, também nos EUA, desde 2022, e pela mesma razão, as escolas públicas não podem começar as aulas antes das 8h30.

Aliás, os impactos que a privação do sono causam no campo cognitivo têm sido uma das vertentes mais investigadas por pesquisadores nos últimos tempos. O ciclo circadiano (ritmo que o organismo realiza as funções diárias) de crianças e jovens precisa de mais horas de sono e tem padrões diferentes dos de adultos, tendo como tendência natural dormir e acordar mais tarde.

Durante o ciclo circadiano, há um pico de cortisol pela manhã, tendo o período de maior grau de alerta por volta das 8h30 às 9h. Dessa forma, o aluno que acorda às 6 horas ou antes, para ter aulas às 7 horas, está realizando um movimento antinatural e que, ironicamente, não favorece a aprendizagem.

Os problemas trazidos pela falta de dormir bem

Dormir mal gera atrofia no hipocampo, área neurológica importante para a formação de memórias. É durante o sono, que o fluxo de LCR (Líquido Cefalo-Raquidiano) se intensifica e “lava” o sistema nervoso, a fim de limpar as toxinas e substâncias acumuladas diariamente.

O foco atencional é um elemento crucial na formação de memórias, pois permite que o cérebro se concentre em informações específicas e relevantes enquanto ignora outras distrações. Ao direcionar a atenção para um estímulo específico, o cérebro é capaz de processar e armazenar essa informação de maneira mais eficiente. 

Sem foco, a quantidade de informações que podem ser retidas e posteriormente recuperadas é significativamente reduzida. O foco é o principal indutor de neuroplasticidade e, portanto, é essencial para a formação de memórias de longo prazo.

Além disso, o grau de alerta influencia a capacidade de um indivíduo de absorver e reter informações. Quando alguém está alerta, sua capacidade de processar informações e formar memórias é maximizada. Por outro lado, um estado de fadiga ou sonolência pode prejudicar a capacidade do cérebro de focar e processar informações, dificultando a formação de memórias. 

Manter um grau de alerta adequado é crucial para garantir que o cérebro esteja funcionando de maneira ideal durante a aprendizagem, e por isso, situações que não são favoráveis a esses dois fatores, prejudicam o aprendizado.

Dessa forma, impor algo que não é “natural” da fisiologia desses jovens realmente afeta diretamente o seu desenvolvimento neuro-cognitivo, e por isso, vejo essa medida em específico, com bons olhos.

O que é melhor e o que pode realmente ser feito

Entretanto, temos que separar aquilo que percebemos como melhor, daquilo que é possível ser feito. Precisamos ver a realidade de cada país e entender os outros fatores que circundam esse tema. É comum nos Estados Unidos que as escolas sejam integrais, com isso, há mais tempo hábil para essa implementação, o que é diferente do modelo padrão de ensino brasileiro. 

Se as aulas começassem mais tarde por aqui, seria complicado manter o mesmo volume de matérias ministradas num menor tempo, o que implicaria numa reformulação do conteúdo programático.

Outro ponto importante a ser levado em consideração no Brasil é a incompatibilidade do horário de trabalho dos pais que iniciam a jornada de trabalho cedo. Deixar o jovem em casa sozinho, não é uma hipótese, então seria necessária uma alteração na jornada de trabalho dos responsáveis. Nos Estados Unidos é mais comum uma estrutura de transporte escolar sistematizada, que favorece essa logística.

Dessa forma, acredito que para haver esse tipo de mudança, todo o ecossistema escolar tem que ser repensado, e para o Brasil, isso impõe grandes mudanças. Como paliativo, os estudantes podem se atentar ao horário de ir dormir, buscando se deitar mais cedo já que essa mudança não é prevista, e assim, respeitar o mínimo de 7h30 de sono. 

Além disso, para melhorar a qualidade do sono, recomenda-se diminuir a exposição ao celular horas antes de dormir, evitar comidas muito pesadas e gordurosas no período da noite e praticar alguma atividade física.

(*) Lorenzo Tessari é COO da Gama Ensino, startup de tecnologia desenvolvedora de um algoritmo que identifica os gaps de aprendizado dos alunos para o direcionamento dos seus estudos.

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