Script = https://s1.trrsf.com/update-1734630909/fe/zaz-ui-t360/_js/transition.min.js
PUBLICIDADE

Universidade deve superar preconceitos, diz 1ª negra reitora de federal

Nilma Gomes entende a sua escolha para comandar a Unilab como mais um passo na luta pela igualdade racial no País

7 jun 2013 - 07h15
(atualizado às 07h28)
Compartilhar
Exibir comentários
Professora da UFMG, Nilma Gomes assumiu a reitoria da Unilab em abril deste ano
Professora da UFMG, Nilma Gomes assumiu a reitoria da Unilab em abril deste ano
Foto: Marcello Casal Jr. / Agência Brasil

Criada em 2010 com o propósito de promover a troca de conhecimentos sobre a língua portuguesa e as diferentes culturas, a Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (Unilab) entrou para a história em abril deste ano: foi a primeira instituição federal no Brasil a nomear como reitora uma mulher negra. Professora da Faculdade de Educação da UFMG e especialista em questões étnico-raciais, Nilma Gomes é defensora da ampliação de ações pela igualdade racial no País, em um período de consolidação do sistema de cotas nas universidades federais, apesar da falta de consenso sobre o tema. Até por isso, ela entende sua escolha para o posto como mais um grande passo nessa luta.

Cotas, uma nova discussão nas universidades

Pelos prédios da Unilab se escuta diferentes sotaques do mesmo idioma. Nos corredores, nas salas de aula, no refeitório e pela cidade de Redenção (CE), é possível ouvir um português que para os brasileiros soa engraçado: de Angola, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, São Tomé e Príncipe e Timor Leste. Isso acontece porque a universidade federal oferece 50% das suas vagas para os brasileiros e os outros 50% para estudantes vindos desses países.

Em entrevista ao Terra, Nilma destaca o papel da instituição em proporcionar um maior aprendizado sobre os países africanos de expressão portuguesa e sobre o Timor Leste. Apesar de os cursos não serem voltados especificamente para o tema, a diversidade cultural é apresentada em eventos da Unilab e em discussões em sala de aula, nas trocas de experiência entre os alunos. "São realidades que ainda não se fazem muito presentes no nosso cotidiano, e a universidade tem a possibilidade de ampliar esse conhecimento e superar preconceitos que, muitas vezes, são construídos pela ignorância com relação ao outro", disse.

A instituição pretende formar profissionais que possam atuar nas áreas de mais necessidade em suas terras natais. Por isso, os cursos de graduação oferecidos são agronomia, administração pública, bacharelado em humanidades, ciências da natureza e matemática, enfermagem, engenharia de energias e letras (língua portuguesa). E a primeira turma deve se formar em 2015. Confira a entrevista a seguir.

Terra - Qual é a proposta da Unilab que a torna tão diferente de outras instituições federais?

Nilma Gomes -

A Unilab já nasce como uma universidade internacional com o objetivo de fazer a integração entre o Brasil, os países africanos de língua portuguesa e o Timor Leste. Ela nasce com o objetivo acadêmico e político de realizar uma cooperação solidária na formação de estudantes desses países parceiros e de quadros acadêmicos e políticos para que eles possam retornar aos seus países e ajudar no seu desenvolvimento. Também temos a preocupação de estimular a formação de jovens na região do Maciço do Baturité, que é composta por 13 municípios, incluindo Redenção. Essa é uma região que ainda não tinha nenhuma universidade pública, e a Unilab vem para fazer um diferencial também nesse aspecto.

Terra - De que forma essa proposta busca ser cumprida nas aulas e nos eventos da Unilab?

Nilma -

Em primeiro lugar, ela é cumprida já pela própria existência da universidade. O fato de ter turmas com estudantes brasileiros e estrangeiros, convivendo academicamente e em diversos setores da universidade e debatendo com professores, já cumpre essa proposta. Outras formas são com programações de arte e cultura que a universidade promove nas quais se comemora, por exemplo, datas importantes desses países. Nelas, os estudantes fazem apresentações culturais, trazem conhecimentos históricos, sociais e culturais das suas regiões e países.

Terra - A população afrodescendente também é um foco da proposta da universidade?

Nilma -

Como a universidade tem esse espírito de uma cooperação do Brasil com os principais países de expressão portuguesa, em especial os africanos, a gente promove toda uma relação Brasil-África. Nós falamos dessa diversidade que é cultural, étnica e racial. Lembrando que a universidade é aberta para todo e qualquer estudante mas, nas diretrizes, há um reconhecimento e uma valorização dessas culturas afro-brasileiras. A dimensão das ações afirmativas e um reconhecimento da importância do continente africano fazem parte das orientações pedagógicas e acadêmicas da Unilab.

Terra - Você acredita que o Brasil ainda tem dificuldades de reconhecer a existência do preconceito racial e discuti-lo?

Nilma -

Acho que a discussão sobre o preconceito no Brasil já começou há muito tempo, mas o que nós temos vistos nos últimos 10 anos é a implantação de políticas de promoção da igualdade racial. Temos muito que avançar, mas já demos passos significativos. A universidade começou há pouco tempo do ponto de vista institucional. Há o desafio de fazer uma mudança curricular que englobe essas temáticas nas mais diversas áreas e uma discussão sobre os desafios de permanência desses estudantes nas instituições de ensino superior. Ainda há resistências, mas acho que aos poucos a presença desses estudantes irá aumentar.

Terra - Você é a primeira mulher negra a se tornar reitora de uma universidade federal no Brasil. O que você acha que isso representa em termos de mudanças no País?

Nilma -

Eu acho que essa indicação faz parte de um movimento de luta coletiva na sociedade pelo reconhecimento da diversidade étnica e racial, o reconhecimento da presença da população negra no Brasil. Ela faz parte de um momento de políticas de promoção da igualdade racial que começam a ganhar espaço no contexto político e acadêmico.

Terra - Quais são os desafios que a instituição vem enfrentando nesses primeiros anos de funcionamento?

Nilma -

Consolidar e dar continuidade ao trabalho já iniciado da gestão anterior, de incrementar o processo de internacionalização e ampliar a seleção de estudantes estrangeiros. É uma universidade jovem que ainda está em processo de consolidação. Mas eu encontrei um corpo docente e de técnicos administrativos muito comprometidos com a proposta e as diretrizes da Unilab. Isso é um diferencial das outras universidades de grande porte existentes no Brasil. Eu acho que há uma vida aqui na Unilab que pulsa e é muito significativo ver isso no dia a dia. 

Terra - Hoje a Unilab tem sua sede em Redenção, no Ceará, e está expandido suas atividades para São Francisco do Conde, na Bahia. Por que essas cidades foram escolhidas para abrigar a universidade?

Nilma -

Já temos sede em São Francisco do Conde, onde temos aulas a distância de bacharelado e especialização. Ano que vem pretendemos começar com as aulas presenciais. A escolha desses lugares se deve a dois motivos. Pelo processo de interiorização das universidades públicas federais para áreas onde o ensino público superior precisa chegar até a população. Outro aspecto é o da origem histórica. Redenção é a cidade onde se aboliu a escravidão antes mesmo da Lei Auréa. Então, ela é um lugar histórico, político e simbólico, e por isso se tornou um polo que poderia abrigar uma universidade com as características da Unilab. A Bahia também tem uma importância histórica e política nesse trânsito Brasil-África.

Cartola - Agência de Conteúdo - Especial para o Terra Cartola - Agência de Conteúdo - Especial para o Terra
Compartilhar
Publicidade
Seu Terra












Publicidade