A teoria de que o ouro veio do espaço parece coisa de ficção científica, mas a tese ganhou força com o tempo e hoje é bem aceita no terreno das geociências. Mas de onde essa bizarra hipótese surgiu?
Para os chefes tribais da América pré-colombiana, o material amarelo que eles encontraram brilhando no fundo dos rios ou enterrado sob o solo rochoso capturava o poder do Deus sol. Eles se vestiam com armaduras feitas a partir do metal encantado, acreditando que assim estariam protegidos.
Mas eles se enganaram. O ouro, um metal relativamente macio, não foi páreo para o ferro dos espanhóis. Ainda assim, os povos nativos das Américas teriam hoje razões de sobra para se orgulhar do que acreditavam.
A teoria de que o ouro veio do espaço ganhou aceitação nas últimas décadas pela maioria dos cientistas que buscava explicação para a abundância do metal no planeta. Atualmente, há apenas 1,3 gramas de ouro por 1 mil toneladas de outros materiais na crosta terrestre (a casca rochosa do planeta, que tem cerca de 40 quilômetros de espessura), mas essa proporção ainda é alta considerando os padrões de formação da Terra.
Há dezenas de milhões de anos, a maior parte do ferro encontrado na superfície do planeta afundou da camada externa, conhecida como manto, para o núcleo da Terra. Ali, o ouro teria se misturado ao ferro e afundado junto com ele. Matthias Willbold, geólogo da Imperial College de Londres, compara o processo a gotas de vinagre no fundo de um prato repleto de azeite de oliva.
Meteoritos
Mas a explicação não foi o suficiente para calar os mais céticos. Os cientistas precisavam de uma resposta para explicar a abundância do ouro. Eles chegaram, então, à hipótese de que o metal teria chegado ao planeta por meio de uma chuva de meteoritos.
"A teoria é de que, depois do núcleo formado, houve uma chuva de meteoritos que atingiu a Terra", diz Willbold. "Esses meteoritos continham uma quantidade de ouro considerável que preencheu o manto da Terra e a crosta continental."
A ideia de que o ouro veio do espaço surgiu pela primeira vez após as missões espaciais Apollo à Lua na década de 1970. Os cientistas que examinaram amostras de rocha do manto da Lua descobriram muito menos irídio (um tipo de metal) e ouro nessa camada do que em amostras da superfície da própria Lua ou da crosta ou manto da Terra.
A teoria estabelecia que a Lua e a Terra teriam sido atingidas por meteoritos ricos em irídio, conhecido como condritos. Na Lua, eles teriam se espalhado pela superfície, enquanto na Terra, teriam alcançado o manto.
Essa hipótese tornou-se uma teoria fundamental no estudo das ciências planetárias. E também ajuda a explicar muitas outras anomalias na composição da Terra – o conceito estaria por trás da chegada do carbono, nitrogênio, água e aminoácidos que são vitais para a vida no planeta.
Dois anos atrás, Willboald e uma equipe das universidades de Bristol e Oxford examinaram algumas rochas da Groenlândia que datavam do período em que o manto da Terra foi atingido por meteoritos.
O objetivo dos pesquisadores não era avaliar a concentração de ouro nas rochas de 4,4 bilhões de anos, mas a de tungstênio (um outro tipo de metal). Esse metal tem semelhanças com o ouro, mas existe em diferentes formas de isótopos, o que fornece aos cientistas maior informação histórica.
"Verificamos que a composição isotópica do tungstênio dessas rochas é bem diferente da de outras", afirmou Willbold.
Ele diz que as rochas da Groenlândia analisadas são remanescentes da composição da Terra anterior ao começo da chuva de meteoritos, que deve ter acontecido, segundo cientistas, entre 4,4 bilhões e 3,8 bilhões de anos atrás.
O estudo de Willbold, publicado na revista científica Nature em setembro de 2011, fornece a mais completa evidência até hoje sobre como surgiu a composição rochosa da Terra.
Contestação
A teoria, no entanto, não é unânime. No ano passado, Mathieu Touboul e uma equipe da Universidade de Maryland examinaram rochas diferentes, dessa vez vindas da Rússia. Rochas da Groenlândia também foram usadas no estudo, mas eram mais recente (de 2,8 bilhões de anos atrás) do que no experimento de Willbold.
Essas rochas se assemelhavam às analisadas por Willbold em termos de composição. Mas o que intrigou os cientistas é que elas eram posteriores ao período em que se estima ter havido a chuva de meteoritos.
"Chegamos a uma diferente conclusão sobre a geração de anomalias de tungstênio dentro das rochas", diz Touboul. Ele afirma que as diferenças no manto da Terra teriam forçado os isótopos de tungstênio a se desenvolver de diferentes maneiras.
Touboul, no entanto, ainda acredita que a hipótese inicial esteja correta, embora defenda que as medidas dos isótopos de tungstênio não comprovam a tese. Outros cientistas são mais duros e consideram que a teoria precisa ser rapidamente revisada.
"Eu aceitava a hipótese da chuva de meteoritos quando tínhamos poucos dados para uma interpretação mais consolidada", afirmou Munir Humayun, professor de geologia da Universidade do Estado da Flórida, nos Estados Unidos.
"A tese parecia tão bem construída, mas agora vejo que há muitas lacunas nela. Nós fizemos muitas previsões e sabíamos muito pouco do que aconteceu naquele período", acrescentou.
Humayun faz parte de um pequeno grupo de cientistas que apostam em uma teoria alternativa. A hipótese deles é de que todo o ouro na crosta da Terra – ou a maior parte dele – sempre esteve presente no planeta.
Para esses cientistas, o ouro teria se misturado com o ferro e migrado para o núcleo da Terra, enquanto uma proporção significativa – talvez 0,2% - acabou dissolvida em um "oceano" de magma a 700 km da superfície. Posteriormente, o metal teria emergido pela ação vulcânica.
Essa teoria pressupõe que o ouro e outros elementos da mesma família de metais seriam mais solúveis do que se imaginava inicialmente. De outra forma, quantidades insuficientes do metal teriam se dissolvido no magma. Mas por enquanto se trata apenas de uma nova hipótese, ainda não endossada pela maior parte dos cientistas.
Espaço em fevereiro: meteorito atinge a Terra e asteroide passa perto
Imagem de vídeo mostra o rastro da queda de um meteorito sobre a cidade de Chelyabinsk, na Rússia. Mais de 1.000 pessoas ficaram feridas em consequência de um meteoro que atravessou o céu e explodiu em fragmentos sobre a região central da Rússia no dia 15 de fevereiro, lançando bolas de fogo na direção da Terra, quebrando janelas e danificando prédios. Naquele mesmo dia, um asteroide passou à mais curta distância já registrada da Terra, porém sem causar danos
Foto: OOO Spetszakaz / Reuters
Pesquisador da Ural Federal University inspeciona fragmento de um meteoro que explodiu sobre os montes Urais, na Rússia. O meteoro, que espalhou bolas de fogo pelo céu, agora motiva uma corrida por fragmentos da rocha espacial, e os caçadores esperam ganhar milhares de dólares com cada pedaço
Foto: Stringer / Reuters
Polícia russa examina buraco de cerca de 8 metros onde, supostamente, o meteorito caiu
Foto: EFE
Carros passam ao lado dos destroços do muro que desabou após a passagem do meteorito
Foto: EFE
Meteorito caiu na Rússia deixando centenas de feridos
Foto: Oleg Kargopolov / AFP
Polícia russa examina buraco de cerca de 8 metros onde, supostamente, o meteorito caiu
Foto: EFE
Uma fábrica ficou parcialmente destruída na cidade russa de Chelyabinsk, após a queda de um meteorito na região
Foto: AFP
Operários trabalhavam para restabelecer a rede de energia, que foi danificada com a passagem do meteorito
Foto: AFP
Segundo a Academia de Ciências da Rússia, o objeto celeste pesava cerca de 10 toneladas
Foto: AFP
Pessoas observam o estrago feito pelo meteorito que caiu na Rússia na sexta-feira
Foto: EFE
A pressão provocada pelo contato do meteorito com a atmosfera da terra provocou inúmeros danos. Neste prédio de Chelyabinsk, as vidraças ficaram destruídas
Foto: AFP
Moradores caminhavam em frente a uma loja, que também foi danificada pela queda do meteorito
Foto: AFP
Trabalhadores russos selam janela que se quebrou após a passagem do meteorito
Foto: EFE
Nasa divulgou imagem de simulação da passagem do asteroide 2012 DA14, que passou raspando (por definição cosmológica) pela Terra, imiscuindo-se entre satélites comerciais e delineando cenário digno de filmes de Hollywood. Trata-se da primeira vez que um bólido desse tamanho em trajetória tão próxima do nosso planeta é previsto pelos radares.
Foto: NASA / Reuters
A Cordilheira dos Andes desaparece no horizonte sob uma fria névoa vinda do Oceano Pacífico. A vasta cadeia montanhosa na América do Sul foi fotografada no dia 4 de fevereiro pelo astronauta Chris Hadfield, que está a bordo da Estação Espacial Internacional (ISS, na sigla em inglês)
Foto: Chris Hadfield/Twitter / Reprodução
Chris Hadfield retratou a África no dia 2 de fevereiro: "fiquei sem fôlego". O astronauta que está a bordo da Estação Espacial Internacional desde dezembro de 2012, fotografa e compartilha quase diariamente imagens de diferentes locais do planeta em seu Twitter
Foto: Chris Hadfield/Twitter / Reprodução
Muitos astronautas afirmam que uma das coisas mais relaxantes para se fazer no espaço é olhar pela janela, observando o espaço e a Terra, de acordo com a Agência Espacial Canadense. Acima, a superfície da Terra - comparada a Marte pelo astronauta Chris Hadfield
Foto: Chris Hadfield/Nasa / Divulgação
O lago Baikal, no sul da Sibéria, Rússia, é o maior em volume de água do mundo e o mais profundo da Terra. "Ele guarda um quinto de toda a água doce do mundo", afirmou o astronauta Chris Hadfield em seu Twitter
Foto: Chris Hadfield/Twitter / Reprodução
O astronauta Thomas H. Marshburn fotografou a passagem do ciclone Haurna sobre Moçambique diretamente do espaço. O americano está vivendo a bordo da Estação Espacial Internacional (ISS, na sigla em inglês) e, junto com o colega Chris Hadfield, posta diariamente fotos da Terra e de atividades corriqueiras na estação
Foto: Thomas Marshburn/Twitter / Reprodução
Porto Alegre, a capital do Rio Grande do Sul, foi fotografada do espaço pelo astronauta Chris Hadfield, que está vivendo a bordo da Estação Espacial Internacional (ISS, na sigla em inglês). É a primeira vez que o canadense divulga uma imagem do Brasil em seu Twitter desde que chegou à ISS, em dezembro de 2012
Foto: Chris Hadfield/Twitter / Reprodução
Recentemente, Hadfield participou de uma conversa pela web a partir da EEI e descreveu como era o espaço visto além da atmosfera da Terra. "Parece um tapete de incontáveis luzes minúsculas e perfeitas em um veludo infinito, com a Via Láctea como uma área brilhante de textura mais pálida", escreveu. Acima, Malta e Gozo brilhando no Mar Mediterrâneo
Foto: Chris Hadfield/Nasa / Divulgação
As nuvens passam com rapidez, mas o astronauta Chris Hadfield conseguiu capturar um "rombo" no formato de coração exatamente em 14 de fevereiro, Dia de São Valentim - o Dia dos Namorados em muitos países
Foto: Chris Hadfield/Twitter / Reprodução
"É um pássaro, é um avião, é... um rio na América do Sul", brinca o astronauta em foto divulgada no dia 4 de fevereiro
Foto: Chris Hadfield/Twitter / Reprodução
O processo de compartilhamento é claro em muitos dos posts de Hadfield, pois ele fornece comentários criativos para suas imagens. "Dedos áridos de rocha bombardeada com areia parecem mal se segurar contra o vento quente saariano". Acima, o deserto do Saara
Foto: Chris Hadfield/Nasa / Divulgação
Esta conexão também permite que Hadfield faça suas próprias perguntas. "Vocês sabem tudo sobre o homem na Lua, mas e quanto ao homem na Patagônia?". Acima, uma foto da Patagônia
Foto: Chris Hadfield/Nasa / Divulgação
Hadfield afirmou que a Autrália parecia 'mais legal' e acrescentou que as cores e texturas do deserto são 'muito artísticas'. Esta imagem mostra o 'King George's Sound, na Austrália', escreveu o astronauta
Foto: Chris Hadfield/Nasa / Divulgação
As imagens geralmente são acompanhadas de detalhes do cotidiano do astronauta ou algum pensamento de Hadfield a respeito do que ele presencia. 'O lago verde australiano de alguma forma me lembra um haggis (prato tradicional da culinária escocesa)', afirmou
Foto: Chris Hadfield/Nasa / Divulgação
Comparação entre observações no infravermelho e no visível da Nebulosa da Lagosta (NGC 6357). Na nova imagem infravermelha (à direita), a poeira que obscurece muitas estrelas torna-se praticamente transparente, revelando um enorme quantidade de novas estrelas que seriam de outro modo invisíveis.
Bruxelas foi fotografa iluminada à noite, com suas rodovias e cidades vizinhas claramente distinguíveis
Foto: Chris Hadfield/Twitter / Reprodução
Parte da constelação do Escorpião centrada na NGC 6357 é composta nesta imagem. A maternidade estelar tem o aglomerado estelar Pismis 24 no seu centro
Foto: Davide De Martin (ESA/Hubble), the ESA/ESO/NASA Photoshop FITS Liberator & Digitized Sky Survey 2 / Divulgação
Telescópio do Observatório Europeu do Sul capturou em imagem infravermelha a maternidade estelar NGC 6357
Foto: ESO/VVV Survey/D. Minniti / Divulgação
O Observatório Europeu do Sul (ESO, na sigla em inglês) divulgou imagem das "asas" da nebulosa da Gaivota. Segundo a organização, o registro foi feito pelo telescópio MPG/ESO de 2,2 metros, que fica em La Silla, no Chile. A Gaivota fica entre as constelações do Cão Maior e do Unicórnio, no céu austral. O registro mostra apenas uma pequena parte da nebulosa, mas chama a atenção a grande quantidade de estrelas jovens formadas em seu interior.
Foto: ESO / Divulgação
O ciclone tropical Haruna, que levou destruição a Madagascar, foi fotografado do espaço no dia 23 de fevereiro
Foto: Chris Hadfield/Twitter / Reprodução
Há 215 milhões de anos, no período Triássico, um objeto com cerca de 5 quilômetros de diâmetro impactou a Terra e originou a Cratera de Manicouagan, a segunda maior do Canadá, com 100 quilômetros de diâmetro. Esta cratera de impacto formou o atual Lago Manicouagan, também conhecido como O olho de Quebec. Mesmo com a erosão, a Cratera de Manicouagan é uma das mais bem preservadas da Terra. Ela pode estar associada a um evento multi-impacto, que teria sido o responsável pela extinção de répteis no período Carniano
Foto: Chris Hadfield/Twitter / Reprodução
O astronauta Chris Hadfield desconhece o nome deste lago no México, mas o chama, carinhosamente, de "Lago do Jacaré Feliz"
Foto: Chris Hadfield/Twitter / Reprodução
O Himalaia, visto de cima contra o horizonte nesta imagem, traz uma sensação de "grandeza selvagem", de acordo com o astronauta canadense a bordo da ISS
Foto: Chris Hadfield/Twitter / Reprodução
Da órbita terrestre, é possível distinguir o aeroporto de Lima, no Peru, com nuvens vindas do Oceano Pacífico
Foto: Chris Hadfield/Twitter / Reprodução
A estrutura rochosa africana lembra um golfinho - ou alguma obra de Alfred Hitchcock -, de acordo com Hadfield
Foto: Chris Hadfield/Twitter / Reprodução
O vulcão Etna, o mais ativo da Europa, entrou em erupção na Itália, lançando fumaça por sobre as nuvens no final de fevereiro
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"Onde há água, há vida", filosofa o astronauta ao fotografar um rio serpenteando por áreas de irrigação na África do Sul
Foto: Chris Hadfield/Twitter / Reprodução
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