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Eleições 2024: A ascensão do centro-direita e a armadilha da agenda pulverizada da esquerda

Enquanto o centro-direita adotou uma abordagem pragmática, comprometida com o desenvolvimento econômico e a segurança pública, a esquerda ainda se concentra em narrativas que priorizavam a identidade e o reconhecimento de minorias.

30 out 2024 - 10h20
(atualizado às 18h01)
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As eleições de 2024 no Brasil foram um divisor de águas para o cenário político brasileiro e refletem uma insatisfação crescente com a política tradicional e indicam que o eleitorado brasileiro espera respostas pragmáticas e concretas para os problemas que enfrenta. Reflete as mudanças profundas na sociedade e nos rumos das forças políticas nacionais. Marcaram um cenário em que o centro-direita conquistou espaço em várias capitais e cidades importantes, enquanto a esquerda enfrentou um revés significativo.

A primeira questão que merece destaque é a abstenção, que atingiu níveis alarmantes em várias regiões do país. De acordo com os dados finais da votação do TSE, o segundo turno teve uma abstenção de 29,26%, praticamente um em cada três eleitores deixou de votar. No primeiro turno, o não comparecimento às urnas foi de 21,68%, os votos nulos e brancos, que refletem a insatisfação do eleitorado com as opções disponíveis, somaram quase 15% do total. Esses números indicam que quase metade da população deixou de escolher um candidato para o segundo turno, uma marca que denota um profundo descontentamento com a política brasileira e com as alternativas oferecidas.

Abstenção recorde é sintoma de descrença

Esse fenômeno de abstenção não é um evento isolado, mas sim o reflexo de um sentimento crescente de descrença, principalmente em relação ao cotidiano dos cidadãos em suas cidades. Muitos eleitores, especialmente os mais jovens e os pertencentes a classes economicamente desfavorecidas, afirmam sentir que seus interesses não estão sendo contemplados pelos políticos em disputa. Em meio a essa insatisfação, crescem as percepções de que as agendas políticas da esquerda têm perdido o foco nas necessidades reais da população, priorizando discursos que, na visão de muitos, são desconectados da realidade cotidiana.

Outro ponto central é a vitória do centro-direita, que se consolidou como a principal força nas eleições municipais. Muitos dos candidatos vitoriosos promoveram campanhas pautadas em promessas pragmáticas, com foco em segurança pública, economia local e serviços básicos, como saúde e educação. Em comparação, essas campanhas conquistaram o eleitorado ao se concentrar em questões palpáveis, próximas do dia a dia da maioria dos brasileiros.

Centro-direita capitalizou a desilusão com a política tradicional

Apoiado por uma estrutura de comunicação eficaz, o centro-direita soube capitalizar a desilusão com a política tradicional e oferecer um discurso que, embora conservador, demonstrava atenção às necessidades básicas da população. Com slogans que exaltavam o valor da ordem, da segurança e da eficiência na gestão pública, os candidatos de centro-direita conseguiram se conectar com um eleitorado que sente os efeitos da crise econômica e da precariedade dos serviços públicos.

Outro elemento significativo foi o desgaste da imagem de lideranças do PT, que enfrentaram crises de credibilidade e escândalos passados, afetando a percepção pública sobre a integridade e competência do grupo. A oposição usou essa situação para criar narrativas de instabilidade e falta de transparência, o que desencadeou um sentimento de desconfiança entre eleitores que antes simpatizavam com a esquerda. Em tempos de polarização política intensa, a mídia e as redes sociais amplificaram esses problemas, dificultando a recuperação de uma imagem positiva da esquerda.

'Bolhas informacionais' dificultam o diálogo da esquerda

Um aspecto fundamental dessa estratégia foi o uso das redes sociais e de plataformas digitais. Enquanto essas plataformas amplificam vozes e permitem um alcance maior, elas também reforçam "bolhas informacionais" onde as mensagens acabam direcionadas a um público específico, dificultando o diálogo com grupos mais amplos e diversos. Esse fenômeno gerou uma fragmentação no debate, onde o foco nas minorias tornou-se, para muitos eleitores, um sinal de que a esquerda estava desconectada das questões mais concretas e urgentes da população.

A comparação entre o discurso de centro-direita e o da esquerda nas eleições de 2024 destaca um contraste significativo entre os temas abordados. Enquanto o centro-direita adotou uma abordagem pragmática, comprometida com o desenvolvimento econômico e a segurança pública, a esquerda - principalmente o PT - ainda se concentra em narrativas que priorizavam a identidade e o reconhecimento de minorias. Essa divergência se reflete na escolha das políticas defendidas. O centro-direita, de forma estratégica, ofereceu propostas mais universalistas, voltadas para o desenvolvimento de infraestruturas locais, melhorias na saúde e segurança e incentivo ao empreendedorismo.

Para a população que enfrenta dificuldades econômicas, como a inflação nos alimentos, e a má qualidade ou inexistência de saúde, educação e saneamento básico, a luta por reconhecimento específico pode parecer desconexa de suas prioridades diárias. Essa percepção se intensifica em um cenário onde a crise econômica amplia as dificuldades de acesso a serviços básicos, problemas que afetam indiscriminadamente a maioria dos brasileiros, independentemente de raça, gênero ou orientação sexual.

Agenda da esquerda foi mais pulverizada

A ascensão do centro-direita (a união entre o centrão e a direita) evidenciou a força de uma agenda mais coesa e pragmática, que conseguiu mobilizar uma parcela significativa do eleitorado em meio a um cenário de instabilidade econômica e insegurança social. Em contraste, a esquerda enfrentou o desafio de uma agenda pulverizada, marcada por uma multiplicidade de temas que, embora importantes, careceram de uma integração que dê conta das urgências imediatas da população.

Essa fragmentação nas pautas contribuiu para uma percepção de desconexão, com eleitores percebendo que as prioridades econômicas, de emprego e segurança pública acabaram sendo ofuscadas por questões menos centrais para a maioria. Essa estratégia dispersa, ao invés de ampliar o alcance, deixou lacunas que o centro-direita ocupou de forma eficaz, reforçando sua imagem como uma alternativa capaz de oferecer estabilidade e respostas concretas para os desafios atuais.

Ao contrário do que se viu em campanhas anteriores, o centro-direita nas eleições de 2024 usou uma combinação de estratégias digitais e presenciais para se conectar com o eleitorado de forma eficaz. Em vez de priorizar apenas uma abordagem física ou digital, os candidatos de centro-direita buscaram diversificar os canais, participando ativamente das redes sociais enquanto organizavam eventos locais e encontros comunitários. Essa estratégia híbrida permitiu que os eleitores vissem os candidatos não apenas como figuras distantes, mas como representantes próximos e acessíveis, comprometidos com demandas reais da população.

Em comparação, a esquerda também usou as redes sociais, mas sua mensagem nem sempre encontrou a mesma ressonância entre eleitores das classes populares, que buscaram um discurso mais abrangente e próximo das suas necessidades cotidianas. Muitos eleitores sentiram que as prioridades apresentadas pela esquerda estavam desconectadas dos problemas imediatos da população, como segurança, saúde e emprego.

Esquerda precisa se reconectar com as demandas populares

Os resultados das eleições de 2024 trazem uma mensagem clara para a esquerda brasileira: a necessidade de se reconectar com as demandas populares e de construir um discurso que contemple as necessidades da totalidade da população. Isso implica equilibrar as pautas ideológicas com políticas públicas estruturantes que possam realmente combater as desigualdades históricas no Brasil.

Especialmente em grandes centros como São Paulo e Rio de Janeiro, a esquerda continua a destacar agendas que, para muitos eleitores, pareciam distantes das necessidades sociais e econômicas mais urgentes da população. Essa abordagem gerou uma percepção de uma "agenda elitista" em desconexão com as classes populares, que esperavam propostas mais voltadas para os desafios econômicos, educacionais e de saúde que afetam a maioria dos brasileiros. Assim, embora questões sociais importantes tenham sido tratadas, faltou uma integração clara com uma agenda mais ampla e prática, que contemplasse as políticas públicas, de forma abrangente.

Outro fator importante que impulsionou o sucesso do centro-direita foi a adoção de estratégias que demonstraram pragmatismo e eficiência na comunicação com o eleitorado. As campanhas de candidatos do centro-direita investiram em parcerias com lideranças comunitárias e em redes de apoio locais, criando um vínculo direto com o cidadão. Essas redes de apoio mostraram-se especialmente eficazes em regiões periféricas e de classe média baixa, onde a presença de serviços básicos é limitada, e os cidadãos anseiam por políticas públicas que realmente façam a diferença em suas vidas diárias.

Esquerda deve focar em políticas que promovam a igualdade

Diante dos resultados de 2024, o caminho para a recuperação da esquerda brasileira passa, inevitavelmente, pela reavaliação de sua estratégia e pela inclusão de políticas públicas estruturantes em sua agenda. Para reconquistar a confiança de uma parcela significativa do eleitorado, a esquerda precisa redirecionar seu foco para a construção de políticas universais que promovam a igualdade e o acesso aos direitos básicos. A contínua aposta da esquerda em políticas assistencialistas, populistas e focalizadas, trouxeram desafios claros para o futuro de suas estratégias eleitorais.

Isso significa, por exemplo, que o discurso sobre igualdade racial deve vir acompanhado de políticas públicas que ampliem o acesso à educação e ao emprego, beneficiando a população como um todo. Da mesma forma, a luta pelos direitos das mulheres e da população LGBTQIA+ deve ser inserida em uma agenda que considere o contexto econômico e social de todos os brasileiros e brasileiras. Integrar essas pautas em um projeto de desenvolvimento econômico sustentável e inclusivo é um passo essencial para reconstruir a conexão da política partidária com a sociedade.

Para o futuro, é fundamental que a esquerda, principalmente, compreenda o recado das urnas e reconstrua seu discurso e sua prática com base nas demandas universalizantes, que contemplem a totalidade da população. Isso não significa abandonar as questões das minorias, mas sim integrá-las em um projeto coletivo de transformação social que atenda aos anseios e necessidades da maioria da população. Ao recuperar essa conexão e equilibrar sua agenda com políticas públicas estruturantes e inclusivas, a esquerda poderá fortalecer sua posição e oferecer ao Brasil um projeto de nação que una, em vez de dividir, e que promova um futuro mais justo e igualitário para todos, portando, efetivamente democrático.

The Conversation
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Foto: The Conversation

Maria Alice Nunes Costa não presta consultoria, trabalha, possui ações ou recebe financiamento de qualquer empresa ou organização que poderia se beneficiar com a publicação deste artigo e não revelou nenhum vínculo relevante além de seu cargo acadêmico.

The Conversation Este artigo foi publicado no The Conversation Brasil e reproduzido aqui sob a licença Creative Commons
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