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Candidatos fogem de aglomerações, mas contato é inevitável

Nas duas últimas semanas, convenções partidárias e outros eventos indicam dificuldade de manter isolamento social

13 set 2020 - 23h16
(atualizado em 14/9/2020 às 07h40)
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É preciso medir a temperatura e higienizar as mãos com álcool gel para se ter acesso à convenção municipal do PSOL de São Paulo, realizada em uma quadra de futebol na comunidade Morro da Lua, no Campo Limpo, zona sul da cidade, no último dia 5. Lá, a equipe do candidato Guilherme Boulos favoreceu a circulação de ar: preparou uma tenda para a plateia com as laterais abertas e montou um palco a céu aberto onde os militantes discursaram um a um. As cadeiras foram distribuídas de maneira espaçada para acomodar um público que compareceu de máscara.

Até o final da convenção, no entanto, o distanciamento social - recomendado por epidemiologistas em época de pandemia do novo coronavírus - foi perdendo rigor e diversos apoiadores foram até Boulos para trocar abraços e tirar selfies coladas. "Sou sua fã", disse a Boulos uma simpatizante do MTST que deu um abraço apertado no candidato, logo depois de ele ter tirado foto com outras oito pessoas. Dona Olga, respeitada liderança comunitária do Morro da Lua, recebeu um beijo na testa por cima da máscara do candidato.

Esse tem sido o quadro observado pelo Estadão em atos de pré-campanha, convenções e outros eventos que reuniram os candidatos com seus apoiadores nas duas últimas semanas. Apesar da tentativa de aplicar as regras de isolamento social, o tradicional corpo a corpo é inevitável. Em geral, segue-se o mesmo rito: o cerimonial deixa um vão de um metro entre todas as cadeiras, mede a temperatura de quem chega e pede para que todos higienizem as mãos na entrada. No fim do encontro, no entanto, as cadeiras são movidas e os participantes terminam o ato em rodas próximas de conversa e selfies abraçadas. Muitos dos postulantes à Prefeitura admitem que sequer têm o interesse de evitar o contato físico com o eleitorado.

É o caso da deputada Joice Hasselmann, candidata do PSL, que têm ido à periferia e que esteve na cracolândia no feriado de 7 de setembro. Ela relata que "não tem como impedir" o contato com eleitores que pedem seflies. "Como eu vou dizer não? Não vou fazer isso", afirmou ao Estadão. Na última dessas saídas, uma moradora de rua se aproximou. "Ela estava sem máscara, mas chegou para conversar e contou a história dela, de como foi expulsa de onde morava. Começou a chorar e me abraçou. Como vou negar o mínimo de carinho?", indagou Joice. A imagem do abraço, publicada nas redes sociais, chegou a virar meme de opositores e críticos.

A parlamentar, no entanto, se justifica lembrando que já teve covid, se recuperou e não pode mais propagar a doença. "Se eu não tivesse imunizada, o distanciamento seria maior. Meu marido é médico e faço um controle rígido, com exames regulares", afirmou, referindo-se aos exames que detectam a presença de anticorpos no sangue.

A candidata à Prefeitura, Joice Hasselmann abraça moradores de rua durante caminhada em São Paulo
A candidata à Prefeitura, Joice Hasselmann abraça moradores de rua durante caminhada em São Paulo
Foto: Reprodução/Instagram / Estadão Conteúdo

O plano sanitário do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), anunciado na última semana, inclui orientações para eventos de campanha, mas elas têm caráter de recomendação e não de norma - apenas dois Tribunais Regionais Eleitorais, de Pernambuco e do Piauí, limitam número de pessoas em atos de campanha. A dica de "evitar o contato físico com eleitores" consta apenas nas orientações para o dia da votação e não para os eventos dos candidatos. Entre as campanhas, há o receio de que passar álcool gel com frequência dê a impressão de que se tem nojo dos aliados ou do eleitorado.

Abraços e beijos - mesmo com a máscara tapando a boca - têm rolado solto nos eventos de candidatos. O ex-governador Márcio França (PSB), que ainda não contraiu a doença, também não tem se furtado a dar apertos de mão em suas saídas. O anúncio de sua coligação com o Avante, realizado do lado de dentro do imóvel que abriga a sede do diretório paulista do partido, no Jardim Paulista, terminou com todos os presentes discursando em pé, lado a lado, dentro da mesma sala. Antes do tumulto gerado pela chegada do ex-governador, cadeiras haviam distribuídas de forma espaçada, mas não chegaram a ser utilizadas.

A convenção do socialista, que teve que seguir protocolos da Câmara Municipal que impedem a lotação do plenário, foi bem menos cheia que o evento de lançamento da candidatura dele ao governo, em 2018, que lotou o auditório com capacidade para mais de 900 pessoas do prédio da Força Sindical. Ainda assim, contou com momentos de aperto, especialmente de França e seus familiares.

"Mesmo a gente falando que pode fazer (a convenção) presencial, a verdade é que você perde o controle quando tem muita gente", disse França ao Estadão, sobre a necessidade de se fazer eventos pequenos. "E aí, imagine se você tivesse a notícia de que foi feita a convenção e, depois, 84 pessoas pegaram covid. Ficaria a sensação de que a gente é louco", afirmou.

Outro que já teve a covid-19, o prefeito Bruno Covas (PSDB), que disputará a reeleição, também não tem conseguido evitar o contato. O presidente do PSDB municipal, Fernando Alfredo, admite que não há como impedir nas agendas que os eleitores tirem foto e se aproximem do candidato. "Com os números da covid reduzindo, vai ter mais liberdade. Não dá para negar uma foto para o eleitor. Vamos evitar as grandes aglomerações. As agendas de campanha só serão divulgadas para a imprensa", disse. Ainda segundo Alfredo, a estratégia do PSDB é deixar as outras campanhas irem antes para a rua para ver a receptividade da população.

Filipe Sabará, do Novo, tem rodado a cidade em uma Kombi laranja e feito corpo a corpo com eleitores. "As pessoas da periferia não ficaram em casa, nem teriam como. Quem ficou em casa foi a classe média e alta", argumentou sobre o distanciamento social. Sabará teve covid em março e também está imunizado, mas afirma que sempre usa máscaras e não recusa um pedido de selfie.

Em contraste, o deputado federal Orlando Silva, candidato do PCdoB, disse que aboliu o corpo a corpo pelas ruas na campanha e tem realizado apenas pequenas reuniões presenciais domiciliares. A convenção do comunista contou apenas com poucos dirigentes e jornalistas, em evento transmitido aos demais. "A nossa decisão é não fazer caminhada. Defendemos que o isolamento social é uma mecanismo importante no combate ao covid. Aí vamos aglomerar?", indagou.

Com décadas de vida pública, o candidato do PSD, Andrea Matarazzo, pensa de maneira parecida. "Eu pessoalmente acho irresponsável fazer isso hoje em dia", afirmou, sobre a realização de atos de campanha que aglomeram pessoas. "Quando vou fazer campanha de rua, vou sozinho, sem equipe, a não ser que precise filmar algo. E sem ficar fazendo hora para aparecer", disse. Ele afirma que seus encontros com associações e entidades têm sido por videoconferência.

Devido à pandemia, Sabará realizou sua convenção em um drive-in, mesma opção adotada pelo deputado estadual Arthur do Val, conhecido como Mamãe Falei e candidato do Patriota. Terminado o ato político, nenhum dos dois se negou a tirar selfies com os simpatizantes e os candidatos a vereador nas chapas de seus partidos.

Durante a primeira metade da convenção do Patriota, os responsáveis pelo evento reiteraram diversas vezes a necessidade dos presentes permanecerem dentro do perímetro das vagas de seus carros. Duas das organizadoras inclusive deixaram de pegar cadeiras para se sentar em frente ao palco pois temiam que a atitude servisse de mau exemplo aos queriam sair do quadrado. "Não vamos trazer cadeiras, já foi difícil fazer o povo ficar no lugar. Se virem a gente assim, já era", lamentou uma.

Até o final do ato, no entanto, os candidatos a vereador foram anunciados no palco e depois fizeram rodas de conversa, apesar de estarem de máscara.

Estadão
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