Em São Caetano, auxiliares de prefeito postam imagem falsa segundo a qual candidatura foi autorizada
O candidato tem condenação em 2ª instância por captação de dinheiro ilícita na campanha de 2016 foi enquadrado na Lei da Ficha Limpa
Em São Caetano do Sul, no ABC Paulista, auxiliares e pessoas nomeadas diretamente pelo prefeito José Auricchio Júnior (PSDB), que disputa a reeleição e lidera as pesquisas, compartilham desde quinta-feira, dia 29, imagem falsa segundo a qual a candidatura do tucano foi autorizada pela Justiça Eleitoral. A imagem disseminada imita as cores e o formato do portal Divulgacand, o site de informações oficiais sobre eleições do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), mas traz a palavra "deferida", quando a situação real de Auricchio Júnior é de candidatura indeferida por ter sido enquadrado na lei da ficha limpa.
A imagem foi compartilhada por Charly Farid Cury, presidente da Fundação Pró-Memória, uma autarquia municipal, e pelo vereador Eclerson Pio Mielo, presidente da Câmara Municipal, além de servidores e auxiliares das secretarias municipais. Além disso, o secretário municipal de Cultura, João Manuel Costa Neto, publicou em seu perfil do Facebook a informação de que o Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo (TRE-SP) teria publicado decisão que daria a Auricchio o direito de participar da disputa, o que não aconteceu.
"Hoje a tarde tivemos mais uma excelente notícia, o TRE (Tribunal Regional Eleitoral) publicou decisão que garante o prefeito Auricchio candidato à reeleição", escreveu Costa Neto.
O prefeito obteve de fato uma vitória no Tribunal Regional Eleitoral, mas ela só o autoriza a permanecer no cargo, apesar de ter sido cassado em segunda instância pela mesma corte - coisa que, em situação normal, significaria a perda do mandato. O presidente do TRE-SP, desembargador Waldir Sebastião de Nuevo Campos Júnior, entendeu no dia 23 que não é conveniente realizar eleições suplementares e trocas de poder na prefeitura no contexto da pandemia da covid-19.
"No caso em tela, o V. (venerando) Acórdão referendou a cassação dos diplomas do prefeito e do vice-prefeito de São Caetano do Sul, eleitos no pleito de 2016", escreveu Nuevo Campos. "Todavia, o C. (colendo) Tribunal Superior Eleitoral, diante da situação de anormalidade provocada pela pandemia do novo coronavírus (COVID-19), a dificultar, senão mesmo impossibilitar, a realização de eleições suplementares, vem entendendo pela possibilidade de concessão de efeito suspensivo ao recurso especial, a fim de evitar indesejáveis alternâncias no poder e a consequente instabilidade política", acrescentou.
Na mesma decisão, o Nuevo Campos considerou que tanto um recurso de Auricchio sobre a cassação quanto um recurso da Procuradoria Regional Eleitoral são admissíveis - ou seja, passíveis de consideração - e os encaminhou para o Superior Tribunal de Justiça (STJ). O prefeito pede para ser absolvido enquanto a PRE quer aumentar a pena dele, de modo que o tucano seja obrigado a ressarcir R$ 350 mil aos cofres públicos. Fora do contexto de pandemia, as decisões de cassação são cumpridas em segunda instância, a partir da análise do TRE, antes que o TSE as julgue.
Auricchio foi condenado em segunda instância por captação de dinheiro ilícita na campanha de 2016. Com base nisso, ele foi enquadrado na Lei da Ficha Limpa e ficará inelegível por oito anos. Para que ele não conste na urna, é preciso que o TRE e que o TSE também deem sinal vermelho à candidatura - rito já cumprido na primeira instância pela juíza eleitoral Ana Lucia Fusaro, da 166ª Zona Eleitoral em São Caetano do Sul, seguindo recomendação do Ministério Público Eleitoral.
Se o TSE não decidir sobre a candidatura até o primeiro turno, em 15 de novembro, os votos dados a Auricchio serão anulados depois das eleições. Como São Caetano tem menos de 200 mil eleitores, o pleito terá apenas um turno. Caso Auricchio vença a disputa - que ele hoje lidera com 54% das intenções de votos válidos, de acordo com pesquisa Ibope divulgada no dia 23 - e seja depois considerado inelegível pelo TSE, a eleição inteira será anulada e terá de ser refeita. Até lá, o presidente da Câmara Municipal que assumir em janeiro será prefeito interino.
Segundo colocado nas pesquisas, Fabio Palacio (PSD), que tem 23% das intenções de voto, entrou com ação neste sábado, dia 31, para questionar a divulgação de imagens que sugerem que a candidatura do oponente foi deferida. "Poucas vezes vi uma conduta tão grave em uma campanha eleitoral. A alteração de informações oficiais da Justiça Eleitoral com a intenção de enganar o eleitorado é algo muito grave que merece a mais dura punição", afirmou ao Estadão o advogado Fernando Neisser, que trabalha na campanha de Palacio (PSD).
Procurada na tarde de sexta-feira, dia 30, a campanha de Auricchio não se pronunciou até a publicação desta reportagem.