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Identificação com classe C religiosa faz PT rever campanha

Especialistas apontam erros do PT em ter se utilizado, por exemplo, de artistas e intelectuais para buscar voto no primeiro turno

17 out 2022 - 07h06
(atualizado às 07h42)
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Lula (PT) vota em São Bernardo do Campo (SP)
Lula (PT) vota em São Bernardo do Campo (SP)
Foto: Reuters

Uma comunicação clara e focada no concreto, segundo analistas, torna-se um trunfo neste segundo turno para que as campanhas consigam falar à classe C. Além disso, a religião, identificada como algo relevante para esse grupo, também já tem aparecido como protagonista na disputa nas redes socais e deve continuar em evidência.

Especialistas apontaram erros do PT em ter se utilizado, por exemplo, de artistas e intelectuais para buscar voto para Lula no primeiro turno. Maurício de Almeida Prado, que faz pesquisas qualitativas com esse grupo na consultoria Plano CDE, diz que a classe C enxerga "um discurso de lacração, de esquerda arrogante progressista ou de um vitimismo, de grupos como os gays".

Ele cita o movimento nas redes sociais que estimulava eleitores do PT a fotografar 13 livros de cor vermelha. "Muitos pensam: nunca li nem 13 livros, quanto mais vermelhos", diz o antropólogo. O partido tirou os artistas e passou a veicular vídeos com pastores evangélicos logo nos primeiros dias da campanha do segundo turno.

O desafio da comunicação também aparece no discurso de não violência, contra as armas, diz Prado, já que a população se vê entre facções criminosas e tráfico. A evidência de que o aumento no número de armas leva a mais violência, demonstrada em pesquisas, é mais difícil de explicar do que o discurso de que a arma serve para a pessoa se defender.

A religião surge, de acordo com analistas, muito atrelada aos valores morais na classe C. "Uma parte da narrativa desses segmentos de direita é de natureza dos costumes, há uma recuperação de um sentimento conservador, colado na fé religiosa, que existe na sociedade e foi trazido para o centro do debate", diz o professor da USP José Álvaro Moisés. A polêmica em torno da visita de Jair Bolsonaro a Aparecida foi um dos temas que se destacaram nas redes sociais na semana passada.

Apesar de as últimas pesquisas mostrarem que 30% da população é evangélica, como o último Censo demográfico foi feito em 2010 (e deveria ter sido repetido em 2020) os números podem estar defasados. Outros 50% se declaram católicos.

'Fé'

"Como cristã, valorizo a família, a vida, sou contra o aborto, contra corrupção", diz Andreia Bassan, de 47 anos, que é evangélica. Ela e o marido têm uma microempresa de cursos online de artesanato. Seu voto é convicto em Bolsonaro. "Ele veio para mostrar as coisas que a gente não enxergava, fomos muito enganados pela política. Se ele não tivesse esse jeito de falar, o sistema já teria engolido ele."

Andreia mora na zona norte da capital e reclama de não poder trabalhar durante a pandemia e de ser obrigada a "entrar como bandida em seu escritório". O casal não se vacinou contra a covid por não acreditar no imunizante "feito às pressas". "Meu marido pegou covid no começo da pandemia, foi terrível, estávamos sem plano de saúde, mas sou uma mulher de fé."

A carioca Cleonice Vieira, professora de Inglês aposentada, de 59 anos, que é católica, diz que também se apega à fé, mas vota em Lula. "Se Bolsonaro fosse cristão, ele não deixaria as pessoas morrerem, não atrasaria a vacina", afirma. "A pobreza voltou, as pessoas estão morrendo de fome, de frio, sem casa." A professora e o marido, mecânico aposentado, vivem na Ilha do Governador, no Rio. Ela diz que seu voto é "por uma vida mais justa" para todos. "Nossa vida é política, não vivemos sozinhos."

Para Moisés, o resultado do primeiro turno mostra que as lideranças políticas precisam fazer uma autocrítica e reaprender a engajar a população. "Com as mudanças tecnológicas, o modo pelo qual esses novos segmentos sociais se expressam não é mais analógico, não mais através de lideranças de partidos. Há acesso imediato à informação na internet, é possível compartilhar narrativas próprias."

Segundo ele, é essencial uma escola mais crítica para crianças. "Nossa educação trata a coisa pública como se ela não tivesse nada a ver com os direitos do jovem. Se quisermos avançar para unificar igualdade e liberdade precisamos mudar o ensino."

Estadão
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