Por que tantos candidatos a prefeito 'escondem' nome e logomarca de partidos nas campanhas
Quem estiver acompanhando o programa eleitoral gratuito na TV deve ter percebido como ficou difícil descobrir o partido de cada candidato.
As letras miúdas que aparecem no canto da tela ajudam pouco. Mesmo no material impresso da campanha há pouco destaque para o nome e a logomarca do partido. No rádio, a lista dos integrantes da coligação é lida em um ritmo tão veloz que, na maior parte das vezes, é impossível captar todos os partidos.
Esse fenômeno, o de ocultar ou mesmo evitar uma associação entre o candidato e um partido, já vinha ocorrendo em eleições anteriores, mas foi acentuado na campanha para as eleições municipais deste domingo.
Mas por que os nomes dos partidos não aparecem em destaque?
A Justiça Eleitoral exige que o nome dos partidos integrantes da coligação esteja presente nas peças publicitárias de campanha da candidatos majoritários, como os prefeitos.
Não há, contudo, regra estabelecendo tamanho mínimo nem obrigatoriedade de se reproduzir símbolos e logomarcas como, por exemplo, a estrela do PT, o tucano do PSDB, o coração do PT do B ou a foice e o martelo do PC do B.
Diante da ausência de regras, partidos também não costumam fazer exigências, liberando seus quadros para criarem a identidade visual que quiserem. Isso, por exemplo, fez com que alguns candidatos abandonassem os próprios símbolos usados nas eleições de 2012.
Mas especialistas afirmam que a tentativa de se descolar, de dar menos destaque ou até mesmo de esconder as legendas de candidatos pode ter razões variadas.
As explicações vão desde os escândalos recentes de corrupção até as características do sistema eleitoral, além da já conhecida preferência do eleitor brasileiro em votar em pessoas e não em partidos. Cientistas políticos ouvidos pela BBC Brasil ressaltam, contudo, que esse não é um fenômeno recente.
No Brasil, país com uma das mais baixas taxas de preferência partidária declarada do mundo, o nome do candidato tradicionalmente costuma ter mais peso que a sigla à qual ele é filiado. No Brasil, menos da metade da população declara simpatia por uma ou mais legendas. No resto do mundo, o índice está em queda, mas gira em torno de 70%.
"Candidatos sabem disso; então, pensam que colocando a legenda na propaganda ajuda pouco. Os escândalos recentes também são um fator. Muito mais importante que o partido é o nome e reputação do candidato individualmente", observa Anthony Pereira, professor do Brazil Institute no King's College London.
Pereira diz ainda que o sistema eleitoral brasileiro, com listas abertas e voto proporcional, pode ser outro fator que faz com que candidatos explorem pouco o nome dos partidos.
Rejeição partidária
"Candidatos do mesmo partido estão, essencialmente, concorrendo um contra o outro [nas eleições proporcionais, como de vereadores]. Outra vez, a legenda não ajuda", diz.
Por sua vez, Bruno Speck, professor da USP, diz que não vê a "personalização" da política de forma negativa e diz que ela não é exclusiva do Brasil. Speck pondera, contudo, que há poucos estudos sobre a relação entre fidelidade partidária e fortalecimento de partidos.
"Tão importante quanto identificação partidária, é a rejeição que um partido tem. Além disso, uma coisa é omitir a legenda, outra é tentar se disassociar dela", observa o professor da USP.
Ele lembra, contudo, que na história recente do Brasil muitos partidos fizeram questão de esquecer o passado ou de apagar, principalmente, a associação com a ditadura militar, trocando de nome - como a Arena e o PFL, hoje registrados como PP e DEM.
Nas eleições deste ano nas capitais, ficou bastante evidente que muitos candidatos tentam descolar suas imagens de partidos. Alguns deles afirmam até não serem políticos, apesar de serem obrigados a se filiar a uma agremiação política para disputar a eleição.
Em Belo Horizonte, por exemplo, a maioria dos que disputam a prefeitura preferiu não colocar, na TV, nem o símbolo nem o nome de suas legendas.
A estrela do PT virou um conjunto de quadrados coloridos e nem o tucano nem as siglas do PSDB, por exemplo, aparecem na tela com o candidato.
Em Porto Alegre, a maioria dos candidatos, entre eles os primeiros colocados nas pesquisas, também destaca apenas seus respectivos números, sem fazer referência explícita à legenda.
Em outros casos, candidatos que disputaram as eleições em 2012 abandonaram completamente o visual do passado.
Em São Paulo, tanto Celso Russomano (PRB) quanto Fernando Haddad (PT), por exemplo, passaram a usar menos suas marcas na comparação com as eleições passadas. Russomano não mais destaca o PRB na campanha de televisão.
Haddad, em 2012 anunciado como o candidato do PT, não explora o nome do partido. Ele ainda exibe a estrela vermelha, mas ela não aparece durante todo o tempo da campanha na TV. Agora alterna-se a estrela com o "H" no canto superior da tela.
João Dória e Marta Suplicy, por sua vez, não disputaram a prefeitura no último pleito, mas também não usam o nomes do PSDB e do PMDB, respectivamente.
Candidatos à reeleição também se apegam à própria imagem, deixando a legenda de lado.
Entre 2012 e 2016, o prefeito de João Pessoa (PB), Luciano Cartaxo trocou de partido. Deixou o PT e se filiou ao PSD.
Ao contrário de sua campanha em 2012, quando exibia o nome do PT e a estrela em vários momentos do programa de televisão, agora não há nenhuma referência ao nome de sua nova legenda - ele destaca apenas o número.
Em Campo Grande (MS), o candidato à reeleição Alcides Bernal também eliminou a logomarca do PP que ficava no canto da tela durante o horário eleitoral na campanha deste ano.
O tucano Artur Virgílio também tenta mais um mandato na prefeitura de Manaus (AM). Mas nem em 2012 nem neste ano ele deu destaque à ave símbolo do PSDB ou à logomarca da legenda.
Em Salvador (BA), o mesmo acontece com ACM Neto, que também concorre à reeleição. O DEM, partido do candidato baiano, mal apareceu nos programas de televisão da última e dessa campanha.
Algumas das legendas criadas mais recentemente, contudo, tentam reforçar suas marcas, como o Partido Novo e a Rede. Não é raro ver Marina Silva, principal face da Rede, dando boas vindas ao partido nas campanhas de candidatos em diferentes cidades.
Outras até repetem o mesmo bordão do passado, como o PSTU, que há várias eleições lembra o eleitor para votar "contra burguês".
Mas há quem ainda faça campanha no velho estilo, como o candidato à prefeitura de São Luís, Fábio Câmara. Ele é um dos poucos candidatos nas capitais que ainda exibe o nome e a logo do PMDB.
Criminalização da política
Neste ano, o PMDB nacional não discutiu a divulgação da imagem do partido, liberando os candidatos para usarem na campanha a identidade que quisessem. O secretário-executivo do PMDB, Raimundo Dantas, pondera que não apenas o PMDB como a maioria das legendas estão focando sua publicidade no candidato.
"Acredito que é mais por conta dos escândalos recentes. Não há partido forte no Brasil. Também é difícil não ter o nome de partidos em manchetes policiais", observa Dantas.
O secretário de mobilização do PT nacional, Florisvaldo Souza, também critica o que chama de "criminalização da política" e avalia que isso tem impactado na forma com que os candidatos, entre eles petistas, estão fazendo campanha.
"Eu acho um equívoco o candidato que tenta se descolar do partido, mas não existem regras para forçá-los a usar o nome e a marca", observa, emendando que não considera um problema usar uma cor diferente da vermelha. "Esse debate sobre a cor não é novidade no PT".
Souza diz ainda que todos os candidatos estão orientados a defender o partido e a administração do PT no governo federal. Ele observa, contudo, que se um postulante a cargo público evita usar o nome da legenda ou tenta escondê-la, os adversários costumam explorar tal comportamento.
"Todos deveriam usar o nome de seus partidos. Senão, fica mais difícil e ruim pro eleitor, para a democracia também é péssimo", afirma Souza.
Por meio da assessoria de imprensa, o presidente do PSDB, Aécio Neves, se limitou a informar que "o partido sempre usou o número 45 em destaque nas campanhas e que isso está ocorrendo normalmente este ano, inclusive com as cores tradicionais do partido - azul e amarelo".
Disse ainda que o número de candidaturas a prefeito saltou de 107 em 2012 para 162 este ano, o que, segundo ele, demonstra o fortalecimento do partido. Mas ele não comentou a ausência do nome da sigla ou do tucano na maioria dos programas.