Tapa, deboche e mais acusações que propostas marcam debate entre candidatos à Prefeitura de São Paulo
Evento promovido pelo Terra em parceria com o Estadão e FAAP foi realizado nesta quarta-feira, 14
O segundo debate eleitoral entre os candidatos à Prefeitura de São Paulo nas Eleições 2024 foi realizado nesta quarta-feira, 14, promovido pelo Terra em parceria com o Estadão e a Fundação Armando Alvares Penteado (FAAP). Participaram do evento Guilherme Boulos (PSOL), José Luiz Datena (PSDB), Marina Helena (Novo), Pablo Marçal (PRTB), Ricardo Nunes (MDB) e Tabata Amaral (PSB), os mais bem colocados nas últimas pesquisas de intenção de voto.
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O embate foi marcado por ataques, deboche e mais acusações do que propostas sobre os temas propostos pela organização do evento, como educação, economia, planejamento urbano e segurança pública. Evocando a polarização política que tem marcado o Brasil nos últimos anos, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o ex-presidente Jair Bolsonaro foram citados em meio a argumentos -- o que não ocorreu no primeiro debate, que ocorreu na última quinta-feira, 8.
Um dos momentos mais tensos do debate ocorreu entre os candidatos Boulos e Marçal. O confronto aconteceu no segundo bloco, que teve como tema economia. Depois de responderem uma pergunta sobre transporte público, puderam fazer perguntas um ao outro. Foi aí que Marçal puxou uma carteira de trabalho enquanto afirmava que iria "exorcizar" o adversário. Boulos, por sua vez, chamou Marçal de "Padre Kelmon" desta disputa eleitoral, em referência ao candidato que disputou as eleições presidenciais de 2022.
Após deixarem os microfones, os candidatos continuaram o bate-boca na lateral do palco. Boulos chegou a dar um tapa na carteira de trabalho de Marçal e tentou tirá-la dele. Pela tensão, o candidato do PSOL foi orientado a mudar de lugar, já que estava sentado ao lado de Marçal no palco.
A sabatina contou com cinco blocos, em um formato diferente do convencional. Sempre subiam dois candidatos ao palanque por vez, em ordens sorteadas. Primeiro, cada dupla respondia a perguntas da jornalista Roseann Kennedy, mediadora do evento, sobre determinado tema. Depois, havia um tempo de embate direto entre os dois. Por fim, eles respondiam a perguntas de jornalistas do Terra, do Estadão e de alunos da FAAP sobre o mesmo assunto.
Educação e provocação sobre igualdade racial
No primeiro bloco, o tema foi educação -- com perguntas das jornalistas do Estadão Renata Cafardo e do Terra Luciana Pioto. Nunes e Marina, a primeira dupla a subir ao palco, começaram o debate se mantendo às propostas. Até que, no tempo livre de embate entre os candidatos, o tom mudou. Marina questionou Nunes sobre o programa Saúde Para Todes – projeto da Secretaria de Saúde – e, após citar ideologia de gênero, disse que “não tem nada a ver com a opção sexual de adultos”, mas pediu para que crianças fiquem “fora disso”.
Marina ainda disse que, por mais que seja de direita, a “prefeitura atual está cheia de locuras da esquerda”. Nunes lamentou o andar do debate, mas objetivamente não deu nenhuma declaração sobre o programa.
Depois subiram ao palanque Datena e Boulos, que tiveram uma troca amena. Datena deixou apenas 17 segundos para responder a uma eventual pergunta de Boulos, tendo priorizado seus minutos para discursar sobre metas de alfabetização e dizer que espera que a escola acolha os estudantes como uma extensão de seus lares. Nessa dinâmica, Boulos também utilizou seu tempo em fala livre, trazendo à tona seu compromisso com a educação inclusiva.
Por fim, para encerrar o primeiro bloco, foi a vez de Tabata e Marçal. A jornalista Luciana Pioto questionou os candidatos sobre compromissos com a igualdade racial e, no embate direto, Marçal disparou: “Tabata, porque você não colocou uma vice negra?”. Ela riu por um segundo, depois explicou que tem muito orgulho de sua vice, Lúcia França (PSB). Ela frisou que apostou em diversidade em seu time para a construção de seu plano de governo, considerando o quão múltiplo São Paulo é, e que o processo foi liderado por pessoas negras e mulheres.
Marçal é o único candidato que tem uma vice-prefeita negra, Antônia de Jesus. "Ela entrou no cenário para trazer essa igualdade entre as raças", disse.
Embate acalorado entre Boulos e Marçal
No segundo bloco, que abordou o tema da economia, os candidatos não conseguiram administrar bem o tempo, focando mais em ataques mútuos do que em apresentar propostas e fazer perguntas relevantes.
O embate mais provocativo ocorreu entre Boulos e Marçal, marcado por muitas ofensas. Boulos questionou Marçal sobre sua promessa de desistir da candidatura se sua condenação fosse comprovada. Isso porque no primeiro debate entre os candidatos à Prefeitura de São Paulo, na última quinta, dia 8, Marçal havia negado ter sido condenado e disse que deixaria a disputa se sua sentença fosse encontrada. Ainda durante a transmissão, Boulos postou trechos do documento em suas redes sociais, desafiando o ex-coach.
No debate do Terra, Boulos também perguntou a opinião de Marçal sobre os Centros de Educação da vice de Boulos, Marta Suplicy. Marçal, em resposta, usou palavras de baixo calão, afirmou que Boulos foi preso três vezes e fez uma piada dizendo que ele “poderia pedir música no Fantástico”. Boulos respondeu chamando Marçal de "mentiroso compulsivo", "canalha" e "Padre Kelmon" do debate, além de classificá-lo como uma "caricatura".
"Marçal, você é um mentiroso compulsivo, você é o Padre Kelmon dessa eleição. Você veio para tumultuar, é uma caricatura", disse Boulos. Marçal, por sua vez, rebateu: “Eu sou o Padre Kelmon e vou exorcizar o demônio com uma carteira de trabalho. Nunca trabalhou”, enquanto tirava uma réplica de uma carteira de trabalho do bolso do paletó. Ele também negou ter sido condenado por estelionato, alegando que a acusação havia prescrito: “Não tem condenação, isso ‘daí’ foi prescrito”.
Acusações sobre fake news
Ainda no segundo bloco do debate, Marina Helena e Tabata Amaral discutiram propostas para a inovação na cidade de São Paulo. Marina criticou as propostas da esquerda e enfatizou a necessidade de "menos burocracia e menos imposto" para promover melhorias. Tabata, por sua vez, prometeu a criação de dois parques tecnológicos e destacou a importância de enfrentar a baixa qualificação na área de tecnologia por meio de iniciativas de capacitação.
Durante o debate, houve um momento de tensão quando Marina insinuou que o vice-presidente Geraldo Alckmin apoiava o Hamas, ao que Tabata respondeu: “Eu fico feliz de ter nesse debate uma outra mulher, mas fico triste que essa mulher siga propagando fake news”.
No embate entre Datena e Nunes, o prefeito Ricardo Nunes utilizou parte de seu tempo para acusar Marina Helena de disseminar fake news sobre um programa de educação que incluiria “todes” no título. Enquanto Datena criticou Nunes pela desigualdade social: “É uma prefeitura rica com um povo pobre”, afirmou o tucano. “Parece que o senhor quer exterminar o cidadão de baixa renda”. Em direito de resposta concedido à Marina mais à frente, ela negou se tratar de uma fake news.
Suposta relação com o PCC
No terceiro bloco, o tema foi planejamento urbano. Datena e Marçal foram a primeira dupla. Eles seguiram em um debate propositivo, jogando a bola um para o outro ao discorrerem sobre a questão da tarifa zero. Por mais que no bloco anterior Marçal tivesse se exaltado, foi Datena que elevou a voz dessa vez: “Se Ricardo Nunes tem medo de enfrentar o PCC, eu não tenho”, finalizou sua participação nesse primeiro momento, sem apresentar provas específicas.
Na sequência, Marçal voltou a atacar Boulos enquanto se referia a Ricardo Nunes: “O mais perigoso é o Boulos, mas o mais caro é Ricardo Nunes”.
Depois foi a vez de Boulos e Marina, que receberam uma pergunta sobre mudanças climáticas. Ambos se comprometeram com o tema de maneira propositiva. Até que, no embate direto, Marina fez acusações de supostos envolvimentos de políticos do Partido dos Trabalhadores (PT) com o PCC, questionando como Boulos teria moral de acusar a máfia dos transportes se está em meio a isso.
Boulos, porém, questionou. “Quem acusa [de relações entre os transportes de São Paulo com o PCC] é o Gaeco, o Ministério Público e a polícia. E talvez você esteja me confundindo com outro candidato”.
Os dois seguiram em discussão sobre o dinheiro, trazendo à tona figuras como o presidente Lula e o ex-presidente Jair Bolsonaro.
Já Tabata e Nunes, por fim, foram questionados sobre o que fazer para tornar a cidade mais sustentável na mobilidade. Mas o que começou como uma conversa técnica terminou, no momento do embate direto, com acusações envolvendo andamentos de obras em São Paulo. Tabata também trouxe à tona a polêmica de licitações envolvendo o atual prefeito, e ele se esquivou pedindo para que a candidata não fosse leviana: “É ruim para você”.
Marçal de costas, videogame e 'aliança' entre Tabata e Boulos
No quarto bloco, Pablo Marçal voltou a atacar a maioria dos candidatos, afirmando: "Estude o perfil dos candidatos. Tem estudante e fanfarrão." Durante o debate entre Tabata e Boulos, Marçal virou de costas enquanto eles discutiam propostas para São Paulo.
Ricardo Nunes questionou Marçal sobre o aumento do efetivo da GCM e o programa SmartSampa. Marçal propôs aumentar o efetivo da GCM para 21 mil agentes, enquanto Nunes considerou a medida inviável, dizendo: "Estamos na maior cidade da América Latina. Isso não é um jogo de videogame."
Tabata e Boulos fizeram uma aliança para criticar a administração atual da Prefeitura de São Paulo, evitando mencionar diretamente o nome de Nunes. Tabata criticou o plano de governo de Boulos como caro, dizendo: "E, maluquices à parte, como ‘bondinho voador’ [proposta de Marçal], me chamou a atenção uma coisa em seu plano, Boulos, que é um plano caro." Boulos prometeu que não aumentaria impostos.
Datena e Marina Helena tiveram dificuldades de se destacar. Marina Helena criticou a falta de ações do PSDB na segurança, enquanto Datena se distanciou das ações do partido antes de sua entrada. Marina Helena propôs uma política pública contra a Cracolândia com tolerância zero contra drogas, internação compulsória e assistência social. Datena concordou com o rigor penal contra traficantes, mas discordou da internação compulsória, defendendo tratamento humanitário para dependentes químicos.
Embate entre os 'preferidos'
O quinto e último bloco teve diversos temas abordados. O primeiro embate foi entre Boulos e Nunes, os dois preferidos para ocupar o cargo de prefeito de São Paulo, segundo as pesquisas eleitorais mais recentes. Diferente da postura adotada pelos candidatos no primeiro debate eleitoral, promovido pela Band, figuras como Lula e Bolsonaro ganharam destaque direto nas falas dos candidatos.
Boulos leu três frases ditas por Bolsonaro – "O erro da ditadura foi torturar e não matar", "Eu não te estupro porque você não merece" e "Eu não confio na urna eletrônica" – e questionou se Nunes concordava com as alegações, já que o ex-presidente é seu padrinho político. Nunes, como fez ao longo do debate, fugiu da pergunta e retrucou: “Eu não sou comentarista político, sou prefeito de São Paulo”. O candidato do PSOL o chamou de fantoche e disse que ele não tem carisma.
Dobradinhas entre 'aliados'
Depois foi a vez de Marçal e Marina falarem sobre mercado privado, tema comum na campanha de ambos. Com Marina, pela primeira vez, Marçal adotou uma postura diferente. Ele parabenizou a candidata por sua presença no debate e a caracterizou como uma pessoa “inteligente e bem intencionada”.
Nessa toada, os dois seguiram em dobradinha, sem acusações entre eles. Juntos, afirmaram que “tudo é um teatro” e pediram votos. Enquanto Marçal lançou o seu “faz o M”, Marina complementou em tom descontraído: “Já que vão fazer o M, faz o M de Marina”.
Tabata e Datena assumiram o palco na sequência. Eles falaram sobre creches e endossaram o discurso do outro ao discorrer sobre melhorias e citar a ‘Máfia das Creches’. No embate livre, Tabata levantou a questão da educação inclusiva, uma das bandeiras de sua campanha, e Datena disse se comprometer com a causa – e, em sua fala, se referiu às pessoas com deficiência como pessoas com ‘necessidades especiais’.
Ainda em tom de apoio mútuo, a conversa entre eles culminou em outro assunto, o PCC. Datena reforçou ter sido o único a ter dado ênfase à questão do crime organizado, e Tabata complementou: “Muita gente não tem moral e não fala sobre o PCC porque tem medo”, citando um áudio em que o presidente do partido de Pablo Marçal afirma ter elo com o grupo criminoso e uma foto em que o candidato aparece ao lado de um familiar de um chefe da facção. “Não sejamos trouxas”, finalizou Tabata.
Marçal teve direito de resposta logo após ter sido alvo de acusações, mas não usou o momento para se defender de nenhuma das pontuações sobre o PCC. Ao invés disso, soltou que irá "caçar os comunistas" e que "bandido tem que ir pra cadeia e quem fez errado vai ter que pagar".
Eleições em São Paulo
Até o momento, há oito candidatos ao cargo de chefe do Executivo de São Paulo registrados no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). São eles Altino Prazeres (PSTU), Datena (PSBD), Guilherme Boulos (PSOL), Marina Helena (Novo), Pablo Marçal (PRTB), Ricardo Nunes (MDB), Ricardo Senese (UP) e Tabata Amaral (PSB).
A Justiça Eleitoral continua aceitando registros de candidaturas até esta quinta-feira, dia 15 de agosto. A partir dessa data, tem início o período eleitoral – com a liberação de propagandas.
As eleições municipais de 2024 ocorrem no dia 6 de outubro, o primeiro domingo do mês. Já o segundo turno pode ser no último domingo de outubro, no dia 27, se assim for decidido pelo povo. Se for o caso, o Terra realizará mais um debate com os dois candidatos no dia 16 de outubro.