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Em São Paulo, mulheres em secretarias da Prefeitura só controlam 3,6% do orçamento

Covas melhora representatividade, mas homens brancos mantêm cargos-chave

6 jan 2021 - 13h06
(atualizado às 17h04)
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As mulheres escolhidas pelo prefeito Bruno Covas (PSDB) para comandar secretarias municipais foram indicadas para pastas com menos recursos e que executam menos políticas públicas. Sob responsabilidade das oito selecionadas estão pouco menos de R$ 2,5 bilhões, ou 3,6% do orçamento total de 2021, que é de cerca de R$ 68 bilhões. Covas havia prometido, na campanha, melhorar a representatividade feminina no primeiro escalão do governo, mas limitou-se a aumentar de sete para oito o total de mulheres no secretariado, das quais duas são negras (na gestão anterior, era uma). Seu governo começa sem nenhum homem negro entre os secretários - no total, são 23 pastas.

Em capitais como Recife e Belém, em que a questão da representatividade também foi abordada na campanha eleitoral, as mulheres serão 50% da equipe, e comandarão pastas com mais verbas, como Saúde e Habitação.

Em São Paulo, em meados do ano passado, o volume de orçamento sob responsabilidade de mulheres era maior. Covas havia indicado Elisabete França para a secretaria de Mobilidade e Transportes, depois da demissão de Edson Caram em meio a reclamações sobre ônibus lotados no auge dos primeiros casos de covid-19. Elisabete, sozinha, gerenciava um orçamento de R$ 3,3 bilhões, mais do que as oito indicadas, cujas nomeações foram oficializadas no Diário Oficial da Cidade da última sexta-feira, 1º de janeiro.

A primeira pessoa da nova equipe de Covas confirmada pelo prefeito foi a secretária de Justiça, Eunice Prudente. Ela é a única professora negra da Faculdade de Direito do Largo São Francisco, da Universidade de São Paulo (USP) e, embora o prefeito não tenha feito nenhuma citação direta a isso, o fato de o primeiro nome ser de uma mulher negra foi recebido por aliados como um gesto simbólico de cumprimento da promessa eleitoral.

Covas passou as duas últimas semanas de 2020 anunciando os nomes da equipe em sua conta no Instagram, em geral de três em três, sempre com uma mulher na lista. Terminadas as indicações, entretanto, as mulheres ficaram em secretarias com orçamentos médios ou baixos. As que terão maior receita e mais atuação frente a políticas públicas são Berenice Giannella, na Assistência Social, que terá cerca de R$ 981 milhões para cuidar da população de rua e de outras ações da pasta, e Elza Paulina de Souza, inspetora da Guarda Civil Metropolitana (GCM) nomeada secretária da Segurança Urbana, que terá cerca de R$ 773 milhões e é a segunda pessoa negra na relação de secretários.

Completam a lista das secretárias Aline Cardoso (Desenvolvimento Econômico, Trabalho e Turismo), Ana Claudia Carletto (Direitos Humanos e Cidadania), Silvia Grecco (Pessoa com Deficiência) e a ex-prefeita Marta Suplicy (Relações Internacionais). Marina Magro foi nomeada procuradora-geral do Município. Berenice, Aline e Cláudia já vêm da gestão anterior.

Críticas

O novo cenário é alvo de críticas de estudiosos que atuam em defesa de um governo que reflita, de forma proporcional, a composição da população da cidade. Segundo a Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados (Seade), 51,7% dos 11,8 milhões de habitantes da capital paulista são mulheres. O total da população que se declara preta ou parda é de 37%, também de acordo com dados da fundação de 2019.

Para a doutoranda em Ciência Política pela USP e cofundadora do projeto A Tenda das Candidatas, que ofereceu consultoria a candidatas, Hannah Maruci Aflalo, não se pode menosprezar as secretarias que foram ocupadas pelas mulheres, uma vez que essas pastas também têm atribuições importantes. "Mas, quando a gente olha no geral, as mulheres não estão com as principais secretarias. E uma das principais coisas que poderiam ter sido feitas é transformar as coordenações de Mulheres e de Igualdade Social em secretarias, como já foram (na gestão Fernando Haddad, do PT, até 2016)", disse Hannah.

No caso da representatividade negra, o professor de Sociologia e Ciência Política no Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (IESP-UERJ), Luiz Augusto Campos, coordenador do Grupo de Estudos Multidisciplinares da Ação Afirmativa (GEMAA) da universidade, disse que Covas buscou adequar suas propostas às demandas de proporcionalidade racial, especialmente no segundo turno, mas que faltava saber se os compromissos eram reais ou retóricos. "Ele fez a lição de casa na campanha, e chegou no segundo turno defendendo até o fechamento de estabelecimentos que registrassem casos de racismo", afirmou.

Campos disse que a presença de negros na elite política, além de trazer visões e experiências diferentes das do grupo de homens brancos de meia idade e de classe alta, capacita os nomeados para a disputa de cargos eletivos, o que poderia aumentar a presença de negros no Legislativo e no Executivo.

O Estadão questionou o governo Covas sobre a falta de proporcionalidade na escolha dos secretários e os motivos de as mulheres terem ficado com a fatia de 3,6% para executar, mas a Prefeitura não respondeu.

Resposta

Após a publicação da reportagem, a Prefeitura enviou a seguinte nota:

"A Secretaria Especial de Comunicação (Secom) discorda veementemente do conceito da matéria Secretárias detêm 3,6% da verba da Prefeitura. Em gestão pública, todas as áreas administrativas são importantes e o Orçamento não é, por si só, um indicativo proporcional de qualquer tipo de relevância. Poderia, inclusive, ser interpretado como uma forma de preconceito na medida em que defende que quem dispõe de mais recursos - e aí estão envolvidos dimensão administrativa, natureza de serviço e não apenas investimento - são mais valorizados daqueles que demandam menos recursos. As Secretarias da Justiça, de Assistência e Desenvolvimento Social, do Trabalho e Empreendedorismo, Segurança Urbana, de Direitos Humanos, de Relações Internacionais, da Pessoa com Deficiência e da Procuradoria-Geral do Município, sem contar secretárias-ajuntas e executivas têm relação direta com toda a população e têm papel vital na gestão da cidade. O critério utilizado pela reportagem do Estadão não contribui para o correto entendimento e enfrentamento da questão principal, que é ampliar a participação feminina em cargos públicos de direção."

No Recife, mulheres comandam Finanças, Saúde e Habitação

No Recife, o prefeito João Campos (PSB), que disputou a eleição tendo uma mulher (Isabella Roldão) como vice, anunciou no sábado, equipe com 9 mulheres entre as 18 secretarias. Durante a campanha, disputada contra Marília Arraes (PT), Campos prometeu que 50% da sua equipe, incluindo o comando de secretarias, empresas públicas e autarquias, seria formado por mulheres.

Uma delas será Luciana Albuquerque, que era secretária executiva de Vigilância em Saúde do governo de Pernambuco e estava na linha de frente do enfrentamento à covid-19. Ela ficará na pasta da Saúde. Na Secretaria de Finanças, Campos indicou outro quadro vindo do governo do Estado, a ex-secretária executiva de Desenvolvimento Econômico Maíra Fisher. Outro posto de visibilidade chefiado por uma mulher é a Habitação, com Maria Eduarda Médicis, indicada do Progressistas, partido que compôs a aliança que elegeu o prefeito.

Em Belém, 18 mulheres ocuparão cargos do primeiro escalão, considerando secretarias, coordenadorias e fundações. O número representa 50% da equipe do prefeito Edmilson Rodrigues (PSOL), que assume pela terceira vez a prefeitura. Entre as mulheres escolhidas está Márcia Kambeba, de 42 anos, primeira indígena a fazer parte do primeiro escalão da prefeitura. Ela assume como ouvidora-geral do município. "Sou do Amazonas e há 10 anos estou em Belém. Me sinto honrada com o convite, e com uma enorme responsabilidade neste novo desafio", disse ao Estadão a indígena que também é mestre em geografia e professora da Universidade do Estado do Pará (UEPA).

"Belém é uma cidade da Amazônia com mais de 400 anos que nunca teve um indígena em cargos de primeiro escalão. Isso é um reconhecimento, mostra que, agora, se abre um novo cenário para que a cidade reconheça a diversidade feminina de gênero, raça e classe social que retrata a pluralidade do nosso povo. Ter uma indígena como ouvidora representa uma maior visibilidade para nós indígenas mostrarmos a nossa forma de fazer política", disse. / COLABOROU ROBERTA PARAENSE, ESPECIAL PARA O ESTADÃO

Estadão
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