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Entre dor e alegria, palestinos voltam ao norte de Gaza

28 jan 2025 - 12h27
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Milhares vão a pé para área que foram forçados a deixar pelos militares de Israel, retornando a região devastada por bombardeios, para ver o que restou do antigo lar e desenterrar parentes ainda sob escombros.Mahmoud Ayoub empacotou rapidamente roupas e cobertores quentes no campo de refugiados de Nuseirat, localizado no centro da Faixa de Gaza. Assim como tantos outros deslocados palestinos, o trabalhador de 33 anos e sua família estavam vivendo numa barraca nos últimos meses.

Carregando o pouco que ainda lhes resta, palestinos retam a pé ao norte de Gaza após acordo de cessar-fogo
Carregando o pouco que ainda lhes resta, palestinos retam a pé ao norte de Gaza após acordo de cessar-fogo
Foto: DW / Deutsche Welle

"Estou radiante de felicidade com a ideia de retornar para o norte de Gaza depois de 16 meses deslocado. As notícias [do cessar-fogo entre Hamas e Israel] nos deram esperança", afirmou o palestino à DW.

Ayoub, pai de três crianças pequenas, se preparava para retornar para casa com sua família em Sheikh Radwan, um bairro na Cidade de Gaza, na manhã desta segunda-feira (27/01). Palestinos de barracas vizinhas, todos deslocados do norte do território, ajudaram a desmontar a barraca e dobrá-la. Alguns queriam ainda esperar alguns dias antes da volta para ver como a situação irá se desenvolver. Houve alívio, mas também preocupação sobre o que os espera onde moravam.

"Conversamos com vários amigos do norte para saber como estava a nossa casa. Eles disseram que ela estava quase destruída e não temos certeza se ainda podemos morar nela. Mesmo assim decidimos voltar", contou Ayoub. "Se não pudermos morar na casa, vamos viver, eu, minha esposa e meus filhos, em uma barraca do lado."

A família planejou o retorno a pé, como centenas de milhares de palestinos que foram deslocados à força do norte de Gaza durante a guerra entre o grupo terrorista Hamas e Israel. "Não sabemos como será a jornada, se será fácil ou difícil. A estrada é longa, cerca de sete quilômetros ao longo da costa", disse Ayoub, que está preocupado sobre como seus filhos vão lidar com a viagem.

Retorno adiado

No domingo, milhares de palestinos esperavam na rodovia costeira Rashid, que corta o enclave do sul ao norte, para poder dar início à caminhada de volta para a casa. O acordo de cessar-fogo entre Israel e Hamas, grupo responsável pelos ataques terroristas de 7 de outubro de 2023 no sul de Israel que desencadearam a guerra em Gaza, previa a liberação da rota a pé.

No entanto, Israel bloqueou a rodovia após acusar o Hamas de quebrar termos do acordo ao não libertar a civil Arbel Yehud na troca de reféns realizada no sábado. Yehud foi sequestrada com seu namorado do kibutz Nir Oz durante os ataques de 7 de outubro e tem sido mantida em cativeiro pela Jihad Islâmica, outro grupo armado palestino. Seu irmão foi morto nos ataques.

No final do domingo, o Catar, que intermediou o cessar-fogo, anunciou um acordo que prevê a libertação de Yehud e de outros dois reféns israelenses na quinta-feira. A informação foi confirmada pelo primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, que acrescentou que entre os próximos libertados estará a militar Agam Berger. Outros três reféns devem ser libertados no sábado em troca de palestinos mantidos em prisões israelenses.

Contrapartida, Israel deveria permitir o movimento de deslocados a pé do sul para o norte através do chamado corredor Netzarim, que é uma estrada aberta, de leste a oeste, pelas forças israelenses, durante a guerra com o Hamas, para dividir o norte do sul da Faixa de Gaza. Algumas famílias foram separadas. Muitos palestinos tiveram que deixar parentes para trás enquanto seguiam para o sul em busca de segurança.

Na manhã desta segunda-feira, a passagem foi aberta, e milhares de palestinos cruzaram o corredor a pé. Horas depois, veículos também foram autorizados a passar, porém, somente após controles de segurança.

Os primeiros a cruzar o corredor rumo ao norte foram palestinos que estavam acampados desde sábado na região. "Nos últimos dois dias, estamos dormindo ao relento, esperando o Exército israelense abrir o posto de controle de Netzarim para podermos retornar ao norte da Faixa de Gaza e ver o que sobrou das nossas casas demolidas. Se é que sobrou alguma coisa", afimou Rizek Ayoub, que estava a caminho da Cidade de Gaza com 57 parentes.

Alegria e dor

O clima durante a jornada era de alguma maneira alegre, conta Amani Zahd, que voltava para seu antigo bairro al-Nasr, na Cidade de Gaza. "A cena é terrível e estranha. Há muitas pessoas, mas elas estão felizes. Apesar de todo o sofrimento, há felicidade e eu também a sinto", contou a palestina. "Estou confiante de que o futuro será melhor."

Outros esperam um retorno doloroso, mas não somente porque perderam suas casas. Tamer al-Farani, um funcionário de uma ONG local, disse que esperava finalmente poder enterrar seus entes queridos que ainda estão no meio dos escombros do local onde buscaram abrigo no norte do enclave que foi bombardeado.

"Perdi o contato com minha irmã, com seu marido e suas quatro crianças em 1º de dezembro. Naquela época, eles estavam hospedados em uma casa em Tal al-Zaatar na região do campo de Jabalia com outra família", contou al-Farani por telefone enquanto se preparava para deixar Deir al-Balah.

Sua irmã e sua família foram deslocadas várias vezes antes de se abrigarem próximo ao campo de refugiados. Uma mensagem de texto chegou logo depois, e, desde então, mais nada.

"Duas semanas depois, ouvimos que o prédio onde eles estavam foi bombardeado e todos que estavam lá dentro morreram. Era um prédio de quatro andares e todos que estavam lá dentro continuam enterrados sob os escombros", disse al-Farani.

Agora ao retornar para o norte, ele espera descobrir o que realmente aconteceu e vasculhar os escombros para encontrar os corpos de seus familiares. "Fomos informados que a Defesa Civil não tem equipamentos, mas usaremos nossas mãos para encontrar seus corpos", afirmou o jovem de 27 anos, que espera dar um enterro digno para seus parentes.

A Defesa Civil de Gaza disse em um comunicado que "com base em informações fornecidas por cidadãos, registramos os nomes e as localizações de centenas de mártires que ainda estão desaparecidos". O órgão acrescentou que a recuperação dos corpos foi difícil e que o progresso foi lento devido à falta de equipamentos.

Mais de 6,8 mil desaparecidos

De acordo com a Cruz Vermelha, entre outubro de 2023 e dezembro do ano passado, foram registrados 9,2 mil desaparecimentos em Gaza. Desses, 6,8 mil casos estão ainda sendo investigados.

Israel pode ter detido alguns dos desaparecidos, outros podem ter sido mortos durante a guerra. Algumas crianças separadas de suas famílias durante o conflitos já voltaram para seus parentes.

"Queremos curar nossas feridas e reconstruir nossas vidas, mesmo que seja só um pouco. A perda é avassaladora, e há muito desaparecidos. Ainda assim, precisamos encontrar uma maneira de recomeçar", afirmou al-Farani.

Deutsche Welle A Deutsche Welle é a emissora internacional da Alemanha e produz jornalismo independente em 30 idiomas.
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