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Erdogan quer adotar segregação de gênero nas universidades turcas

8 jul 2019 - 20h32
(atualizado em 9/7/2019 às 07h15)
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Presidente conservador visitou instituição de ensino superior exclusiva para mulheres no Japão e disse estar disposto a importar modelo. Anúncio causou indignação entre feministas e ativistas na Turquia.O presidente da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, fez um comentário controverso em um discurso na cúpula do G20 em Osaka. O discurso continha uma passagem com elogios ao sistema de ensino japonês por causa da sua política de segregação de gênero em certas universidades.

Erdogan e sua esposa, Emine, durante visita a uma universidade exclusiva para mulheres no Japão
Erdogan e sua esposa, Emine, durante visita a uma universidade exclusiva para mulheres no Japão
Foto: DW / Deutsche Welle

Erdogan disse que as 80 universidades exclusivamente para mulheres no Japão são "uma coisa muito importante" e que ele poderia imaginar a introdução de algo similar na Turquia. Durante sua visita ao país asiático, Erdogan ainda recebeu um título honorário de uma dessas instituições, a Universidade de Mulheres Mukogawa.

Em Ancara, capital da Turquia, depois de voltar do Japão, Erdogan novamente enfatizou as supostas vantagens de um sistema educacional com segregação de gênero seguindo o modelo japonês. Ele voltou a afirmar que poderia imaginar uma separação semelhante nas universidades turcas e disse que pediu ao Conselho Turco de Educação Superior (YOK), responsável pela supervisão do ensino superior, para dar início a um programa nesse sentido.

Muitos setores da população turca, incluindo feministas e ativistas pelos direitos das mulheres, reagiram com críticas. Muitas indicaram que o Japão, de todos os países, está longe de ser considerado exemplar em questões de igualdade de gênero. Um relatório de 2018 do Fórum Econômico Mundial que analisou a desigualdade global entre os sexos classificou o Japão na 110º posição entre 149 países - com a Turquia ainda 20 posições abaixo.

Fatmagul Berktay, uma cientista política e especialista em direitos das mulheres, lembra que o objetivo das universidades segregadas por gênero no século 19 era dar às mulheres maior acesso à educação. Este também era o propósito dessas instituições quando eles foram fundadas no Japão.

No entanto, nos dias atuais, Berktay considera que essa segregação de gênero é mais um ato de discriminação. Segundo ela, a qualidade do sistema educacional turco caiu drasticamente nos últimos anos, o que significa que existem outros problemas mais urgentes.

"Nosso sistema educacional está fundamentalmente quebrado", diz Berktay. "Precisamos urgentemente melhorar nossa educação. Falar sobre universidades segregadas por gênero neste momento é pura tolice."

Berktay aponta ainda para os resultados de um estudo turco semelhante ao Pisa, da OCDE, que examinou o desempenho educacional das crianças do país e concluiu que muitas têm um desempenho extremamente ruim em matemática e turco.

Erdogan e a liderança do seu partido, o conservador islâmico, argumentam que a segregação por gênero nas instituições educacionais poderia melhorar o desempenho das alunas. Mas a cientista política Berktay diz que não há nenhuma lógica nesse raciocínio. "Se você olhar para as notas das meninas na escola primária, verá que o desempenho escolar delas está melhor do que nunca - embora elas estejam sendo ensinadas ao lado dos meninos".

De fato, a OCDE aponta que as meninas turcas têm um desempenho ligeiramente melhor do que as crianças do sexo masculino.

Violação do princípio do secularismo

Aksu Bora, uma acadêmica feminista da Universidade Hacettepe, em Ancara, descreve a iniciativa do presidente turco como uma "fantasia nostálgica": "No século 21, nenhuma mulher, nem mesmo com inclinação conservadora, gostaria de estudar em tal universidade", disse ela.

Bora também acredita que há preocupações mais urgentes do que a segregação por gênero nas universidades. "É absurdo falar de universidades para mulheres, justamente quando acadêmicos estão sendo demitidos em massa", disse ela, em referência aos muitos professores e professoras na Turquia que perderam seus empregos por decreto desde a tentativa de golpe em julho de 2016. Alguns até receberam sentenças de prisão.

Muitos membros da oposição na Turquia também não gostam da política e da retórica crescentemente religiosa do presidente. Erdogan é frequentemente acusado de interferir no sistema educacional com o objetivo de incutir com cada vez mais força valores conservadores islâmicos nas gerações mais jovens da Turquia.

A ativista pelos direitos das mulheres Zelal Ayman também acredita que as iniciativas do presidente turco sejam parte de um plano de longo prazo. "As universidades femininas são um movimento para inocular a população com mais religiosidade", diz ela. "Mas isso seria um passo na direção errada. Em vez disso, devemos avançar com a secularização. As universidades femininas nos levarão para trás, não para frente", diz ela.

O secularismo - a separação entre Estado e religião - tem sido um dos princípios fundamentais da Turquia desde que o moderno Estado foi fundado em 1923. Consequentemente, desde então nunca houve uma universidade com separação por gêneros.

Kemal Mustafa Ataturk, o fundador da Turquia moderna, considerava a separação entre Estado e religião como um dos "seis pilares do Estado turco". Até hoje, a maioria das pessoas na Turquia acredita firmemente no princípio do secularismo. A segregação por gênero nos estabelecimentos de ensino é, portanto, vista de forma muito crítica - afinal, muitos turcos a encarariam como uma violação desse princípio. O princípio da igualdade dos sexos também é estabelecido em lei. Um artigo na Lei Básica da Educação Nacional, aprovada em 1973, diz simplesmente: "Uma educação na qual ambos os sexos participam juntos é boa".

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