Especialista alerta sobre riscos da privatização da Carris Porto-Alegrense
Especialista alerta sobre riscos da privatização da Carris e defende alternativas para garantir a concorrência e a qualidade do serviço de transporte coletivo.
A Prefeitura de Porto Alegre tomou uma importante decisão ao publicar o edital de concessão da Companhia Carris Porto-Alegrense na última terça-feira (25). O objetivo é arrecadar no mínimo R$ 109 milhões com a venda de ações e ativos da empresa estatal de ônibus, permitindo que a vencedora da licitação opere as 20 linhas da Carris, representando 22% do sistema de transporte, pelos próximos 20 anos. Entretanto, especialistas e membros da sociedade civil demonstram preocupações com o modelo proposto, apontando riscos de concentração do sistema e perda de controle público.
Em conversa com o Sul21, o geógrafo Rafael Calabria, coordenador do Programa de Mobilidade Urbana do Instituto de Defesa do Consumidor (Idec), a proposta de privatização apresentada pela Prefeitura é vista como o "pior cenário possível" para a concessão da Carris. Ele ressalta a importância estratégica de manter uma empresa pública no cenário de oligopolização do sistema de transportes na cidade, pois isso proporcionaria uma maior influência e controle sobre o setor privado, bem como a capacidade de pressionar por melhorias no serviço.
Calabria destaca que, mesmo em um cenário de decisão política pela privatização, existem modelos alternativos mais vantajosos do que passar toda a operação da Carris para uma única empresa privada, o que poderia prejudicar a concorrência. Em vez disso, ele sugere separar a frota, a operação e a propriedade das garagens, permitindo que diferentes empresas assumam essas responsabilidades, o que poderia garantir mais concorrência e qualidade nos serviços prestados.
Uma das principais críticas ao edital proposto é a transferência das garagens da Carris para a empresa vencedora, o que poderia consolidar o domínio do setor por poucas empresas privadas, impedindo a concorrência e levantando suspeitas de cartel e oligopólio. Calabria argumenta que manter a posse das garagens em mãos públicas permitiria à Prefeitura mais flexibilidade para tomar ações diferentes, além de exercer um maior controle sobre o serviço prestado.
O especialista aponta exemplos de outras cidades do Brasil, como São José dos Campos e o Rio de Janeiro, que estão adotando modelos inovadores de concessão, separando a frota, a operação e as garagens. Ele destaca que a Carris poderia ter optado por um modelo semelhante, como a concessão da frota por aluguel, mantendo a operação das linhas e a posse das garagens pelo poder público.
Apesar disso, o edital de privatização da Carris apresenta um aspecto positivo ao estabelecer a remuneração da concessionária com base no custo da operação, em vez do custo por passageiro. Isso evitaria que o empresário lucrasse mais lotando os ônibus e reduzindo o custo real da operação. No entanto, essa medida, em conjunto com o modelo de concessão proposto, poderia dificultar o controle sobre outras regras da operação e a concorrência no setor.
Em meio às discussões sobre a privatização da Carris, a nível federal, encontra-se o Marco Legal do Transporte Público Coletivo, que busca estabelecer diretrizes para a gestão e contratação do sistema. O prefeito Sebastião Melo tem participado dessas discussões como vice-presidente de Mobilidade Urbana da Frente Nacional de Prefeitos (FNP), mas especialistas acreditam que o modelo de concessão proposto pela Prefeitura está indo contra as boas práticas recomendadas pelas discussões em curso.
Calabria enfatiza a oportunidade que a Prefeitura de Porto Alegre tem para adotar um modelo de concessão mais equilibrado, que promova a concorrência e garanta o melhor serviço para a população, sem repetir erros do passado.