Seis países da América Latina e os EUA reconhecem vitória da oposição na Venezuela
Vitória de Edmundo González foi reconhecida ainda por Peru, Equador, Costa Rica e Panamá. Comunidade internacional vê com desconfiança "resultados oficiais" proclamados por Nicolás Maduro e aguarda comprovação dos votos.Depois do Peru e dos Estados Unidos, a Argentina, o Uruguai, o Equador, a Costa Rica e o Panamá reconheceram a vitória do candidato da oposição à Presidência da Venezuela, Edmundo González Urrutia, em pleito realizado no último domingo.
Os anúncios de Uruguai e Argentina vieram nesta sexta-feira (02/08), um dia após o reconhecimento pelos EUA. Na sequência, Equador, Costa Rica e Panamá também se manifestaram. O Peru, primeiro a endossar González, já havia anunciado sua posição na terça-feira.
Com isso, chegam a sete os países que rejeitam a vitória de Maduro - seis na América Latina, todos liderados por governos de direita.
Ao se pronunciar em nome dos EUA na quinta-feira, o chefe da diplomacia americana, Antony Blinken, citou "evidências esmagadoras" de que González "recebeu a maioria dos votos na eleição presidencial da Venezuela em 28 de julho".
Um dia depois, a chanceler argentina, Diana Mondino, afirmou na rede social X que "todos podemos confirmar, sem lugar para nenhuma dúvida, que o legítimo ganhador e presidente eleito é Edmundo González".
Em seu pronunciamento, Mondino fez referência a um site da oposição venezuelana que compila atas eleitorais segundo o qual, com mais 81% dos registros digitalizados, González teria 67% dos votos. Já o Conselho Nacional Eleitoral (CNE), órgão controlado pelo regime chavista e que ainda não divulgou a totalidade das atas que comprovariam o resultado final do pleito, alega que Maduro venceu com 51% dos votos contra 44% do opositor.
"A comunidade internacional, em sua maioria, vai aceitar que foi tudo uma grande fraude e que o ditador Maduro precisa sair do poder e dar lugar, de uma vez por todas, às ações democráticas e ao que o povo venezuelano deseja, que é viver em paz e democracia", afirmou o porta-voz da Presidência da Argentina, Manuel Adorni, a jornalistas na Casa Rosada.
Logo em seguida à Argentina, o governo uruguaio fez coro aos EUA, citando também "evidências esmagadoras" e pedindo que a vontade do povo venezuelano "seja respeitada".
Na quarta, o presidente uruguaio Luis Lacalle Pou, já havia dito que, se a Venezuela não divulgou as atas eleitorais da eleição, "é porque tem algo estranho".
"Se você não mostra os documentos, é claro que há algo estranho", afirmou Lacalle Pou a jornalistas. "Eu disse que a Venezuela é uma ditadura e mantenho isso", completou.
Argentina, Uruguai, Costa Rica, Panamá e Peru fazem parte do grupo de sete países que teve seu corpo diplomático expulso da Venezuela após contestarem os resultados da eleição venezuelana.
Oposição vai recorrer à Suprema Corte
As declarações de EUA e Argentina pressionam ainda mais o regime chavista, liderado por Nicolás Maduro, que há 11 anos preside a Venezuela.
Nesta sexta-feira, González, Maduro e outros oito candidatos que concorreram na eleição devem comparecer à Suprema Corte do país a partir das 15h de Brasília para darem início a uma auditoria da votação.
Tanto o CNE quanto a Suprema Corte, no entanto, são alinhados com Maduro. O órgão eleitoral, por exemplo, é presidido por Elvis Amoroso, um aliado do atual presidente.
O resultado divulgado pelo regime, que apontou a vitória de Maduro, tem sido contestado pela comunidade internacional, a exemplo da União Europeia e diversos países latino-americanos, que preferem esperar a divulgação total das atas para se manifestar sobre o tema.
Como consequência, além de expulsar os diplomatas de Argentina, Uruguai e Peru, o regime chavista também baniu representantes de Chile, Costa Rica, Panamá e República Dominicana.
A Argentina, em cuja embaixada na Venezuela se refugiaram seis opositores contra o regime de Maduro, aguarda para a madrugada deste sábado a chegada de seus diplomatas expulsos. Os prédios da diplomacia peruana e argentina são guarnecidos pelo Brasil.
Apuração paralela
A Plataforma Democrática Unitária (PUD), partido pelo qual González concorre, contesta os resultados divulgados pelo regime. A líder oposicionista María Corina Machado, que havia sido impedida pela Justiça controlada pelo regime de concorrer, garantiu já na segunda-feira que há meios para provar uma "vitória esmagadora" de González Urrutia nas eleições presidenciais.
Machado indicou que, de acordo com 73,2% das atas, Maduro obteve 2.759.256 votos, enquanto González, 6.275.182. A oposicionista explicou que todas essas atas foram verificadas, digitalizadas e disponibilizadas num portal de internet criado pela oposição.
Nesta quinta-feira, um estudo conduzido por pesquisadores brasileiros e estrangeiros a partir dessas atas também indicou que González venceu a eleição presidencial com 66,1% dos votos contra 31,3% de Maduro. O levantamento mostra inclusive que a oposição avançou sobre antigos redutos políticos do chavismo.
Mais de mil já teriam sido presos
De acordo com um levantamento feito pelo gabinete do advogado e ativista de direitos humanos Alfredo Romero, que trabalha para a ONG venezuelana Foro Penal, mais de mil pessoas foram presas nos últimos dias devido aos protestos que têm ocorrido em diferentes cidades do país.
Segundo declaração ao site independente Pitazo, ele assumiu a defesa de pelo menos 50 casos, entre eles os de onze menores de idade e um jovem com deficiência, que têm entre 15 e 17 anos.
Conforme a Foro Penal, pelo menos 11 pessoas morreram em protestos contra os resultados das eleições devido à repressão imposta pelo regime chavista. Outras organizações, porém, já falam em mais de 20 casos.
Diferenças para a época de Guaidó
Apesar do curso autoritário do chavismo ao longo das últimas décadas, as eleições parlamentares de 2015 pareciam ter interrompido esse processo, com a oposição obtendo a maioria dos assentos na Assembleia Nacional e encerrando os 16 anos de controle governista da Casa. No entanto, Maduro passou a governar ignorando o Legislativo.
Em 2017, o Supremo dominado pelos chavistas suspendeu as prerrogativas da Assembleia Nacional controlada pela oposição e assumiu suas funções, numa ação descrita como "golpe de Estado" pelos críticos do regime.
Após essa manobra, Maduro convocou uma nova Assembleia Constituinte, cujos membros foram eleitos num pleito não reconhecido pela oposição e por grande parte da comunidade internacional. Esse órgão, controlado pelo chavismo, foi convocado para assumir as funções da Assembleia Nacional. A Assembleia Constituinte vigorou até 2020, quando foram realizadas novas eleições parlamentares, novamente numa votação contestada por opositores e vários países.
Em 2018, Maduro havia sido reeleito em um pleito marcado por irregularidades e que também não foi reconhecido por grande parte da comunidade internacional. Logo após o chavista assumir o segundo mandato, no início de 2019, o então presidente da Assembleia Nacional, o opositor Juan Guaidó se declarou presidente interino da Venezuela - sem eleições presidenciais diretas, portanto.
Guaidó foi reconhecido pelos Estados Unidos e por mais 60 países, além da Organização dos Estados Americanos (OEA). O país foi tomado então por grandes protestos contra Maduro, que atraíram milhares de venezuelanos. O "governo interino" deveria funcionar até que eleições livres fossem realizadas depois da renúncia de Maduro.
Mesmo com os grandes protestos e a grave crise econômica, a oposição liderada por Guaidó não conseguiu obter apoio dos militares e do Judiciário, e Maduro reforçou ainda mais seu controle sobre as instituições.
Sem resultados e com a comunidade internacional deixando de reconhecer Guaidó, a oposição acabou com o "governo interino" em 2022, encerrando a tentativa de isolar Maduro e promover uma mudança de governo no país.
gb/le/ra (EFE, ots)