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Governo demite pastor evangélico que chefiava área de índios isolados

Ricardo Dias foi alvo de críticas por 'inconsistências' no plano de instalação de barreiras sanitárias contra o coronavírus

27 nov 2020 - 10h07
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BRASÍLIA - Depois de nove meses à frente da coordenação-geral de Índios Isolados e de Recente Contato da Fundação Nacional do Índio (Funai), o pastor e ex-missionário evangélico Ricardo Lopes Dias foi exonerado do cargo. Sua saída foi publicada nesta sexta-feira, 27, pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública, que comanda a Funai.

Mesmo antes de chegar ao cargo em fevereiro deste ano, Dias teve a sua indicação criticada por organizações ligadas à proteção e direitos dos povos indígenas, por seu histórico de ações voltadas à "evangelização" dos índios.

A Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab), uma das principais ONGs do setor, divulgou uma nota de repúdio contra sua nomeação, alertando que os indígenas "sofreram historicamente com a atuação de missionários proselitistas - muitos deles da Missão Novas Tribos do Brasil (MNTB) -, que fizeram contato forçado com nossos avôs e avós".

Ricardo Lopes Dias foi ligado à MNTB e atuava como missionário, evangelizando índios na região da terra indígena Vale do Javari, no Amazonas. Trata-se de uma das maiores reservas demarcadas do País, com mais de 8 milhões de hectares e que concentra o maior número de registros de povos indígenas isolados em todo o mundo.

Em agosto, Dias foi criticado por causa de restrições do plano de instalação de barreiras sanitárias nas aldeias que o governo federal apresentou, para afastar os riscos de contaminação pelo novo coronavírus. Segundo a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), o plano era "extremamente deficitário e inconsistente", com terras indígenas duplicadas e outras sem a presença de nenhum agente do governo.

A Apib enviou uma petição ao ministro do Supremo Tribunal Federal Luís Roberto Barroso, pedindo ao STF que determinasse a revisão das medidas apresentadas pelo governo. "O Plano da União carece de revisão técnica e faz uso superficial e inadequado de estudos, de informações e terminologia", afirmava a ONG, na petição. Barroso, que já havia pedido ajustes ao plano do governo, apontou a necessidade de novos aprimoramentos, mas considerou que eles deviam ser feitos com o programa já em andamento, por causa da urgência do tema.

No início do ano, diversas organizações não governamentais se manifestaram contra sua chegada ao posto. "A atuação missionária nas aldeias tem sido nociva tanto quanto as doenças, pois causa a desorganização étnica, social e cultural dos povos indígenas", declarou a União dos Povos Indígenas do Vale do Javari (Univaja).

O Conselho Indigenista Missionário (Cimi) afirmou, à época, que o governo Bolsonaro dava "evidentes sinais de abandono à perspectiva técnico-científica, do respeito ao direito de existência livre desses povos, com seus próprios usos, costumes, crenças e tradições". O Instituto Socioambiental (ISA) declarou que a indicação alarmou indigenistas, que "risco à política consolidada de não contato com essas populações e o respeito ao isolamento voluntário desses povos".

Historicamente, os missionários procuram promover o contato com povos indígenas isolados e de recente contato para evangelizá-los, o que contraria frontalmente a política indigenista consolidada no Brasil. Essa política não prevê o contato com povos que queiram permanecer isolados, mas sim a proteção de suas terras, para que esse desejo de isolamento seja respeitado.

Com a saída de Dias, o cargo passou a ser ocupado por Marcelo Fernando Batista Torres, servidor de carreira da Funai, lotado na frente de proteção da fundação no Acre.

Estadão
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