Opinião: O que significa a condenação de Bolsonaro e Braga Netto na Justiça Eleitoral
General passou ileso pelas CPIs da Covid e do 8.jan começa a acertar contas com a Justiça
“Não vou falar com a imprensa, não”, gritou do portão do Palácio da Alvorada o general Braga Netto (PL) e candidato a vice-presidente derrotado junto com Jair Bolsonaro (PL). Voltando-se para um grupelho de bolsonaristas toscamente vestidos com a bandeira do Brasil, seguiu: “o presidente está bem, está recebendo gente, não tem problema nenhum. Vocês não percam a fé, tá bom? É só o que eu posso falar agora”, resumiu de maneira enigmática.
Era 18 de novembro de 2022, Bolsonaro lambia as feridas da eleição, não tinha reconhecido a derrota para Lula (PT), pouco trabalhava e não dava as caras publicamente. A frase que aparentemente não faz sentido algum, foi a faísca que reanimou os golpistas que acampavam sob Sol e chuva na porta dos quartéis Brasil afora pedindo golpe.
Resgatei esse trecho para dimensionar quem é Braga Netto. Discreto e de falar pouco, estava longe de ser um garoto de recados de Bolsonaro como tantos outros militares foram. Militar da reserva, coordenou o plano de governo e ajudou a dar os rumos da campanha eleitoral à reeleição. O “vice dos sonhos”, como dizia Bolsonaro, era uma das poucas pessoas a que o capitão dava ouvidos. Na corrida eleitoral, coordenou e deu alguma harmonia aos distintos grupos do centrão (PP, Republicanos e PL), militares e fanáticos radicais bolsonaristas.
Sua ascensão política começara, antes, com Michel Temer (MDB) - governo fruto da coalizão civil e militar que passou a perna em Dilma Rousseff (PT). Em 2018, colheu os frutos do prestígio no Exército assumindo a função de interventor federal no Rio de Janeiro, o que fez dele, praticamente, governador do estado sem ter um voto sequer.
No governo Jair Bolsonaro, Braga Netto se empoderou de vez e chefiou dois ministérios: Casa Civil e Defesa, além da função de assessor especial da Presidência durante a campanha.
Na Casa Civil foi o coordenador da mortal gestão da pandemia que vitimou 700 mil brasileiros. Quando eu estava no Intercept Brasil, contei que ele foi decisivo em negociações e contratos de vacina, na crise do oxigênio em Manaus e em projetos para importação e distribuição da cloroquina, medicamento comprovadamente ineficaz contra a covid-19. Apesar disso tudo, se esquivou da CPI da Covid e sequer prestou depoimento.
Assim também aconteceu na CPMI do 8 de janeiro, onde o general teve depoimento marcado para falar sobre seu papel na tentativa de golpe, mas as datas foram canceladas. De novo, a classe política se acovardou e o país ficou sem ouvir Braga Netto.
Enquanto isso, no PL do mensaleiro Valdemar da Costa Neto, Braga Netto era avaliado como possível candidato à prefeitura do Rio, em 2024. O caminho seguia livre até a noite desta terça, 31, quando o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) o declarou inelegível até 2030.
O ambiente político começou a azedar para o general um pouco antes, em setembro deste ano, quando a Polícia Federal avançou em investigações por crimes de corrupção à época da intervenção. São investigados também crimes de patrocínio de contratação indevida, dispensa ilegal de licitação e organização criminosa. O general teve o sigilo telefônico quebrado. Braga Netto negou qualquer irregularidade e falhas na intervenção.
Sem dúvidas, a decisão da Justiça Eleitoral pelo uso eleitoral do 7 de Setembro foi o maior revés que Braga Netto sofreu. E um revés caro, o tribunal determinou pagamento de multa de R$ 212,8 mil. Bolsonaro já estava inelegível e assim permaneceu com a nova decisão, que não é cumulativa, mas lhe impôs multa de R$ 425,6 mil.
Já vimos em outros momentos, que quando a maré vira, traz junto uma enxurrada de processos judiciais, investigações e operações policiais. Por caminhos certos ou errados, foi assim que aconteceu com Dilma, Lula, Temer, Bolsonaro e agora, Braga Netto.
Se o general tem alguma fé, é a ela que ele precisa se agarrar. Os ventos vindos do TSE têm cheiro de tempestade política.
Bom feriado!
*Excepcionalmente nesta semana, em razão do feriado, adiantamos a publicação Peneira Política.
Este texto foi publicado originalmente na newsletter semanal Peneira Política, assinada por Guilherme Mazieiro. Assine aqui, gratuitamente, e receba os próximos conteúdos