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Guilherme Mazieiro

Opinião: Por que o ‘mercado’ torce pela morte de Lula?

É um erro ignorar o mercado, mas também é errado achar que o mercado é tudo que importa para o país.

13 dez 2024 - 12h01
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Presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) com pontos na cabeça após acidente doméstico em outubro.
Presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) com pontos na cabeça após acidente doméstico em outubro.
Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasi / Perfil Brasil

Por volta das 17h da última quarta, 11, várias ações na bolsa viraram e começaram a subir ao mesmo tempo em que o dólar caía. O motivo da animação do "mercado"? A notícia da Folha de S. Paulo que Lula (PT) passaria por uma nova cirurgia, até então inesperada. Isso deu a percepção para bancos, investidores e corretoras de que a nova operação seria pela piora na saúde do mandatário e com isso, ocorreria o possível afastamento da Presidência e de uma eventual disputa eleitoral em 2026.

A empolgação foi se desfazendo com a entrevista dada pelo médico de Lula, Roberto Kalil Filho, que indicou que o procedimento, apesar de não programado, não era grave, sendo mais uma prevenção do que correção da operação anterior.

A saúde do presidente, seja ele quem for, é assunto de interesse nacional. E a falta de alinhamento entre o hospital Sírio-Libanês e a Presidência causou ruído, mais confundiu do que explicou. Entre a notícia da Folha e a entrevista improvisada do médico transcorreu cerca de uma hora.

Em novembro, às vésperas do anúncio de corte de gastos, um trecho do plano de Fernando Haddad (Fazenda) foi pinçado e divulgado pela imprensa causando rebuliço. A brecha dada para especulação fez o dólar disparar e a bolsa cair.

A notícia era de que o corte viria acompanhado da isenção de imposto de renda para quem ganha até R$ 5 mil. Só no dia seguinte Haddad disse que a medida era para 2026, casada com a taxação de quem ganha mais de R$ 60 mil por mês e não paga o que deveria. A reação se deu porque sentiram o impacto só nos investimentos que possui (no CNPJ) ou também pelo pente fino sobre o dinheiro que pinga na conta de cada um (no CPF)?

As pessoas que operam neste mundo têm antipatia ideológica com Lula. Poucos vão confessar. Sempre justificam as análises a partir de dados públicos, de juros da dívida e saúde financeira do Estado. Mas não se viu tanto estresse e aversão a Jair Bolsonaro (PL) quando ele e o Congresso, que se diz fiscalista, aprovaram um pacote eleitoral estimado em R$ 273 bilhões em 2022. Vou repetir, R$ 273 bilhões de dinheiro público sendo gasto por quem prometeu diminuir a presença do estado na sociedade.

A pesquisa Quaest divulgada na esteira do anúncio de corte de gastos corrobora essa percepção, 90% das pessoas do “mercado” desaprovam a gestão de Lula. Por isso torcem para que o petista parta dessa para uma melhor. Em 2016, quando a Lava Jato chegou em Lula, o movimento foi igual, de celebração na Faria Lima.

O fato é: hoje não se sabe se Lula será o candidato, a especulação financeira se deu ao considerar que a piora da saúde do presidente é um fato objetivo que afasta as demais possibilidades ou pensamentos de um quarto mandato. Esses operadores agem com dados frios, mas também sob efeito de especulação, possibilidades imaginadas, cenários abstratos, etc.

O problema não é só o nariz torcido desses agentes, o governo Lula errou ao comunicar mal suas medidas econômicas. Em entrevista ao Valor Econômico, a ministra da Gestão e Inovação em Serviços Públicos, Esther Dweck, reconheceu a bagunça ao não explicar de forma detalhada o pacote fiscal nem deixar claro por que algumas das medidas estudadas foram descartadas.

Quem opera na bolsa é muito bem informado sobre política, legislação e contas públicas. E sabe quando botar as mangas de fora ou passar pano, ainda que isso custe algum dinheiro.

Os bancos, corretoras e investidores são parte da economia, junto da indústria, do governo e seus gastos, isenções e programas, do comércio, do agro, do trabalhador CLT e do que faz bico ou empreende. Todos interligados com maior ou menor interação entre si, cabendo ao governo se atentar a essa dinâmica e implementar o programa que ofereceu à população para se eleger. Desses segmentos todos, o único legitimado pelo voto para estabelecer suas políticas públicas é o governo.

O “mercado” não é desprezível e seria um erro fazê-lo. Suas operações e seu humor reverberam no dólar, na dívida pública, inflação e juros e o ônus volta para o governo e a população. Uma comunicação eficiente com esses operadores é basilar, e isso é diferente de ser submisso. E precede a comunicação a organização política de projetos e estratégias de anúncio. Há um norte para o governo Lula, mas também muito embate e embaralho nas decisões que acontecem no meio do caminho. Parte do problema vem daí.

Antes de encerrar, lembro de um relato feito pela jornalista Cristiana Lobo na GloboNews, na transição Temer-Bolsonaro, em 2018. Ela revelou que o futuro ministro da Economia, Paulo Guedes, se reuniu com senadores para discutir o Orçamento de 2019. Mas ele não se interessou dizendo que só faria o Orçamento daquele ano ao tomar posse.

A ignorância latente sobre uma lei básica da gestão pública foi rebatida pelo presidente do Senado, Eunício Oliveira (MDB-CE), que explicou que o Orçamento de 2019 seria aquele mesmo, votado em 2018. Mas o episódio não foi suficiente para o “mercado” chiar. Talvez, por isso mesmo, tenha havido tanta simpatia pela dupla BolsoGuedes e um caminho livre para o Congresso abocanhar fatias bilionárias do Orçamento em forma de emendas secretas.

Este texto foi publicado originalmente na newsletter semanal Peneira Política, assinada por Guilherme Mazieiro.

Fonte: Guilherme Mazieiro Guilherme Mazieiro é repórter e cobre política em Brasília (DF). Já trabalhou nas redações de O Estado de S. Paulo, EPTV/Globo Campinas, UOL e The Intercept Brasil. Formado em jornalismo na Puc-Campinas, com especialização em Gestão Pública e Governo na Unicamp. As opiniões do colunista não representam a visão do Terra. 
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