Pacheco e Lira têm futuro incerto, mas com poucas chances de ficarem esquecidos
Com troca de comando no Senado e Câmara, os dois mandatários fogem à regra e têm um horizonte de oportunidades.
Um receio comum àqueles que saem das presidências da Câmara e do Senado é o ostracismo, a perda de relevância política. Esse é o caminho que a grande maioria dos ex-presidentes tomou. Houve até quem deixou o plenário cassado e dali seguiu para cadeia, como Eduardo Cunha. Ocorre que, fugindo ao que quase virou uma regra, o horizonte para o senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG) e para o deputado Arthur Lira (PP-AL) é de águas bem mais calmas.
Ambos são especulados e cotados como possíveis ministros de Lula (PT). O petista planeja fazer uma reforma ministerial para acomodar a nova composição de forças no Congresso e garantir mais condições de governabilidade.
Na última quinta, 30, Lula foi questionado durante uma entrevista coletiva a jornalistas sobre os dois nomes: “Eu não posso dizer quem é que vai ser [ministro], gente. Se pudesse eu falar, eu falaria. Mas eu quero que o Pacheco seja governador de Minas Gerais. É isso que eu quero", declarou.
Pelas contas que Lula faz, o ideal é que apenas fique nos ministérios aqueles que não precisarão se desvincular do cargo para buscar uma nova eleição em 2026. Esse é o caso, por exemplo, dos ministros que são senadores licenciados e têm mandato até 2030 e de ministros que não costumam demonstrar ambições eleitorais.
Nesse cenário, Pacheco pode não ser um novo ministro. Mas já está credenciado por Lula como peça fundamental para ter um palanque no segundo maior colégio eleitoral do país. Aliados apostam que ele almeja uma cadeira no STF, o que parece um sonho mais distante no atual cenário.
Antes da fala de Lula, em novembro de 2024, Pacheco havia dito em entrevista ao programa do senador Jorge Kajuru (PSB-GO) que não tem ambição imediata de concorrer a algum cargo.
“A decisão do futuro político eu me permito fazer quando terminar meu mandato na Presidência do Senado. A decisão de não ser candidato é uma decisão que pertence a mim. Mas não é algo que hoje eu tenho em mente. De fato, hoje eu tenho uma tendência muito mais forte em encerrar minha vida pública em 2027, do que ser candidato em 2026” disse o presidente do Senado.
Ainda que não tenha se decidido - ou pelo menos não traga isso a público - Pacheco sabe que carrega consigo um capital político valioso. Pode ter sido apontado por alguns senadores como inerte ou extremamente burocrático ao emitir notas em momentos de crise, mas sai sem rusgas com a maioria dos parlamentares.
Pacheco junto com Lira conduziu votações históricas como a reforma tributária. Ainda que o saldo seja positivo, Pacheco levará consigo a marca de ter sido o presidente que se opôs à abertura da CPI da Covid.
A investigação foi aberta por determinação do STF. Pacheco disse, à época, a decisão era "equivocada" e gera "precedentes inadequados". "A CPI pode antecipar o cenário eleitoral de 2022", afirmou.
"CPI de pandemia, neste momento, nessa quadra histórica do Brasil, com a gravidade da pandemia que nos exige união, vai ser um ponto fora da curva", insistiu o senador. "E, para além de um ponto fora da curva, pode ser um coroamento do insucesso nacional do enfrentamento da pandemia”, disse em 19 de abril de 2021. Naquele dia, morreram 3.647 pessoas, o país vivia um dos piores momentos da pandemia e se aproximava de 350 mil mortes.
De suporte a Bolsonaro a flerte com Lula
Do outro lado do Congresso, Lira também é cotado para ser ministro. A vaga comentada entre parlamentares é a da Agricultura, ocupada por Carlos Fávaro (PSD-MT). Lula, assim como no caso de Pacheco, desconversou. Lira disse que não tem convite e não foi procurado para tratar do assunto.
Na visão de alguns governistas, a ida de Lira à Esplanada, poderia ajudar na relação com o agronegócio, grupo mais alinhado à oposição bolsonarista, tiraria de cena um possível articulador com capacidade de trazer dificuldades para o governo no Congresso.
De trato duro, mas cumpridor de palavra, Lira não poupou críticas ao governo Lula, às investigações da Polícia Federal e indiretas ao STF. O ministro responsável pela articulação política, Alexandre Padilha, é considerado um desafeto pessoal pelo alagoano. Ainda que sob uma batuta bruta, Lira levará no currículo a aprovação da reforma tributária, que mesmo com muita articulação e negociação para avançar, teve que ir a voto no plenário levada à unha pelo alagoano.
Além disso, se orgulha de ter comandado a votação de outras reformas como a independência do Banco Central e projetos para amenizar a pandemia de Covid. O deputado não botou pautas bomba para votar, mas negociou duramente os interesses da Casa (espaços e recursos) junto aos dois governos, Lula e Bolsonaro. Foi da coligação de Bolsonaro em 2022, e também o primeiro a reconhecer a vitória de Lula naquela eleição. Em resumo, se considera alguém que sempre deu conforto aos presidentes.
A condução dura de Lira foi sentida, entre outros parlamentares, pelo seu antecessor, Rodrigo Maia, que comandou a Casa entre 2016 e 2021.
Maia foi levado ao esquecimento assim que voltou ao “chão do plenário”. O alagoano vetou a indicação do rival à vice-liderança da oposição, em 2021, sob o argumento de que Maia estava sem partido e precisaria estar filiado a alguma sigla que fosse de oposição ao então governo Bolsonaro para ocupar o cargo. Sem atuação efetiva até o fim do mandato, Maia, que presidiu a Casa entre 2016 e 2021, preferiu não concorrer em 2022.
Outro nome que sentiu o isolamento de Lira foi um ex-bolsonarista de destaque, o deputado Delegado Waldir (à época no PSL de Goiás). Em novembro de 2021, em entrevista ao The Intercept Brasil, ele disparou contra Lira dizendo que sua eleição à Presidência tinha se pavimentado à base de negociações com o “orçamento secreto”, do qual Lira prometia R$ 10 milhões em emendas em troca de apoio. À época, Lira não se manifestou.
Agora que volta ao “chão do plenário” é Lira. Mas diferentemente de Maia, fez seu sucessor, Hugo Motta (Republicanos-PB) e se sente confortável em ser “só mais um” deputado entre 513. Ele relata a amigos que sente falta de ter mais tempo com a família e poder desacelerar um pouco do ritmo frenético de mais de 15 horas de trabalho por dia ao longo dos últimos quatro anos.
Com enorme conhecimento técnico sobre o fluxo de emendas e pagamentos do governo, Lira soube usar seu poder para irrigar suas bases em Alagoas. Mas mesmo assim, desconversa sobre a possibilidade de disputar o Senado em 2026 contra o arquirrival, Renan Calheiros (MDB-AL).