K-pop: como funciona a multimilionária indústria de ídolos da Coreia do Sul
A chamada 'onda coreana' lota shows em diversos países do mundo, inclusive no Brasil, e injetou cerca de R$ 70 bilhões na economia do país.
Você sabe quem são esses setes rapazes que aparecem na foto?
Se você está pensando "Claro... são os integrantes do BTS!" e está prestes a dizer o nome de cada um, vai gostar de saber que fomos explorar o mundo deles.
Agora, se esses rostos e essas três letras não significam nada para você, fique sabendo que eles são parte de um fenômeno difícil de ignorar, conhecido como a "onda coreana", que está se transformando em um tsunami.
Para os não iniciados, apenas duas palavras: Gangnam Style.
O clipe da música Gangnam Style, do cantor sul-coreano PSY, foi o vídeo mais visto no YouTube do fim de 2012 até meados de 2017. E é apenas um dos elos de uma cadeia de sucessos que o K-pop tem acumulado em várias partes do mundo, da China ao Chile, da Ucrânia ao Brasil.
Mas a "onda coreana" não é apenas musical. As séries de televisão, conhecidas como K-dramas, também estão se expandindo mundo afora.
Qual será o segredo do sucesso?
Com o intuito de criar um guia de K-pop para iniciantes, procuramos Stacy Nam, uma americana-coreana que trabalha em Seul, com marketing internacional e relações públicas para a indústria da música.
"Eu ajudo os estrangeiros a se apaixonarem por artistas do K-pop e gastarem todo o seu dinheiro", diz ela, rindo.
"Algumas das maiores bandas atualmente são: BTS, claro, e EXO, que é um grupo da agência de entretenimento SM Entertainment. SM são as iniciais de Soo-Man, sobrenome do fundador, que era cantor antes de abrir sua própria agência. "
"Os nomes de muitas das principais agências na Coreia são as iniciais da pessoa que a fundou, como YG Entretainment e JYP Entretainment, ambas também de ex-cantores", explica.
Essas três empresas dominam a indústria. Embora isso não signifique que as outras não tenham chance. A agência do grupo BTS, por exemplo, é pequena e ainda conseguiu chegar ao topo da lista de sucessos nos Estados Unidos.
Qual o papel dessas empresas?
Segundo Nam, a indústria de entretenimento na Coreia do Sul é muito diferente da americana.
"Tomemos como exemplo alguém como Justin Bieber. Alguém o viu no YouTube, reconheceu seu talento e disse: 'quero fazer dele uma estrela'. Dali, foram para o estúdio. Ele não recebeu muito treinamento antes de lançar um álbum."
"No K-pop, se os candidatos são selecionados por uma empresa, ela cuida de tudo. Se você precisa de algum tipo de retoque - como melhorar os dentes, a pele ou até mesmo fazer uma cirurgia plástica - a empresa paga".
Além disso, as agências oferecem aulas de dança e teatro, ensinam como falar em programas de variedades e pagam cursos de idiomas.
"No momento em que os integrantes das bandas, que são chamados de ídolos, estreiam diante do público, um deles saberá falar inglês, outro chinês, outro japonês ...".
Em resumo, eles são treinados para fazer sucesso no mercado internacional.
"Quando eles estreiam, as empresas já investiram uma grande quantia de dinheiro para transformá-los no que são", conta Nam.
Antes e depois
A imagem é tão importante quanto a música... talvez mais. Isso significa que a idade não é apenas um número. Se você deseja ser um ídolo, deve ter entre 15 e 20 anos de idade.
Eles podem começar jovens, mas vão passar até nove anos se formando antes de finalmente serem apresentados ao público.
Durante esse período, espera-se que eles trabalhem por longas horas - em geral, morando em alojamentos oferecidos pela empresa.
Ah! E ter namorados ou namoradas? Claro que não... altamente contraindicado.
Uma imagem perfeita, um estilo de vida ditado pelos outros, uma vida privada restrita... será que é demais?
"Uma vez que você entra na empresa, você tem que provar seu valor e tem que vender. Se é isso que o público exige - um determinado corpo, um certo rosto - você deve fazê-lo", conta à BBC Kim Ye-seul, um aspirante a ídolo.
"Parece que, se você for selecionado, de alguma forma você se tornará propriedade da empresa para a qual você trabalha", sinalizamos para ele.
"Eu concordo com você. Mas não me meti nessa sem saber. Poucas pessoas entram nisso sem estarem cientes das circunstâncias, então eu acho que é algo que você tem que aceitar", respondeu.
Dado o espírito de submissão, talvez não seja surpreendente que a indústria do entretenimento na Coreia do Sul tenha recebido uma quantidade razoável de acusações de abuso.
Uma de suas estrelas cometeu suicídio, deixando para trás uma carta dizendo que seu agente a forçou a fazer sexo com mais de 20 VIPs.
E a arte?
Essas histórias não são suficientes para desencorajar milhares de aspirantes a artistas, nem seus pais. É o caso da família de Kim Ye-seul, que gasta até US$ 500 (cerca de R$ 2 mil) por mês em escolas de ídolos: estabelecimentos que preparam jovens que desejam ser selecionados pelas agências, que vão então treiná-los.
"Há muitas em Seul", conta Lee Sol-lim, diretor da escola frequentada por Kim Ye-seul.
"A indústria de ídolos da Coreia tem 20 anos e há muitas escolas que fazem coisas semelhantes. Agora, até as universidades estão abrindo cursos que ensinam como se tornar um ídolo. A indústria continuará crescendo", diz ele.
Muitas pessoas consideram que a música é essencialmente uma forma de arte, mas nesta indústria parece basicamente um negócio. É justo dizer que o K-pop é, antes de mais nada, um negócio?
"A música ídolo aqui é dominante, e nós a levamos a sério. A música ídolo é uma indústria musical planejada. É um negócio que envolve muita produção, muitas pessoas, então o que sucede é inevitável", responde.
Sucesso orgânico
O K-pop, na verdade, não é uma música de estilo coreano. Se parece mais com o pop britânico ou americano.
Kyunghee Hannah Choi trabalha para a Fundação Coreana para o Intercâmbio Cultural Internacional, que é financiada pelo Ministério da Cultura, Esporte e Turismo da Coreia do Sul.
Para ela, o apelo global do K-pop se deve à mistura da familiaridade com algo novo, e o sucesso da cultura pop sul-coreana como exportação tem sido orgânico, com o governo agindo apenas como um facilitador.
"Dizem que a 'onda coreana' é um sucesso sem design porque ninguém definiu o tipo de estratégia. O governo simplesmente tentou tornar o mercado estável, desenvolvendo políticas mais favoráveis ao mercado e esse tipo de coisa."
A organização em que Hannah Choi trabalha é responsável por contabilizar os rendimentos da "onda coreana", e os resultados mais recentes estão em um livro bem grosso.
"No ano passado, a 'onda coreana' contribuiu com cerca de 18 trilhões de wons para a economia coreana". São cerca de US$ 18 bilhões (o equivalente a cerca de R$ 70 bilhões), "4% a mais que no ano anterior", ela ressalta.