O que pensa Kamala sobre temas como aborto e migração
Desde anúncio de desistência de Biden, vice-presidente é cotada para substituí-lo; democratas esperam que a nova candidata seja capaz de despertar uma nova energia na campanha, com defesa de temas como direito ao aborto.O Partido Democrata tem quatro semanas para escolher uma nova chapa e começar do zero uma campanha presidencial contra o ex-presidente Donald Trump. O republicano surfa na popularidade pós-convenção nacional do seu partido, encerrada em 18 de julho, quando aceitou a nomeação para a candidatura e discursou pela primeira vez após sair ferido de uma tentativa de assassinato.
A convenção democrata começa em 19 de agosto, um mês depois da republicana, e o partido considera a possibilidade de um processo de indicação competitivo. Mas desde que o presidente Joe Biden jogou a toalha de sua candidatura, o nome da vice, Kamala Harris, desponta como a escolha natural para participar do pleito, que acontecerá em 5 de novembro. A indicação tem o apoio do presidente e de medalhões do Partido Democrata.
Nas 24 horas após o anúncio da saída de Biden da corrida presidencial, neste domingo (21/07), os democratas conseguiram 81 milhões de dólares (aproximadamente R$ 451 milhões) em doações. O valor se refere ao "dinheiro arrecadado pela campanha, pelo Comitê Nacional Democrata e pelos comitês conjuntos de arrecadação de fundos", informou a organização da campanha. É o maior volume diário de doações ao partido desde a eleição de 2020.
Mas o grosso do dinheiro para promover a candidatura democrata já estava nas contas do comitê de campanha Biden-Harris: 91 milhões de dólares. Esse montante pertence à chapa Biden-Harris, que são as únicas pessoas que podem acessá-lo. Portanto, se Harris for oficialmente nomeada, sua nova chapa teria acesso imediato ao montante em caixa, o que representa uma vantagem em relação a possíveis outros concorrentes dentro do partido, que teriam de iniciar do zero a arrecadação de fundos para campanha.
Harris precisa ganhar a indicação democrata antes da eleição geral
Como Harris ainda não é a candidata oficial, ela precisa conquistar a maioria dos votos dos delegados na Convenção Nacional Democrata, que será realizada de 19 a 22 de agosto na cidade de Chicago, no Meio-Oeste americano.
"Neste momento, ela precisa [fazer] uma campanha dupla", diz Stormy-Annika Mildner, diretora-executiva do Aspen Institute Germany, um think tank com sede em Berlim. Harris tem que "unir os democratas para que eles a apoiem e, de olho nas eleições de novembro, também falar com o povo [americano] e conquistá-lo para sua campanha".
Além de ser a única candidata que teria permissão para usar os milhões de dólares em doações já coletados pela campanha de Biden, ela, como vice-presidente, é mais conhecida em todo o país do que alguns outros que foram mencionados como candidatos em potencial.
Mas há também fatores que não falam a seu favor. "Um dos grandes pontos fracos é que seus índices de popularidade não são muito melhores do que os de Biden", diz Mildner.
Outro fator é que ela foi encarregada de lidar com a crise da fronteira e conter a imigração em massa da América Central e da América Latina e foi criticada pelos oponentes por não estar à altura do trabalho.
Biden encarregou Harris em 2021 de liderar uma campanha diplomática do governo para abordar as "causas básicas" da migração da Guatemala, Honduras e El Salvador, principais origens de imigrantes em situação irregular.
O trabalho de Harris era o de tentar atrair investimentos de empresas para a América Central e promover a democracia e o desenvolvimento por meio da diplomacia, estratégias consideradas de longo prazo, sem efeito imediato.
Harris poderia vencer Trump?
"Como vemos em algumas das primeiras pesquisas que a colocam diretamente contra Donald Trump, ela pelo menos se iguala a ele ou o vence por dois a três pontos percentuais", observa Cathryn Clüver Ashbrook, especialista da Fundação Bertelsmann. "Ainda não há muito o que fazer, mas pelo menos essas pesquisas parecem estáveis [ao mostrar] que ela pode enfrentar Donald Trump. E ela tem um enorme potencial para fazer mais nos próximos 107 dias."
Os democratas esperam que a nova candidata seja capaz de despertar uma nova energia na campanha. Seus defensores acham que Harris pode fazer isso. A ideia é que ela possa entusiasmar pessoas que talvez não fossem às urnas com Biden como candidato: jovens, mulheres e pessoas de cor.
Um fator em particular poderia ajudar Harris com as eleitoras: desde que a Suprema Corte, de maioria conservadora, revogou o direito constitucional ao aborto, Harris tem se manifestado repetidamente contra o veredito. Ela "foi uma das principais vozes na defesa do direito de escolha da mulher", diz Ashbrook. "E ela tem sido extremamente vocal e bem-sucedida nessa questão na campanha."
Qual é a posição de Harris em relação à Otan, Ucrânia e Israel?
No campo da política externa, Harris ainda não teve muita exposição, observa Ashbrook. No entanto, a vice-presidente deixou bem claro na Conferência de Segurança de Munique em 2024 e 2023 que valoriza muito a participação dos EUA na Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte), algo que Trump não endossa.
"Ela [também] vê claramente o valor das alianças dos EUA no Indo-Pacífico", diz Ashbrook. "E, é claro, o fato de ela ter uma herança indiana será bem recebido por certas partes da aliança do Indo-Pacífico."
Analisando a guerra em curso na Ucrânia, Harris acredita, assim como Biden, que o governo em Kiev precisa ser apoiado. É claro que, como presidente, ela teria que trabalhar com o Congresso para aprovar pacotes de ajuda financeira e militar, mas é provável que ela faça pressão por essa ajuda, assim como Biden fez, porque "ela vê a Rússia como uma grande ameaça", diz Milder.
A questão de qual seria a posição dos EUA em relação ao conflito em Gaza com uma possível presidente Harris atrai atenção especial porque o firme apoio de Biden a Israel foi um ponto de crítica entre os jovens eleitores, os árabe-americanos em particular.
"Acho que ela tem sido um pouco mais compreensiva com os palestinos e criticou com mais veemência a catástrofe humanitária na Palestina", diz Mildner. "Portanto, posso ver que talvez o tom mude um pouco. Mas o apoio a Israel: isso não vai mudar."