Miranda diz que mostrou a Bolsonaro nota fiscal da Covaxin
Deputado prestou depoimento à PF em inquérito que investiga se presidente prevaricou no caso da compra de vacina indiana
Em depoimento à Polícia Federal, o deputado Luis Miranda (DEM-DF) afirmou que ele e seu irmão, o servidor do Ministério da Saúde, Luis Ricardo Miranda, levaram uma invoice (nota fiscal internacional) da compra da vacina indiana Covaxin, com irregularidades, ao presidente Jair Bolsonaro no encontro de 20 de março. Segundo ele, a reunião durou cerca de 40 minutos.
Luis Miranda relatou que, antes do depoimento, pediu ao irmão que imprimisse os documentos que ele havia mostrado a Bolsonaro para ele levar à PF. Na lista apresentada pelo deputado à Polícia Federal, estavam cópias da nota fiscal em nome da empresa Madison Biotech, da ação civil pública do Ministério Público Federal contra a Global Saúde, do contrato de compra da Covaxin, e de uma reportagem do Estadão sobre a dívida de R$ 20 milhões da Global com o Ministério da Saúde.
O parlamentar mostrou os documentos ao delegado, que o interrompeu e perguntou se a invoice constava do material apresentado a Bolsonaro. O deputado confirmou ao policial federal que a nota fiscal estava dentre os documentos.
"Esse aqui é o kit de documentos que o meu irmão levou para o presidente", disse o parlamentar.
"Isso foi apresentado ao presidente?", perguntou o policial federal se referindo à invoice.
"Foi apresentado ao presidente", confirmou Luis Miranda.
"A invoice?", questionou o delegado.
"Isso aqui foi apresentado ao presidente", respondeu o deputado, mostrando a invoice para o delegado e para a câmera que filmava o depoimento.
O deputado declarou à PF que Bolsonaro não "esmiuçou" a invoice. Luis Miranda disse que seu irmão explicou ao presidente "qual era a preocupação" sobre o documento.
"Preocupação dele estar pagando uma empresa terceira que não consta no contrato. 'Isso para mim já é algo assim que eu não consigo compreender o porquê estamos fazendo isso, o ministério está fazendo isso, presidente, então, acho que o senhor deveria se atentar a isso, principalmente isso. O quantitativo está diferente do contrato, o contrato são 4 milhões, eles querem entregar 3 milhões'."
De acordo com o parlamentar, o irmão disse a Bolsonaro que sua grande preocupação era com o histórico da empresa. "Minha maior preocupação, presidente, não é isso (irregularidades na invoice). Isso se ajusta, faz aditivo no contrato e tudo. É exatamente o histórico da empresa."
Luís Miranda prestou depoimento à PF na semana passada, no âmbito do inquérito que investiga Bolsonaro por prevaricação. O presidente teria dito aos irmãos que acionaria a PF, após ser informado das irregularidades, mas não comunicou as suspeitas a órgãos de investigação.
O Ministério da Saúde fechou a compra de 20 milhões de doses da Covaxin por R$ 1,6 bilhão, em fevereiro deste ano. Em depoimento à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid, no Senado, em junho, Luis Ricardo Miranda contou que a invoice com irregularidades chegou ao Ministério da Saúde em um link Dropbox no dia 18 de março. Arquivos enviados por este tipo de serviço de armazenamento expiram após um período e o link para de funcionar.
A data de 18 de março é contestada pela Precisa Medicamentos, que negociou a vacina com o governo brasileiro. Também à CPI, a diretora da empresa, Emanuela Medrades, afirmou que a nota fiscal foi encaminhada à Saúde apenas em 22 de março. Medrades desafiou Luis Ricardo a provar que ela tenha enviado a invoice em 18 de março.
A data do recebimento da nota fiscal é importante para as investigações sobre suposta prevaricação do presidente Jair Bolsonaro. A tese dos senadores governistas na CPI é de que, se não houve envio da invoice em 18 de março, o presidente não poderia ter sido avisado sobre as inconsistências na nota fiscal no encontro com os irmãos Miranda no dia 20. A acusação de prevaricação não se sustentaria.
A Precisa Medicamentos representou a farmacêutica indiana Bharat Biotech, produtora da Covaxin, no contrato firmado com o Ministério da Saúde. O acordo entre Precisa e Bharat foi rompido pela farmacêutica indiana, no mês passado, após suspeitas de falsificação de documentos entregues pela empresa brasileira ao Ministério da Saúde.
As doses de Covaxin nunca foram entregues ao Brasil e o cancelamento do contrato foi encaminhado pela Saúde, em meio a suspeitas de corrupção. A compra é investigada pela Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid, no Senado, pela Polícia Federal, pelo Ministério Público Federal e pelo Tribunal de Contas da União (TCU).
Deputado presta depoimento à PF: