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A possível ordem de prisão internacional de Netanyahu que causa alarme no governo de Israel

Líderes israelenses estão sendo investigados por supostamente terem cometido crimes de guerra nos territórios palestinos — mas os líderes do Hamas também podem ser afetados.

3 mai 2024 - 11h57
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Benjamin Netanyahu poderia estar entre as autoridades incluídas nos mandados de prisão do Tribunal Penal Internacional
Benjamin Netanyahu poderia estar entre as autoridades incluídas nos mandados de prisão do Tribunal Penal Internacional
Foto: Getty Images / BBC News Brasil

As autoridades israelenses estão cada vez mais preocupadas diante da possibilidade de o Tribunal Penal Internacional (TPI) emitir mandados de prisão contra seus líderes militares e políticos por suspeita de crimes de guerra.

Alguns relatos sugerem que o primeiro-ministro, Benjamin Netanyahu, poderia estar entre eles.

O tribunal, com sede em Haia, tem investigado as ações de Israel nos territórios ocupados ao longo dos últimos três anos — e, mais recentemente, as ações do Hamas também. Ele tem o poder de acusar e julgar indivíduos pelos crimes mais graves no âmbito do Direito Internacional.

No passado, já emitiu mandados de prisão contra líderes como Vladimir Putin, da Rússia, Muammar Gaddafi, da Líbia, e o guerrilheiro Joseph Kony, de Uganda.

Netanyahu classificou a perspectiva de figuras importantes de Israel entrarem na lista de procurados do TPI como "um ultraje de proporções históricas", acusando o tribunal de tentar paralisar a capacidade do seu país de se defender.

Mas o fato de ele ter optado por fazer comentários públicos tão ferrenhos sobre este assunto sugere que, nos bastidores, tal cenário está sendo discutido ativamente.

Israel não reconhece a jurisdição do Tribunal Penal Internacional
Israel não reconhece a jurisdição do Tribunal Penal Internacional
Foto: Getty Images / BBC News Brasil

Embora o TPI não tenha confirmado nada, quando o procurador-chefe do tribunal, Karim Khan, visitou Israel e a Cisjordânia ocupada em dezembro do ano passado, sua mensagem foi clara.

O advogado britânico visitou os locais dos ataques do Hamas em vilarejos israelenses perto da cerca na fronteira com Gaza, pela qual homens armados liderados pelo Hamas irromperam no dia 7 de outubro.

Também se encontrou com líderes políticos, e viajou para Ramallah para conversar com as famílias das vítimas palestinas sobre suas experiências em Gaza e na Cisjordânia.

Ele condenou a violência sofrida por civis de ambos os lados, e prometeu investigar os incidentes.

"Todos os protagonistas devem cumprir o direito humanitário internacional", esclareceu, em um comunicado na época.

"Se não fizerem isso, não reclamem quando meu escritório for obrigado a agir."

Khan disse que os ataques de 7 de outubro — em que homens armados liderados pelo Hamas mataram cerca de 1,2 mil pessoas, a maioria civis, e fizeram 253 reféns, segundo cálculos israelenses — representaram "alguns dos crimes internacionais mais graves que chocam a consciência da humanidade, crimes que o TPI foi criado para lidar".

No caso de Israel, ele enfatizou a obrigação de conduzir sua operação militar em Gaza de acordo com "parâmetros legais claros que regem o conflito armado".

Israel foi acusado de não ter protegido suficientemente os civis durante seus bombardeios em Gaza, embora insista que toma todas as medidas necessárias para evitar vítimas.

O Ministério da Saúde do território palestino, administrado pelo Hamas, afirma que mais de 34.500 pessoas foram mortas lá desde o início da guerra, e que muitas eram crianças.

Khan também destacou a necessidade de a ajuda humanitária chegar a Gaza, sendo o acesso a alimentos, água e suprimentos médicos um direito básico para os civis "sem mais demora, e com ritmo e escala".

Também instou o Hamas a não desviar ou usar indevidamente os suprimentos quando eles chegassem, após acusações de Israel de que os membros do grupo estavam saqueando caminhões e roubando ajuda, impedindo-a de chegar à população em geral.

Mais de 30 mil pessoas morreram no conflito em Gaza, que começou em outubro do ano passado
Mais de 30 mil pessoas morreram no conflito em Gaza, que começou em outubro do ano passado
Foto: Getty Images / BBC News Brasil

Israel não é membro do TPI, e afirma que o tribunal não tem jurisdição sobre o país. Mas o tribunal decidiu que desde 2015 tem jurisdição sobre a Cisjordânia, Jerusalém Oriental e Gaza, depois de os palestinos terem ratificado o tratado de fundação do TPI, o Estatuto de Roma, como Estado da Palestina.

Nenhuma democracia no estilo ocidental teve até agora um mandado de prisão emitido pelo TPI contra algum de seus líderes. Se isso acontecer com Netanyahu, ele será o primeiro.

Os israelenses têm uma preocupação particular em relação ao estigma e ao potencial isolamento que isso acarretaria.

Michael Oren foi embaixador de Israel nos Estados Unidos entre 2009 e 2013. Em entrevista à BBC, ele aponta para o recente processo aberto pela África do Sul na Corte Internacional de Justiça (CIJ), que acusou Israel de genocídio contra a população palestina em Gaza — acusação que Israel nega veementemente.

Em janeiro, o tribunal emitiu uma decisão provisória determinando que Israel tomasse medidas para prevenir atos genocidas em Gaza, mas não chegou a pedir para que o país interrompesse sua ofensiva militar.

"Israel saiu relativamente ileso desse processo, mas o fato de o processo ter sido aberto significava que Israel havia perdido a batalha", disse ele à BBC.

"Eles sequer deveriam ter sido abertos, e certamente é um golpe para a nossa posição internacional e para a nossa segurança. Porque um país cujos líderes são acusados de crimes de guerra, é mais vulnerável."

O TPI também advertiu Israel por supostamente não permitir que a ajuda humanitária chegasse a Gaza
O TPI também advertiu Israel por supostamente não permitir que a ajuda humanitária chegasse a Gaza
Foto: Getty Images / BBC News Brasil

Geoffrey Nice, outro advogado britânico, liderou o processo contra o ex-presidente sérvio Slobodan Milosevic por crimes de guerra no Tribunal Penal Internacional para a ex-Iugoslávia (TPII).

Ele ressalta que as ações de ambos os lados neste conflito estão no foco do TPI.

"Qualquer investigação não será apenas das Forças de Defesa de Israel (IDF, na sigla em inglês) e da liderança política e militar, mas também do Hamas", disse ele à BBC.

Ele também abordou as insinuações de que o TPI poderia sofrer pressão política para reconsiderar sua tomada de decisão.

"Os governos de todo o mundo, especialmente os governos grandes e poderosos, estão aí para proteger os interesses dos seus países."

"Então, se eles veem um julgamento ou uma investigação se aproximando... isso poderia causar grandes danos à reputação deles como país, e se eles considerarem que podem interferir no julgamento ou nos processos de investigação para poupá-los desse dano à reputação, então eles vão fazer isso, porque estão agindo no interesse do seu país."

O prazo para a emissão de mandados pode variar — às vezes, pode levar semanas ou até meses, entre o momento em que o procurador do TPI solicita o mandado, e os juízes o concedem.

Muitas vezes, os detalhes podem ser mantidos confidenciais, se for considerado que torná-los públicos diminuiria a perspectiva de uma prisão.

Uma medida assim contra Netanyahu, seus aliados políticos ou comandantes militares israelenses também teria implicações práticas.

Por exemplo, afetaria bastante sua capacidade de viajar, uma vez que os países signatários do Estatuto de Roma são obrigados a entregar indivíduos com mandados de prisão contra eles. Mas algumas destas nações ignoraram os mandados do TPI nos últimos anos.

O ex-embaixador israelense Michael Oren acredita, no entanto, que o possível impacto acabaria sendo muito mais amplo — e mudaria a narrativa da sociedade israelense.

"Em geral, [a sociedade israelense] responde ao amor. Não responde à agressão. Se você quiser obter concessões dos israelenses, não bata na cabeça deles, abrace-os", diz ele.

"Todas estas medidas tendem a mover o pêndulo da política neste país para a direita, e não para o outro lado. Teria um efeito bumerangue e, em vez de abrir caminhos para um possível processo diplomático, provavelmente vai restringi-los."

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