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A Ucrânia aguentaria mais um ano de guerra?

Repórter da BBC visita terceira maior cidade do país para ouvir de soldados e residentes o que pensam sobre a possibilidade de negociação de um cessar-fogo no início de 2025.

30 dez 2024 - 17h07
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Conflito começou em fevereiro de 2022
Conflito começou em fevereiro de 2022
Foto: BBC News Brasil

A Ucrânia está perdendo a batalha. Muitos de seus soldados estão exaustos após três anos de luta. A questão é: o país pode suportar mais um ano de guerra?

As forças ucranianas ainda resistem aos avanços russos no leste, mas estão quase cercadas perto de Kurakhove, cenário de alguns dos combates mais intensos das últimas semanas.

A unidade de morteiros Black Pack está tentando impedir o cerco em torno da cidade. Os russos estão se aproximando por três lados.

Encontramos a equipe em um esconderijo, descansando da luta. Eles não são soldados comuns: incluem um chef vegano, um mecânico, um desenvolvedor web e um artista.

Um grupo de amigos com visões não conformistas. Alguns se autodenominam anarquistas. Todos se voluntariaram para lutar.

Surt, o comandante de 31 anos, se juntou ao exército logo após a invasão em grande escala pela Rússia. Ele me diz que no início achava que a guerra duraria três anos. Agora, está se preparando mentalmente para mais dez anos de luta.

Surt diz que se preocupa com o resultado de quaisquer negociações futuras
Surt diz que se preocupa com o resultado de quaisquer negociações futuras
Foto: BBC News Brasil

Todos eles sabem que Donald Trump quer pôr fim à guerra. O presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, e o presidente russo, Vladimir Putin, indicaram que estão preparados para negociações, mas a ideia de um acordo viável parece difícil de imaginar.

Até agora, são apenas conversas sobre negociações.

Surt não desdenha o objetivo de Trump.

"Ele é uma pessoa bastante ambiciosa e acho que tentará fazer isso", diz. Mas ele se preocupa com o resultado de quaisquer negociações.

"Somos realistas, entendemos que não haverá justiça para a Ucrânia — muitos terão que engolir o fato de que suas casas foram destruídas por foguetes e granadas, que seus entes queridos foram mortos, e isso será difícil."

Quando pergunto se ele prefere negociar ou continuar lutando, Surt responde enfaticamente: "Continuar lutando."

É uma visão compartilhada pela maioria da unidade. Serhiy, o chef vegano, acredita que as negociações apenas congelariam temporariamente a guerra — "e o conflito retornará em um ou dois anos".

Ele admite que a situação atual "não é boa" para a Ucrânia. Mas também está pronto para continuar lutando. Ser morto, ele diz, "é apenas um risco ocupacional".

Davyd, artista e soldado
Davyd, artista e soldado
Foto: BBC News Brasil

Davyd, o artista, avalia que Trump é imprevisível, o que é algo preocupante. "Ele pode ser muito bom ou muito ruim para a Ucrânia", afirma.

A unidade passa uma semana no front e a seguinte descansando. Mas mesmo quando estão fora de combate, eles continuam treinando, porque, dizem, isso os mantém motivados.

Em um campo congelante, eles passam pelos exercícios para disparar seus morteiros. A equipe recentemente se juntou a Denys, que deixou voluntariamente a segurança de sua casa na Alemanha.

"Eu me perguntei: eu poderia viver em um mundo onde a Ucrânia não existisse?", diz.

Ele relutantemente admite que agora o país parece estar perdendo, mas acrescenta: "Se você não tentar, certamente perderá. Pelo menos eu morrerei tentando vencer em vez de apenas deitar e aceitar."

Mas, diferentemente dos outros, Denys acredita que a Ucrânia deveria pelo menos considerar um cessar-fogo. Ele acha que as baixas ucranianas são maiores do que as oficialmente admitidas — mais de 400 mil mortos e feridos.

Mobilizar uma parcela maior da população, ele acredita, não resolveria o problema.

"Eu só acho que muitos dos soldados motivados estão mortos ou muito exaustos — e então para mim não é que queremos um cessar-fogo, mas não podemos continuar por muitos anos mais", completa.

Denys se juntou voluntariamente da Alemanha
Denys se juntou voluntariamente da Alemanha
Foto: BBC News Brasil

Dnipro, a terceira maior cidade da Ucrânia, também reflete essa sensação de cansaço da guerra. É regularmente alvo de mísseis e drones russos.

As sirenes de ataque aéreo tocam intermitentemente, dia e noite. Quando estão em silêncio, os ucranianos tentam encontrar algum senso de normalidade nesses tempos anormais — inclusive indo ao teatro.

Em uma apresentação à tarde de uma peça humorística, chamada The Kaidash Family (A Família Kaidash), ainda há lembretes da guerra — um minuto de silêncio para lembrar os mortos, seguido pelo hino nacional da Ucrânia.

Mas alguns na plateia admitem que também esperam uma trégua mais duradoura.

Ludmyla me diz: "Infelizmente somos em menor número. Estamos recebendo alguma ajuda, mas não é o suficiente — é por isso que temos que sentar e negociar."

Kseniia diz: "Não há uma resposta fácil. Muitos dos nossos soldados foram mortos. Eles lutaram por algo — por nossos territórios. Mas eu quero que a guerra acabe."

Pesquisas de opinião também sugerem que há um apoio crescente para negociações.

Dnipro tenta encontrar alguma normalidade em tempos de guerra
Dnipro tenta encontrar alguma normalidade em tempos de guerra
Foto: BBC News Brasil

Alguns dos apelos mais fortes por um cessar-fogo vêm daqueles que foram forçados a fugir da luta.

Em um abrigo perto do teatro, uma antiga acomodação estudantil, um grupo de quatro mulheres idosas relembram as casas que deixaram para trás.

Valentyna, de 87 anos, diz que elas chegaram sem nada, mas receberam sapatos, roupas e comida. Ela diz que foram bem tratados. "É bom ser bem-recebida, mas é melhor estar em casa."

Valentyna e Mariia deixaram suas casas em território agora controlado pela Rússia
Valentyna e Mariia deixaram suas casas em território agora controlado pela Rússia
Foto: BBC News Brasil

A casa dela agora está em território ocupado pela Rússia. Todas as quatro mulheres querem negociações pela paz. Mas Mariia, 89, diz que não sabe como cada lado será capaz de "olhar nos olhos um do outro depois do inferno que cometeram".

Ela acrescenta: "Já está claro que ninguém vencerá militarmente, é por isso que precisamos de negociações."

Se houver negociações, essas mulheres podem acabar tendo que sacrificar mais — já que a Ucrânia pode ter que abrir mão de territórios pela paz.

Reportagem adicional de Daniel Wittenberg e Anastasiia Levchenko.

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