Nigéria: sem notícias, pais de desaparecidas se desesperam
De acordo com familiares, 234 e não 129 meninas foram sequestradas pelo grupo radical Boko Haram, em 14 de abril
Cerca de 190 meninas permanecem desaparecidas na Nigéria após terem sido sequestradas por militantes islâmicos na semana passada, informou nesta terça-feira sua escola à BBC.
"Por favor, pedimos aos militantes que mostrem piedade e libertem nossas filhas", diz o pai de uma das meninas, em carta entregue ao Serviço Africano da BBC.
O ataque e sequestro ocorreram na noite de 14 de abril, em um internato na cidade de Chibok, no Estado de Borno, noroeste do país.
Os familiares das adolescentes afirmam que o número de estudantes sequestradas é de 234, muito maior do que o divulgado pelo governo local, que falou em 129 adolescentes capturadas. Cerca de 40 delas conseguiram fugir de seus captores, segundo Asabe Kwambura, diretora do colégio onde elas foram sequestradas.
Desde a semana passada, os pais das jovens continuam a busca pelas estudantes, chegando até a entrar em um bosque considerado bastião do temido grupo islâmico radical Boko Haram, apontado como o autor do sequestro.
O grupo, cujo nome significa "a educação ocidental é proibida" na língua local hausa, ataca frequentemente instituições de ensino. Mas o grande sequestro em Chibok não tem precedentes.
"Desde o dia 14 deste mês não vimos nenhuma ação do governo. Só nos falam mentiras. Não queremos que usem força, mas que dialoguem com os militantes para que libertem nossas filhas", disse o pai de outra estudante.
Bashir Sa'ad Abdullahi, jornalista do Serviço Hausa da BBC, afirmou que muitos pais já perderam a esperança de que os militares resgatem suas filhas.
Abdullahi afirmou que acredita-se que "as jovens são mantidas presas em um bosque chamado Sambisa, um terreno muito difícil que é refúgio dos militantes". O Boko Haram não emitiu nenhum comunicado sobre o ataque, mas as autoridades garantem que o grupo é o autor do sequestro.
Ataques do Boko Haram na Nigéria já deixaram 1,5 mil mortos no último ano, segundo a Anistia Internacional.
Buscas
Autoridades locais não explicaram a discrepância entre os números de meninas sequestradas, que não puderam ser verificados de forma independente.
Vários pais das adolescentes sequestradas foram de moto até o bosque de Sambisa, procurando pelas jovens. Folly Teika, cujas filhas Aisha e Hima foram levadas, afirmou que depois de dias de busca chegou a um vilarejo chamado Bale.
"As pessoas ali nos contaram que tinham visto muitas adolescentes recolhendo água em um córrego. Disseram que, com certeza, as jovens estavam em algum lugar próximo, mas nos alertaram para não entrar mais na área se não estivéssemos armados", afirmou Teika à agência de notícias Reuters.
Os extremistas do Boko Haram já foram acusados de usar jovens sequestradas como cozinheiras, carregadoras e escravas sexuais.
'Vi com meus próprios olhos'
Duas mulheres que foram sequestradas em outro incidente pelo grupo e conseguiram escapar contaram como foi o sequestro para o correspondente da BBC na Nigéria Will Ross.
"Me perguntaram se eu era cristã ou muçulmana. Disse que era cristã. Depois de alguns dias trouxeram um homem e disseram que eu tinha que me converter ao islã e me casar com ele", disse uma jovem de 23 anos.
A jovem acrescentou que os muçulmanos que trabalhavam para o governo foram executados e ela foi levada para o bosque de Sambisa, onde a matança continuou.
"Usaram facas para degolar mulheres e homens, especialmente os homens que se negavam a lutar junto com eles. Vi com meus próprios olhos como mataram cerca de 50 pessoas."
Escolas fechadas
Muitos nigerianos estão indignados e não entendem como é possível que centenas de adolescentes possam estar presas há mais de uma semana sem que os militares as encontrem.
Muitas pessoas também se irritaram com o presidente, Goodluck Jonathan, que não interrompeu sua campanha política no dia no sequestro.
O sequestro das estudantes também destacou as deficiências das Forças Armadas na proteção dos civis, apesar do estado de emergência declarado há um ano para conter os insurgentes islâmicos em três estados do noroeste, Borno, Yobe e Adamawa.
Apenas na semana passada o Boko Haram realizou quatro ataques em três dias, incluindo uma explosão em um terminal de ônibus que deixou mais de 70 mortos e mais de 140 feridos.
E o medo gerado pelo grupo insurgente também prejudica o sistema educacional do país. No Estado de Borno, o governo estadual anunciou o fechamento de mais de 85 escolas neste ano.
A insurgência do Boko Haram é vista como a principal ameaça de segurança para a Nigéria, o país mais populoso da África, com 170 milhões de habitantes, e principal produtor de petróleo do continente. O grupo está travando uma campanha sangrenta por um Estado islâmico no norte da Nigéria.
O Boko Haram foi fundado em 2002 na cidade de Maiduguri, pelo clérigo muçulmano Mohammed Yusuf, que também fundou na época um complexo religioso que incluía uma escola islâmica.
O grupo ampliou seus objetivos com uma série de ataques em 2009, mas Yusuf foi morto depois de ser capturado pelo Exército.
O atual líder do grupo, Abubakar Shekau, disse que sua organização "não será vencida pelas forças de segurança".