Alexei Navalny foi assassinado, diz porta-voz; investigação russa descartou morte criminal
Opositor de Vladimir Putin foi declarado morto em circunstâncias misteriosas
"Alexei Navalny foi assassinado", pontuou Kira Yarmish, porta-voz oficial do opositor russo -- que era um forte desafeto do presidente Vladimir Putin --, morto nesta sexta-feira, 16, em circunstâncias misteriosas.
Em publicação nas redes sociais, Yarmish disse que as investigações das autoridades russas já estariam concluídas e que "nada criminal" foi encontrado. Ela duvida desta tese. "Eles mentem todo o tempo, nos fazendo andar em círculos e cobrem seus rastros", escreveu.
Ainda segundo a porta-voz, o corpo de Navalny segue nas mãos de autoridades russas. Apesar dos apelos para que o cadáver fosse entregue para a família, ela informou que os restos mortais do opositor não foram liberados.
Alexey Navalny was murdered. His death occurred on February 16 at 2:17 p.m. local time, according to the official message to Alexey’s mother.
An employee of the colony said that the body of Navalny is now in Salekhard. It was picked up by investigators from the IC. Now they are…
— Кира Ярмыш (@Kira_Yarmysh) February 17, 2024
Only an hour ago, the lawyers were informed that the investigation had been concluded and that something criminal had not been established.
They literally lie every time, driving us around in circles and covering their tracks.
— Кира Ярмыш (@Kira_Yarmysh) February 17, 2024
Quem foi Navalni
Alexei Navalni nasceu em Butin, cidade próxima de Moscou, no dia 4 de junho de 1976. Seu pai era um militar russo e ele se mudou muito ao longo da infância por conta da carreira de seu pai. Em 1997, concluiu a graduação em direito na Universidade Russa da Amizade dos Povos, em Moscou. Em 2001, se formou em economia na Academia de Finanças do governo da Federação Russa.
Ele era casado com Yulia Navalnaia e tem dois filhos, Daria, de 23 anos e Zakhar, de 16 anos. Em 2008, Navalni tornou-se conhecido do público russo pela primeira vez quando denunciou casos de corrupção de diversas empresas russas como Gazprom e Rosneft.
Em 2011, Navalni criou a Fundação Anticorrupção (ACF) — a maior organização pública independente anticorrupção da Rússia e foi uma das lideranças da onda de protestos que denunciava fraude nas eleições parlamentares.
Ele foi condenado em 2013 por peculato e afirmou que a acusação tinha motivação política. Navalni foi sentenciado a cinco anos de prisão, mas o Ministério Público exigiu mais tarde surpreendentemente a sua libertação enquanto se aguardava recurso. Posteriormente, um tribunal superior suspendeu a sua pena.
No mesmo ano, se candidatou à prefeitura de Moscou e obteve 27% dos votos, segundo as autoridades russas. Navalni terminou em segundo lugar, um desempenho impressionante contra o então prefeito que tinha o apoio da máquina política de Putin e era popular na capital russa.
Com o intuito de participar das eleições em 2018, Navalni lançou uma campanha internacional para que eleições livres e justas fossem realizadas na Rússia, mas seus registros eleitorais não foram autorizados.
Ele ficou famoso por usar as redes sociais e interagir com os russos através de seu canal no YouTube. Esta estratégia contribuiu para que Navalni rompesse a barreira dos centros políticos e culturais de Moscou e São Petersburgo.
Envenenamento
Em 2020, quase morreu vítima de um envenenamento enquanto voava da Sibéria para Moscou. Depois de ser atendido em solo russo, ficou internado em Berlim. Os testes feitos na Alemanha identificaram que a presença do agente nervoso da era soviética, Novichok. A descoberta elevou o tom das críticas contra o Kremlin que foi acusado de envenenar o opositor.
Navalni ficou em coma induzido por cerca de duas semanas, depois trabalhou para recuperar a fala e os movimentos por mais algumas semanas. No ano passado, Putin rejeitou uma investigação divulgada por vários meios de comunicação, entre eles o site Bellingcat, a rede CNN e Der Spiegel, a qual atribui a responsabilidade do envenenamento ao FSB, os serviços secretos russos, herdeiros da KGB. De acordo com a investigação, baseada na análise de dados por telefone e de vazamento de informação on-line na Rússia, agentes do FSB, especializados em armas químicas, seguiram o opositor desde 2017.
As autoridades russas afirmaram que durante a estadia de Navalni na Alemanha, ele tinha violado os termos de uma pena suspensa numa das suas condenações por peculato e que seria preso se regressasse ao país. Em 2021, voltou para a Rússia e foi detido.
No dia 26 de dezembro de 2023, ele publicou uma carta de sua nova prisão no Ártico russo. "Eu sou o seu novo Ded Moroz", escreveu Navalni, referindo-se à versão russa do Papai Noel. "Tenho um casaco de pele de carneiro, um chapéu com abas para as orelhas; devo receber botas de feltro em breve e deixei crescer a barba durante o trânsito de 20 dias." Mas, acrescentou, "o principal é que agora vivo acima do Círculo Polar Ártico".
Navalni foi visto em público pela última vez na quinta-feira, 15, quando compareceu a uma audiência judicial por meio de videoconferência. O ativista russo parecia estar de bom humor e pediu ao juiz parte de seu "enorme salário"
"Porque estou ficando sem dinheiro graças às suas decisões", disse Navalny, se referindo às múltiplas multas que lhe foram impostas, de acordo com um vídeo publicado pela Sotavision, um meio de comunicação russo.
Documentário
Um documentário chamado Navalni, que detalhou sua carreira, seu envenenamento quase fatal e seu retorno a Moscou, ganhou o Oscar de melhor documentário em março de 2023.
"Alexei, o mundo não esqueceu a sua mensagem vital para todos nós: não devemos ter medo de nos opor aos ditadores e ao autoritarismo onde quer que ele apareça", disse o diretor David Roher ao aceitar o Oscar.
A esposa de Navalni também falou na cerimônia de premiação. "Meu marido está na prisão só por dizer a verdade. Meu marido está preso apenas por defender a democracia. Alexei, estou sonhando com o dia em que você será livre e nosso país será livre. Fique forte, meu amor".
Veja o trailer:
* Com informações do Estadão Conteúdo, AP e NYT