Americano vende tudo e vai ao Uruguai viver “como Mujica”
Após perder o emprego e enfrentar problemas financeiros nos EUA, o ex-garçom decidiu partir para o país latino-americano ter uma vida "menos consumista"; o processo de 'mujiquização' de James Clymer será tema de documentário
“Minha casa nos Estados Unidos era bastante modesta para o americano médio. Costumava ir ao supermercado todos os dias, mesmo que não comprasse nada. Dirigia diariamente, para me deslocar entre duas cidades. Hoje não tenho carro, ando em mobilete. Comia fast food, agora cozinho o que como.” Assim, James Clymer, ex-garçom de 21 anos, relata ao Terra a transformação gradual pela qual está passando no Uruguai, depois de decidir “aprender a viver como Mujica”.
Seu processo de 'mujiquização', desde a venda dos móveis e da pequena casa que havia começado a comprar na Carolina do Norte, até a chegada ao Uruguai, é o tema de “James, o Mujica Gringo”, documentário de 10 minutos que começou a produzir ao chegar ao país sul-americano.
Clymer viveu uma brusca transformação na vida pessoal com a crise imobiliária que atingiu os Estados Unidos e levou milhares de norte-americanos à falência. Seus pais se separaram em decorrência de problemas financeiros e, para coroar a maré de azar, terminou perdendo o emprego de garçom, depois de tentar socorrer um colega de trabalho que estava se asfixiando. Ele conta que, nos EUA, é proibido prestar esse tipo de auxílio, restrito apenas aos serviços de emergência. “O que mais fiz nos EUA foi trabalhar. Trabalhava o tempo todo.”
O norte-americano chegou ao Uruguai há pouco mais de um mês. Mora no balneário Piriápolis (entre Montevidéu e Punta del Este) com o irmão caçula e o pai. Está se preparando para trabalhar como voluntário no Plano Juntos (programa governamental de construção de casas populares e para onde Mujica doa 90% do salário) e se dedica ao desenvolvimento do documentário como primeiro passo do objetivo de se tornar cineasta.
Nesse primeiro mês, Clymer também chegou a conhecer Mujica pessoalmente, durante uma inauguração do presidente no balneário onde o americano está vivendo. Não conseguiu muito mais do que tirar uma foto, mas tem a intenção de “se aproximar mais” do mandatário ao longo do desenvolvimento do filme.
A primeira vez que Clymer ouviu falar de Mujica, da sua filosofia de vida e do Uruguai foi por meio das coberturas televisivas que mostravam a visita do uruguaio à Casa Branca, em maio de 2014, onde foi recebido por Barack Obama e teve uma reunião bilateral.
Produção cooperativa
O pensamento de Mujica fez com que Clymer considerasse outra forma de viver, “menos consumista”, e conta haver sentido curiosidade de conhecer o Uruguai. Embarcou para o país e submeteu o projeto do curta-metragem à plataforma audiovisual Lala, que reúne profissionais de cinema latino-americanos e é capitaneada pelo cineasta uruguaio Martín Sastre.
“James escreveu a Lala para nos pedir ajuda na realização do curta, achei uma história simplesmente incrível. Não vai ser necessária muita produção extra porque ele já tem algumas imagens registradas, está fazendo outras com sua própria câmera, e é um projeto colaborativo, até para ser coerente com o que ele está procurando, uma vida menos materialista”, diz Sastre.
Por meio da plataforma, o americano conta um pouco do projeto, mostra fragmentos e convida interessados do setor audiovisual a participar da obra, que está sendo feita em regime de cooperativa.
A modéstia de Mujica
José "Pepe" Mujica assumiu a presidência do Uruguai em março de 2010 e seu mandato, que termina em 28 de fevereiro, ficou marcado pelas leis vanguardistas (estatização da maconha, descriminalização do aborto) e pelo estilo de vida sóbrio.
Mujica não abandonou a modesta casa em que vive, na zona rural de Montevideu, e doou 90% do salário ao programa governamental de construção de casas populares Plano Juntos. Seu desprendimento e filosofia de vida anticonsumista fizeram com que ficasse conhecido internacionalmente como "o presidente mais pobre do mundo".