Após enfrentar terremoto, brasileiros se mobilizam para ajudar vítimas na Cidade do México
Abalo de magnitude 7,1 atingiu a região central do país no início da tarde de terça-feira, deixando mais de 225 mortos e um número ainda indefinido de feridos, entre eles dois brasileiros, segundo o Itamaraty.
"Quando o alarme de terremoto soou, eu achei que tinha disparado por engano", conta a brasileira Elisabete Rocha Pagani, de 63 anos, que pensava estar preparada para enfrentar abalos sísmicos - afinal, morando há sete anos na Cidade do México, já havia passado por alguns e acabado de fazer um treinamento para situações assim.
Isso não impediu que fosse pega de surpresa e tomada pelo medo e pela sensação de impotência quando a terra tremeu na terça-feira. "Parecia que eu estava surfando no concreto. Você se sente a mercê da natureza, e muito frágil. Tem que fazer o melhor para se proteger e contar com a sorte."
Pagani estava perto do edifício onde mora quando o abalo de magnitude 7,1 atingiu a região central do México no início da tarde de ontem, deixando pelo menos 225 mortos e um número ainda indefinido de feridos, entre eles dois brasileiros, segundo o Itamaraty.
Naquela manhã, ela havia cumprido a simulação anual que o México faz em 19 de setembro, data do terremoto mais intenso já registrado no país - em 1985, um abalo de magnitude 8 deixou 10 mil mortos e 30 mil feridos. A medida busca preparar a população para esse tipo de incidente.
Três horas depois, a brasileira enfrentava o pior tremor de sua vida.
"Tudo chacoalhava. Ouvia estouros. Você fica desorientado. Agora mesmo, contando sobre isso, sinto tudo tremer. Essa sensação ainda vai durar alguns dias", diz. Quando retornou para casa, encontrou paredes rachadas, placas de massa corrida dependuradas e reboco pelo chão. "Parecia que havia acontecido um bombardeio."
Menos de 24 horas depois do tremor, Pagani já se dedicava a ajudar nos esforços de resgate e apoio às vítimas. Pela internet, ela e amigos haviam recebido pedidos de doações e de refeições fáceis de serem consumidas pelos voluntários. Decidiram, então, fazer um mutirão para preparar sanduíches - os 300 primeiros foram entregues pela manhã em um centro de ajuda.
"Aqui o auxílio é mobilizado muito rápido porque eles têm experiência com isso. Imediatamente surgem locais aonde levar doações. Universidades preparam voluntários para ajudar nos escombros. Os supermercados estão cheios de gente comprando de tudo para doar: comida, papel higiênico, material de limpeza, água."
'Desejo de contribuir'
É uma experiência semelhante à vivida por Laura Bussato. Pela manhã, a brasileira foi a um dos centros de ajuda às vítimas para doar alimentos. Depois, foi para o escritório, onde cumpriu meio expediente e seguiu para o campus da universidade federal da Cidade do México para se oferecer como voluntária, mesmo ainda estando estremecida.
"Primeiro, vem o estado de choque, depois, a tristeza pelas vítimas e estragos. Mas aí surge o desejo de contribuir, porque muitas pessoas não tiveram a sorte de sair ilesas, então, podemos ajudar elas e a reconstruir a cidade", diz.
O tremor ocorreu às 13h14 do horário local (15h14 em Brasília). O Serviço Geológico dos Estados Unidos localizou o epicentro do terremoto a 51 km de profundidade nos arredores da cidade de Axochiapan, a 120 km da Cidade do México.
Ainda assim, o terremoto deixou um rastro de destruição na capital do país, onde vivem 20 milhões de pessoas. Em ao menos 44 locais, edifícios desmoronaram ou ficaram comprometidos. Outros desabamentos foram registrados nesta quarta-feira.
Bussato estava no trabalho no momento do terremoto. Diz que ela e seus colegas não acreditavam na sinistra coincidência com o dia do terremoto de 1985. E conta que, mesmo após participar de um treinamento horas antes, as pessoas entraram em pânico, porque o tremor foi muito forte.
"Nós nos abraçamos e ficamos contra a parede até esperar passar. Nem sei quanto tempo permanecemos assim. Nessas horas, um minuto parece uma eternidade."
Ela diz ter ficado no centro da cidade até de noite - o trânsito já caótico ficou ainda pior e havia alertas de que bandidos estavam se aproveitando da situação para assaltar.
O clima de insegurança deu lugar, nesta quarta, aos esforços coletivos para auxiliar quem foi afetado. "O mexicano é um povo muito solidário. É impressionante. As pessoas estão pedindo para não trabalhar para poder ajudar. Muita gente está se mobilizando nas ruas e pelas redes."
'Salvando vidas'
"A internet está salvando vidas", diz Ana Cristina Torres, de 34 anos, que está viajando pelo México com o marido e os dois filhos. Ela e sua família estão hospedadas na casa de amigos em Cuautitlán Izcalli, nos arredores da capital. Almoçavam quando houve o terremoto.
"Nessa hora, você não pensa em nada. Sai correndo para escapar de algo que possa cair em você. Minha amiga não acreditava, porque aqui nunca treme. Então, foi bem forte mesmo", diz Torres. "É uma sensação muito estranha. A natureza está no controle. Você reza e torce para sair vivo."
Agora, está acompanhando diferentes grupos no Facebook pelos quais cidadãos estão se mobilizando para ajudar as vítimas do terremoto. Essas comunidades digitais se dividem por bairros, zonas e locais específicos. Informam os suprimentos necessários em cada lugar.
Também foram criados mapas digitais que apontam centros de ajuda, abrigos e as áreas mais afetadas pelo tremor. O site "Como Ayudar" ("como ajudar") também reúne informações assim.
"É lindo o que está acontecendo", conta Torres, que está reunindo alimentos e medicamentos para levar a um dos centros de apoio na noite desta quarta-feira. "Como tenho duas crianças pequenas e o acesso à Cidade do México está muito complicado, não tenho como ir até lá. Essa é minha forma de ajudar."
Corrente humana
Para a consultora de inovação Carolina de Oliveira, de 36 anos, a experiência significou participar de uma corrente humana com outras 300 pessoas para retirar escombros. Ela estava voltando do trabalho nesta terça-feira quando se uniu aos esforços para resgatar vítimas de um edifício que desmoronou.
Pouco antes, ela estava no 18º andar de um prédio com fachada em vidro assistindo à Cidade do México tremer. "Como não há paredes, temos uma vista panorâmica da cidade. Lá de cima, a gente via prédios caindo, incêndios começando, várias nuvens de fumaça subindo, sem saber se são os locais onde moram amigos, familiares", diz Oliveira, que mora há sete anos na cidade.
"Foi o pior tremor que já vivi. Nunca tinha sentido algo assim. O alarme não tocou, fomos pegos de surpresa. Foi um susto muito grande."
Hoje, ela não trabalhou. Enquanto conversava com a BBC Brasil, contava que estava chegando a Xochimilco, uma das zonas mais pobres da cidade, com ferramentas para ajudar no auxílio às vítimas. O grupo inicialmente formado por dez pessoas dobrou de tamanho após passar por alguns centros de ajuda, nos quais pessoas decidiram somar esforços.
"Nas partes mais ricas da cidade, já tem muitas pessoas ajudando, tantas que até atrapalha. Aqui foi muito afetado e não teve tanta ajuda", diz Oliveira.
"Por um lado, é muito triste, mas, ao mesmo tempo, é emocionante ver tanta gente se unindo em uma situação assim."